Reflexões sobre desafios da contemporaneidade e outros horizontes de sentido cosmoperceptivos em contextos relacionais com a água

Autores

  • Franklin de Paula Júnior Universidade de Brasília - UnB
  • Rita Silvana Santana dos Santos Universidade de Brasília - UnB

DOI:

https://doi.org/10.34024/revbea.2024.v19.18932

Palavras-chave:

Copapso Ambiental, Bacia do Prata, Colonialidade, Cosmopercepção, Educação Ambiental

Resumo

Este trabalho vincula-se com um projeto de pesquisa acerca de enunciados instituintes sobre a água e suas implicações neste universo relacional. No presente ensaio, apresentaremos possíveis aproximações e diálogos com ideias e elementos teórico-conceituais potencialmente capazes de contribuir para a contextualização e o desenvolvimento da pesquisa, enfatizando processos educativos, em especial, de Educação Ambiental. A crise climática global, a crise hídrica e a ameaça de colapso ambiental planetário são algumas das situações centrais que desafiam a contemporaneidade, mas cuja gênese remonta à lógica colonial (à racionalidade indolente subjacente), que constitui uma das forças motrizes da modernidade ocidental capitalista. A metafísica do dinheiro e a globalização neoliberal (RAMOSE, 2010), que são algumas das expressões mais visíveis e atuais da colonialidade, tornaram-se um dos pilares do esgarçamento ecossistêmico planetário e da desigualdade social – chaga histórica que novamente flagela o mundo e impacta exponencialmente o Sul Global. Em sua investigação sobre a herança colonial na Iorubalândia, Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí (2002) desvendou categorias socialmente construídas pelo projeto colonial eurocêntrico que se baseiam em uma “bio-lógica” hierarquizante (ideologia do determinismo biológico) – que atribui diferenciações sociais, estabelece hierarquias, bem como funções, privilégios e discriminações baseadas na pigmentação da pele, no fenótipo, na morfologia, no sexo [genitália] e noutros atributos corporais –, a exemplo das categorias de gênero e de raça, historicamente impostas pelo colonialismo a territórios e povos não ocidentais. A partir desta constatação, Oyěwùmí estabelece uma distinção importante entre a cosmovisão ocidental [e ocidentalizadora] e cosmopercepções outras que valorizam o conjunto de sentidos, propiciando uma apreensão global e interconectada da realidade em suas múltiplas dimensões – abarcando nuances da existência e dos vários mundos, físico e metafísico entrelaçados. Espera-se que, contra a lógica mortífera do dinheiro e do encargo colonial, estes outros horizontes de sentido (saberes e ontologias), especialmente de origem afroameríndia, possam fecundar processos educativos de Educação Ambiental relacionados com a água na Bacia do Prata – segunda maior bacia hidrográfica de águas transfronteiriças da América do Sul e território subcontinental referencial da experiência sócio-histórica derivada do projeto de modernidade ocidental que tem a colonialidade como a sua contraface constitutiva –, assim como contribuir para o alargamento dos horizontes de emancipação e libertação dos povos, especialmente daqueles que ainda não se libertaram dos encargos da colonialidade.

Referências

ALVES FILHO, Olinto Silveira. Emenda constitucional nº 32/2020: É hora de virar o jogo! ADUSFS, 12/10/2020. Disponível em: https://adufs.org.br/conteudo/1972/reforma-administrativa-contribui-para-consolidacao-do-desmonte-do-estado-brasileiro.

ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Tradução Paloma Vidal. – Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.

ARROJO, Pedro. El reto ético de la crisis global del agua. Realciones Internacionales, núm. 12, octubre de 2009 – GERI-UAM. Disponível em: https://repositorio.uam.es/handle/10486/678179.

BALLESTRIN, Luciana. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 11, Brasília, maio – agosto de 2013.

BISPO DOS SANTOS, Antônio. A terra dá, a terra quer / Antônio Bispo dos Santos; imagens de Santídio Pereira; texto de orelha de Malcom Ferdinand. São Paulo: Ubu Editora/ PISEAGRAMA, 2023. 112 pp.

