Chamada de textos para dossiês temáticos

2025-09-18

Chamada de textos para dossiês temáticos

A Almanack comunica a abertura de chamada de textos para três dossiês temáticos a serem publicados em 2026.

Os textos precisam ser submetidos no sistema da revista até 1º de maio de 2026, através do seguinte link: https://periodicos.unifesp.br/index.php/alm/about/submissions

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Guerras civis e conflitos internacionais no século 19: deslocamentos humanos, comunicações e provisões materiais

Proponentes:

  • Kelly Eleutério Machado Oliveira (UFOP);
  • Jonas Moreira Vargas (UFPEL);
  • Pérola Maria Goldfeder Borges de Castro (UNIFESP)

 

O século XIX configurou-se como um período de intensificação dos fluxos humanos, comunicacionais e materiais que desde cedo caracterizaram a dinâmica do capital. Esses movimentos foram mais intensos e complexos em conjunturas bélicas, e a centúria de que estamos tratando foi profusa nesse aspecto, com destaque para a Guerra da Cisplatina, cujo bicentenário comemoramos no presente ano de 2025. Tendo em vista a atualidade do tema no cenário historiográfico sul-americano, este dossiê propõe reunir autoras e autores de distintas instituições, nacionais e estrangeiras, com o objetivo de discutir: 1) guerras civis nos casos em que os combates (e seus respectivos fluxos demográficos, informacionais e materiais) ocorram nos limites do Estado nacional e mobilizem grupos provenientes de uma mesma nacionalidade, mesmo que não partilhem de estatutos étnicos, sociais e/ou jurídicos e 2) conflitos internacionais cujo aspecto distintivo seria a disputa entre os Estados levando-se em consideração questões de soberania e relações diplomáticas.

As autoras e autores discutirão a materialidade dos fluxos que caracterizaram as conjunturas bélicas abordadas. Ao tratarem dos deslocamentos humanos, privilegiarão o trânsito de trabalhadores livres, escravizados, refugiados, exilados etc - e seus respectivos vetores institucionais tais como as companhias de emigração subvencionada, os serviços de hospedagem e de apoio financeiro, hospitalar, educacional etc. Em relação às comunicações, deverão ser levadas em consideração não somente os arranjos tarifários e regulamentares em vigor no interior de determinado país, mas também as convenções bilaterais às quais aquele mesmo país estava sujeito e o impacto das guerras civis e internacionais nesses dois níveis complementares de organização dos fluxos postais. Também vale observar que em meados do século XIX, as comunicações experimentaram um progressivo processo de “mundialização postal” (Laborie, 2017) que se aprofundou até a fundação da União Postal Universal, em 1874. Por fim, o dossiê também dará destaque às provisões materiais relacionadas aos mercados regionais e/ou internacionais de alimentos, equipamentos militares, capital/crédito, etc, instâncias que foram impactadas, muitas vezes positivamente, pelas guerras.

 

A fiscalidade como “território de fronteira” - Séculos XVIII e XIX

Proponentes:

  • Cláudia Chaves – UFOP
  • Daiane de Souza Alves – UERJ

 

A proposta deste dossiê é reunir trabalhos que se dedicam a analisar o papel da fiscalidade no processo de organização dos territórios. Como é sabido, a fiscalidade, enquanto “território de fronteira”, possibilita um ângulo privilegiado da compreensão da formação das estruturas arrecadadoras dos impérios e Estados Nacionais modernos e dos conflitos inerentes à sua constituição. Menos vinculada ao princípio burocrático e até redistributivo da segunda metade do século XIX, a organização dos sistemas fiscais entre os séculos XVIII e XIX serviram como forma de manutenção e/ou expansão através de guerras e mobilização militar na defesa de soberanias. Os recursos advindos de taxas, impostos e direitos dominiais constituíram uma forma primordial para possibilitar a construção e manutenção dos estados e seus territórios. Do modelo e estruturação mais patrimonial, quando o Estado explora seus domínios e direitos de concessão, à sua transformação em estado fiscal, quando a base arrecadatória advém da capacidade decorrente da imposição de tributos aos seus contribuintes, tais mecanismos não descortinam meramente a passagem histórica e muito menos linear de processos que se deslindaram na transição ao capitalismo e às políticas liberais. Antes e, sobretudo, refletem os conflitos e negociações que envolveram a constituição do exercício da legitimidade política e de sua ação sobre os organismos sociais. Os estudos sobre a fiscalidade no Brasil e nas Américas nos demonstram tanto a convivência dessas formas arrecadatórias, quanto o peso das lutas políticas em torno da organização dos territórios, coloniais ou nacionais. O chamado estado fiscal, visto a partir de sua crise no início do século XX por Joseph Schumpeter, demonstrava os limites de capacidade e de gerenciamento no desequilíbrio entre as fontes de receitas e o contínuo aumento das despesas públicas. A chave para entendermos este dilema quase que permanente na história da fiscalidade tem sido buscada nas chaves interpretativas da política e dos sistemas de legitimação dos mecanismos tributários. Não apenas legítimos, mas necessários como garantidores do ordenamento social, das soberanias, das representatividades e também das defesas contra ameaças externas. Assim, os estudos sobre as fiscalidades e as políticas territoriais abrangem os conflitos políticos e sociais, a constituição de instituições burocráticas, o controle de territórios, a legitimação de tributos e o enfrentamento das crises políticas e econômicas.

