CINE Y CIENCIA


A EVOLUÇÃO DA REPRESENTAÇÃO DOS SERES MÁGICOS E / OU ARTIFICIAIS NO CINEMA E NA TELEVISÃO

The Evolution of the Representation of Magical and Artificial Beings in the Cinema and the Television


JOÃO CARLOS ROCHA


(UNIP, Brasil)


Resumo

Este artigo analisa ao longo da história do cinema as representações dos seres artificiais, seu surgimento, evolução e adaptação á época em que foram produzidos. Estas representações se referem tanto a seres fantásticos/mágicos como a seres mecânico/cibernéticos. Esta análise inclui também o aspecto utópico/distópico dos enredos.


Palavras-chave: seres artificiais | seres fantásticos | cinema.


Abstract


This paper analyzes the representations of artificial beings, their emergence, evolution and adaptation where they were produced throughout the history of cinema. These representations refer both fantastic/magical beings as mechanical/cybernetic beings. This analysis also includes the utopian/dystopian aspect of the plots.


Keywords: Artificial Beings | Fantastic Beings | Cinema.


As criaturas fantásticas permeiam o imaginário humano desde o surgimento do próprio homem. Originalmente as narrativas surgem como tradição oral e posteriormente são registradas na literatura. Com a invenção do cinema os produtores de filmes buscaram na literatura temas que pudessem ser transformados em filmes. A princípio adaptaram estas estórias e mais tarde passaram a produzir filmes a partir de roteiros originalmente escritos para as telas. Como não poderia deixar de ser, filmes com histórias envolvendo criaturas artificiais ( mágicas ou mecânicas ) logo surgiram, dando inicio a uma longa

tradição de filmes de terror e/ou ficção científica. Esta tradição posteriormente se transferiu para a televisão. No início, a TV exibia os antigos clássicos, depois copiou e por fim passou a ter personagens criados especialmente para TV, sendo que alguns fizeram o caminho inverso, após terem sido criados para TV, foram para o cinema.

Mas antes de analisarmos estes filmes (e eventualmente séries de cinema e TV), temos que fazer uma classificação das criaturas artificiais, ou seja, não naturais, que estão presentes nas produções cinematográficas.

Inicialmente temos dois grandes grupos de criaturas : o primeiro é composto por criaturas mágicas, que foram feitas através da magia ou intervenção divina.

O segundo grupo é aquele de seres criados através da ciência e tecnologia. Por sua vez, este grupo abriga diferentes criaturas no que se refere a sua composição: mecânicas, bio-mecânicas ou inteiramente biológicas.

O primeiro grupo, o das criaturas mágicas, são os seres que foram criados através da feitiçaria ou a intervenção de algum ser supra-humano ou divino. Fazem parte desta categoria o Golem, o Homúnculo, a Alraune, Pinóquio e se considerarmos a mitologia grega o próprio homem.

No segundo grupo temos os seres artificiais criados através da ciência humana, nele estão inclusos os autômatos, os robots, computadores, os andróides ( bem como sua variante feminina os ginóides), cyborgs e os clones.

Os autômatos são geralmente dispositivos mecânicos mais simples, e uma vez construídos realizam movimentos/tarefas que não são reprogramáveis. Os Robots por sua vez, são máquinas mecânico/elétricas/eletrônicas e que podem ser programados para diferentes tarefas. Os andróides são robots com forma humanóide/humana e que possuem alguma autonomia no que se refere a tomada de decisões. Quando o andróide possui formas femininas é chamado de ginóide (do grego, andros = homem, gynos = mulher). Computadores são máquinas eletrônicas que processam informações e nesse sentido podem ter diferentes programações e portanto podem executar diversas tarefas. Todo ser artificial eletrônico tem por “cérebro” um computador e muitos computadores possuem “interfaces” para realizarem tarefas físicas. Na verdade um computador é uma calculadora de extrema capacidade que opera não com números decimais, mas com números binários, sua diferença da calculadora

comum se dá na possibilidade de operar com diferentes softwares e portanto realizar diferentes tarefas. O cyborg é um ser biológico que recebeu próteses/extensões eletro/mecânicas, ou seja, nasceu puramente biológico e foi conectado a algum mecanismo. Os clones são seres biológicos mas concebidos através de meios artificiais. Por fim, temos os seres híbridos ou de difícil categorização pois possuem mais de uma “natureza” em sua composição/criação.