BRINGEL, Breno. Movimientos Sociales y Realidad Latinoamericana: una lectura histórico-teórica. In: Hacia la renovación de la teoría social latinoamericana. CLACSO, 2020. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/j.ctv1gm036w.11

BRUCKMANN, Monica. La geopolítica del agua y los desafios de la integración sudamericana. Cartografías del Sur, nº 4, octubre/2016.

CASTRO, José Esteban; HELLER, Léo e MORAIS, Maria da Piedade. Introdução. O direito à água como política pública na América Latina : uma exploração teórica e empírica / editores: José Esteban Castro, Léo Heller, Maria da Piedade Morais. – Brasília: Ipea, 2015.

CASTORIADIS, Cornelius. A Instituição imaginária da sociedade. Tradução de Guy Reynaud; revisão técnica de Luiz Roberto Salinas Fortes. - Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. (Coleção Rumos da cultura moderna; v. 52). 6a edição.

CIC. Análise Diagnóstico Transfronteiriço da Bacia do Prata - ADT. - 1a ed revisada. – Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Comité Intergubernamental Coordinador de los Países de la Cuenca del Plata - CIC; Estados Unidos : Organización de los Estados Americanos - OEA, 2017. Libro digital, PDF

FERDINAND, Malcom. Uma ecologia decolonial: pensar a partir do mundo caribenho. Tradução Letícia Mei; prefácio Angela Davis; posfácio Guilherme Moura Fagundes. – São Paulo: Ubu Editora, 2022, 320 pp.

GALANO, Carlos. Educación Ambiental: construcción desde los silencios de la Cuenca del Plata. Revista Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 20, p.13-22, jul/dez. 2009.

KILOMBA, Grada. Memórias da plantação – episódios de racismo cotidiano. Tradução Jess Oliveira. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.

LEFF, Enrique. Pensamiento Ambiental Latinoamericano: Patrimonio de un Saber para la Sustentabilidad. Panel “Pensamiento Ambiental Latinoamericano”, VI Congreso Iberoamericano de Educación Ambiental, San Clemente de Tuyú, Argentina, 19 de septiembre de 2009.

LÉO NETO, Nivaldo Aureliano. A contextualização dos saberes para a descolonização de um ensino de Biologia que reconheça as identidades e diferenças. Revista Entreideias, Salvador, v. 7, n. esp, p.23-42, 2018.

MASDEU-ROCHA, Sofía. Desenterrar de una vez los nombres del río: de choques, arribos y partidas en el Río de la Plata. La Diaria, Uruguay, 27 de mayo de 2023. Disponível em: https://ladiaria.com.uy/politica/articulo/2023/5/desenterrar-de-una-vez-los-nombres-del-rio-de-choques-arribos-y-partidas-en-el-rio-de-la-plata/.

MATOS-DE-SOUZA, Rodrigo. A desobediência epistemológica da pesquisa (auto)biográfica: outros tempos, outras narrativas e outra universidade. Revista UFG, Goiânia. 2021a, v.22: e22.72988

MATOS-DE-SOUZA, Rodrigo. El colonialismo revisitado por la memoria. In: GARCÍA; SEDEÑO; RAMÍREZ (Coords.). Territorios, comunidades y prácticas: una lectura en clave decolonial. Corporación Universidad Libre Seccional Pereira, 2021b.

MIGNOLO, Walter. Historias locales/disenos globales: colonialidade, conocimientos subalternos y pensamiento fronterizo. Madrid: Akal. 2003.

MIGUEL, Luís Felipe. O golpe foi um golpe. A Terra é Redonda, 30/08/2023. Disponível em: https://aterraeredonda.com.br/o-golpe-foi-um-golpe/.

NOBRE, Antonio Donato. Água e florestas: por um círculo virtuoso para o cuidado das águas. Água e Transdisiciplinaridade para uma ecologia de saberes. Org. Vera Lessa Catalão e Maria do Socorro Ibañez – Senado Federal/ Cet-Água. 1ª ed – Brasília, 2012.

OYĚWÙMÍ, Oyèrónkẹ́. A invenção das mulheres: construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero. Tradução Wanderson Flor do Nascimento. – 1. Ed. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.

OYĚWÙMÍ, Oyèrónkẹ́. Visualizando o corpo: teorias ocidentais e sujeitos africanos. Visualizing the Body: Western Theories and African Subjects in: COETZEE, Peter H.; ROUX, Abraham P.J. (eds). The African Philosophy Reader. New York: Routledge, 2002, p. 391-415. Tradução para uso didático de wanderson flor do nascimento.