 

Bicentenário do estabelecimento das relações diplomáticas entre o Brasil e a Colômbia: atores, temas e cenários no longo século XIX

Proponentes:

  • Daniel Rojas, Universidade Grenoble Alpes, ILCEA4, EA7365.
  • Gabriel Passetti, Universidad Federal Fluminense, Estudos Estratégicos da Defesa e Segurança.

 

A comemoração, em 2027, do bicentenário do estabelecimento das relações diplomáticas entre o Brasil e a Colômbia oferece uma oportunidade privilegiada para refletir sobre os vínculos que uniram ambos os países ao longo de dois séculos de história compartilhada.

 Se a historiografia internacional da América Latina enfatizou o estudo da inserção do Brasil no sistema internacional por meio de seus vínculos com a Inglaterra, com as potências europeias continentais ou com os Estados Unidos, a análise de suas relações com outros países sul-americanos permite enriquecer significativamente a compreensão de sua política externa. Ao privilegiar os vínculos com as grandes potências do século XIX, muitos estudos relegaram as dinâmicas regionais a um segundo plano, apesar de seu papel essencial na consolidação da presença internacional do Brasil imperial e na definição de seus interesses estratégicos em escala continental. Acordos bilaterais, missões diplomáticas, disputas fronteiriças, alianças militares e intercâmbios comerciais com os vizinhos sul-americanos foram igualmente centrais para a construção de uma diplomacia ativa e autônoma no contexto pós-independência.

Na Colômbia, as pesquisas concentraram-se tradicionalmente nos vínculos com os Estados Unidos e algumas potências europeias, assim como com a Venezuela, o Panamá e as repúblicas andinas — em especial o Equador e o Peru. A história da Amazônia permaneceu durante muito tempo como um campo inexplorado, que apenas recentemente começou a se abrir a investigações mais sistemáticas. As relações com o Brasil imperial, embora constantes e marcadas por episódios significativos, foram frequentemente relegadas a segundo plano, em parte devido à escassez de estudos comparativos e ao predomínio de uma narrativa histórica nacional ou de uma historiografia centrada no espaço atlântico. No entanto, ao reconstituir os intercâmbios políticos, diplomáticos, comerciais e culturais entre o Brasil e a Colômbia ao longo do século XIX, é possível evidenciar a existência de uma densa rede de interações que ultrapassava as fronteiras formais e influenciava tanto as trajetórias nacionais quanto as configurações regionais do sistema internacional sul-americano.

As temáticas a serem exploradas en este dossiê são variadas: as negociações para delimitar uma fronteira amazônica incerta; as disputas e os acordos em torno da livre navegação do Amazonas; a circulação de pessoas e ideias; o estabelecimento de redes consulares; a percepção recíproca entre ambos os países na opinião pública; a circulação e o intercâmbio de objetos destinados a coleções de história natural; as tensões próprias do sistema internacional em formação; a participação de colombianos/neogranadinos e brasileiros em reuniões e eventos internacionais; o impacto da escravidão nas relações entre os países sul-americanos; bem como os modos como os dois países se inseriram nas transformações do direito internacional público ao longo do século XIX — particularmente no que diz respeito ao reconhecimento de soberanias, às normas de neutralidade, à mediação de conflitos e à codificação de tratados bilaterais e multilaterais. 

 Também merecem destaque os processos de institucionalização e profissionalização das respectivas diplomacias, marcados pelo surgimento de carreiras diplomáticas permanentes, pela fundação de escolas ou cursos de formação de diplomatas e pela circulação de modelos jurídicos e doutrinários europeus adaptados aos contextos latino-americanos. A análise dos perfis, trajetórias e práticas dos agentes diplomáticos — tanto oficiais quanto informais — abre um campo promissor para compreender as redes pessoais, familiares e intelectuais que sustentaram os vínculos bilaterais. Esses elementos, entre outros, permitem vislumbrar a complexidade e a densidade das relações colombo-brasileiras em um século XIX que foi tudo menos periférico nas grandes transformações do sistema internacional moderno.

 

 O objetivo deste dossiê é reunir trabalhos originais que explorem, a partir de uma perspectiva histórica, os atores, as temáticas e os cenários que estruturaram as relações colombo-brasileiras durante o longo século XIX. Serão privilegiadas abordagens da história política, diplomática, econômica e transnacional, sem excluir contribuições da história social e cultural que dialoguem com as questões internacionais propostas. O uso rigoroso de fontes primárias será um critério essencial para a seleção dos artigos. 

 O dossiê será articulado em torno de três eixos principais: 

 Os atores da relação bilateral, entre os quais se encontram diplomatas, comerciantes, militares, missionários, viajantes, populações indígenas e outros intermediários que participaram da construção dos vínculos entre os dois países. 

 As temáticas que marcaram essa interação, tais como a delimitação de fronteiras, a navegação fluvial, a escravidão, os tratados comerciais, a circulação de pessoas e ideias, ou as estratégias de equilíbrio regional. 

 Os cenários nos quais essas relações se desenvolveram: desde as capitais imperiais e republicanas até as zonas fronteiriças amazônicas, os portos atlânticos e fluviais, as conferências diplomáticas sul-americanas, hemisféricas ou mundiais, assim como espaços de trânsito e intercâmbio de informações, como o istmo do Panamá, as rotas missionárias e os círculos de sociabilidade diplomática em diferentes pontos do globo.