Geralmente as histórias envolvendo seres artificiais possuem duas características: ou são utópicas, quando a interação com os seres humanos são “amigáveis”, e são filmes de ficção-científica e/ou fantasia, ou distópicas, quando a relação homem-máquina é perigosa para a humanidade, geralmente com a criatura se voltando contra seu criador. Os filmes distópicos são a maioria e geralmente pertencem ao gênero de terror e/ou ficção científica.

O recorte escolhido neste artigo, relativo a importância do filme, é subjetivo. Talvez o leitor incluísse outros filmes e excluísse outros. Porém a intenção foi criar uma lista que apontasse a evolução das criaturas artificiais no cinema.

Para facilitar a leitura deste artigo, faremos uma análise cronológica das produções cinematográficas e incluindo produções televisivas quando não houver equivalente no cinema. Seguiremos a data de lançamento/exibição. Conforme formos vendo os filmes/séries, comentaremos suas características e importância dentro do recorte histórico/inovador que a produção tenha. Primeiramente veremos os seres mágicos e em seguida os seres cibernéticos.


SERES MÁGICOS:


1916 - Homúnculo – do latim homem pequeno. Ser artificial criado a partir de diferentes processos alquímicos, tendo porém natureza biológica. Uma vez que o mago conseguisse gerá-lo, era de pequena estatura, pouco inteligente, e cumpria ordens simples de seu criador. Não era nem bom nem mau, mas geralmente era usado para fazer alguma maldade. No cinema foi personagem de uma cine-série alemã em seis partes feita em 1916. A história é

diferente da lenda, nela um cientista cria o homem perfeito, porém incapaz de amar: o homúnculo. Quando atinge a idade de 25 anos homúnculo descobre como foi gerado e se volta contra o cientista e contra toda a humanidade. Homúnculo vive um dilema, ao mesmo tempo que quer destruir o mundo, quer conhecer o amor. Ele adota um nome falso e sai pelo mundo tentando encontrar o amor. Homúnculo falha em encontrar o amor e por isso passa a trabalhar num plano para destruir o mundo. No entanto o cientista ao saber dos planos de sua criatura decide criar outro homúnculo para destruir o primeiro. Os dois homúnculos se encontram numa montanha e iniciam uma luta de vida ou morte. Após uma longa batalha os dois perecem. E a humanidade está salva. Trata-se de mais uma distopia que termina utópica.


1918 - Alraune – Esta primeira versão da lenda nórdica, foi produzida na Hungria e dirigida por Michael Curtiz. Considera-se esta versão perdida, mas é importante porque este filme serviu de base para as adaptações cinematográficas que seriam feitas posteriormente. Alraune significa mandrágora em alemão, e segundo a lenda, ela nasce do esperma dos enforcados. Ainda segundo a lenda, se a mandrágora for esfregada nas partes íntimas de uma mulher esta poderá engravidar.

Na versão alemã de 1928, em branco e preto, muda, dirigida por Henrik Galeen ( a mais antiga existente ), um professor de genética engravida uma prostituta usando uma raiz de mandrágora, em conseqüência nasce uma linda menina chamada Alraune e o professor a adota como filha. A menina quando cresce se torna uma linda e sedutora mulher desprovida de senso de moralidade, o que obriga o professor a se mudar de cidade em cidade para evitar um escândalo público. Quando Alraune lê o diário do “pai” e descobre como foi gerada, passa a se vingar do professor, gastando todas as economias da família, para em seguida fugir com o sobrinho do professor. Abandonado, o professor morre na miséria.

Alraune é o nome da lenda e neste caso também o nome da personagem principal. É um ser artificial, mas criado através de artes mágicas. Esta história é distópica e foi adaptada pelo cinema alemão, com algumas variantes, em 1918, 1928, 1930 e 1952 demonstrando a importância desta lenda para o imaginário germânico.