PADILHA, Paulo Roberto. Por uma escola curiosa, prazerosa e aprendente. Tese de doutorado. FE-USP, 2003.

PAULA JÚNIOR, Franklin. “Nós somos água”: cosmovisões e perspectivas políticas sobre a água a partir do diálogo com atores institucionais e da sociedade civil. 2021. 236 f., il. Dissertação (Mestrado em Direitos Humanos e Cidadania) — Universidade de Brasília, Brasília, 2021.

PETRELLA, Ricardo. A Black Rock quer o mundo a seus pés. Outras Palavras, 26/01/2024. Disponível em: https://outraspalavras.net/mercadovsdemocracia/a-black-rock-quer-o-mundo-a-seus-pes/.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder: eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (Org.). A colonialidade do saber, eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas, Buenos Aires, CLACSO, 2005. Disponível em: http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/clacso/sur-sur/20100624103322/12_Quijano.pdf

PIRES, Alex; MIRANDA, Liliana. Sustainable management of the water resources of the la Plata Basin with respect to the effects of climate variability and change. Terminal Evaluation of the um environment GEF Projetc 2095. Draft zero. UNEP/GEF/OEA. November 2019.

RAMOSE, Mogobe B. Globalização e Ubuntu. In: Epistemologias do Sul - SANTOS, Boaventura de Sousa; e MENEZES, Maria Paula. [Orgs.] – São Paulo: Cortez, 2010.

RUFINO, Luiz. Exu e a Pedagogia das Encruzilhadas: sobre conhecimentos, educações e pós-colonialismo. VIII Seminário Internacional “As Redes Educativas e as Tecnologias: Movimentos Sociais e Educação” – Junho/2015.

RUFINO, Luiz; CAMARGO, Daniel Renaud; e SÁNCHEZ, Celso. Educação Ambiental desde El Sur: A perspectiva da Terrexistência como Política e Poética Descolonial. Revista Sergipana de Educação Ambiental – REVISEA, São Cristóvão, Sergipe, Brasil – V.7, Número Especial, 2020.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. In: Epistemologias do Sul - SANTOS, Boaventura de Sousa; MENEZES, Maria Paula. [Orgs.] – São Paulo: Cortez, 2010.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. Revista Crítica de Ciências Sociais, 63, Outubro 2002.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Conferência “A Reinvenção da Emancipação Social a partir das Epistemologias do Sul”. Ciclo de debates Universidade e Sociedade. Universidade de Brasília-UnB, 04/06/2009.

SANTOS, Rita Silvana Santana. Diálogos: Educação Ambiental e Educação Antirracista no contexto da formação docente. Revista Eixo, v. 6, n. 2 (Especial), IFB/Brasília-DF, novembro de 2017.

SIMAS, Luiz Antonio. Exu, Benjamin e as centelhas de esperança. IREE, 04/10/2021. Disponível em: https://iree.org.br/exu-benjamin-e-as-centelhas-de-esperanca/.

SOARES, Luís Eustáquio. Por que estudar o imperialismo hoje. Outras Palavras, 10/12/2020. Disponível em: https://outraspalavras.net/crise-brasileira/por-que-estudar-o-imperialismo-hoje/.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Perspectivismo e multinaturalismo na América indígena. O que nos faz pensar, [S.l.], v. 14, n. 18, p. 225-254, sep. 2004. ISSN 0104-6675.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Os Involuntários da Pátria – elogio do subdesenvolvimento. Cadernos de Leitura, n 65 - Edições Chão da Terra, Maio de 2017.

WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 2009.

Downloads

Publicado

21-08-2024

Como Citar

PAULA JÚNIOR, Franklin de; SANTOS, Rita Silvana Santana dos. Reflexões sobre desafios da contemporaneidade e outros horizontes de sentido cosmoperceptivos em contextos relacionais com a água. Revista Brasileira de Educação Ambiental (RevBEA), [S. l.], v. 19, n. 6, p. 119–138, 2024. DOI: 10.34024/revbea.2024.v19.18932. Disponível em: https://periodicos.unifesp.br/index.php/revbea/article/view/18932. Acesso em: 14 dez. 2025.