1920 – O Golem: Como Ele Veio ao Mundo – Esta é a versão cinematográfica mais conhecida da lenda que tem raízes na própria bíblia. Ela é citada no salmo 139:16. Nesta lenda de origem judaica, através da magia, um rabino ou detentor de poderes mágicos, pode criar um ser artificial a partir do barro. São três os filmes de Paul Wegener sobre o Golem. O primeiro é “O Golem” (1915), o segundo é “ O Golem e a bailarina” (1917) e o terceiro é “O Golem: como ele veio ao mundo” de 1920. Há também uma refilmagem francesa de 1936 do filme de 1920. O primeiro filme de 1915 se passa no começo do século 20. O segundo é um filme leve do tipo fantasia. O terceiro aborda a lenda de maneira mais fiel. Os filmes de 1915 e 1917 são considerados perdidos. No filme de 1920, em branco e preto mudo, o rabino Loew cria um golem para proteger seu povo que vive no gueto de Praga. A historia se passa no século 16 e Luhois, o monarca, decreta que os judeus deverão sair da cidade. Loew se dirige ao castelo do rei levando consigo o golem. Enquanto entretém a corte, o palácio começa a ruir e o golem segura o teto permitindo que todos fujam. Em recompensa o rei anula o decreto que expulsava os judeus da cidade. Após voltar para casa, Loew desativa o golem. No entanto, Famulus ( assistente de Loew ), está apaixonado por Mirian, filha de Loew. Sendo rejeitado por ela, Famulus reativa o golem para que este mate Florian o namorado de Mirian. O golem joga Florian do alto da casa e a incendeia. O golem passa a destruir o gueto e Loew desfaz o feitiço destruindo a criatura. O povo comemora enquanto Famulus e Mirian se reconciliam e ficam juntos. A lenda do Golem retrata a arrogância do homem em querer se equiparar a Deus. Por ser imperfeito sua criação se volta contra ele obrigando-o a destruí-lo. Trata-se portanto de uma distopia. Esta lenda também serviu de inspiração para Mary Shelley criar Frankenstein.


1940 – Pinóquio – Filme de animação baseado no livro de Carlo Collodi escrito em 1883. O livro e o filme possuem histórias muito parecidas. Porém o filme popularizou a história de Gepetto, um velho marceneiro que não tendo filhos, esculpe um boneco de madeira. Durante a noite, uma fada transforma o boneco num ser vivo, mas ainda de madeira. Gepetto passa a cuidar de Pinóquio como um filho. O sonho de Pinóquio é ser um menino de verdade. Após uma série de aventuras a fada atende ao pedido de Pinóquio transformando-o num

menino de carne e osso. Nesta historia existem ecos do mito de Pigmalião. Na mitologia grega Pigmalião cansado de ser traído por várias de suas esposas, decide criar a mulher perfeita esculpindo-a em mármore.

A estátua ficou tão perfeita que Pigmalião se apaixona por ela. Comovida por este amor a deusa Afrodite transforma a estátua numa mulher real, com quem Pigmalião se casa.

Excluindo-se a questão sexual, a historia de Pinóquio é bem parecida. Tanto num caso como em outro, o ser artificial é transformado através de magia em ser vivo, e neste caso é difícil a classificação andróide/ginóide pois ambos se tornam humanos. Ambos são histórias utópicas. Curiosamente o mito de Pigmalião serviu de base para diversas outras histórias que foram adaptadas para o cinema, são elas: Pigmalião de 1938, dirigido por Anthony Asquith, baseado na obra de Bernard Shaw, onde o professor Henry Higgins tem que transformar a florista Eliza Dolittle numa dama da sociedade. A mesma história é contada no musical My Fair Lady de 1964 dirigido por George Cukor. Também há A Megera Domada de 1967 de Franco Zefirelli baseado na obra homônima de Shakespeare, onde Petruquio, um nobre decadente, aceita se casar com a terrível Catarina e transformá-la numa mulher dócil.


SERES CIBERNÉTICOS


ROBOTS


1951 – O Dia em Que a Terra Parou – Neste filme dirigido por Robert Wise, um disco voador chega a Terra trazendo o alienígena Klaatu, acompanhado pelo robot Gort. Klaatu traz um aviso aos terráqueos: nenhuma violência será aceita contra os outros povos do universo. O robot Gort foi programado para destruir qualquer tipo de agressor. Klaatu explica que esta foi a única saída que sua espécie encontrou para coibir todo tipo de violência. Após ser morto e ressuscitado Klaatu alerta a humanidade e volta para seu planeta. Neste caso, o robot é na verdade um andróide pois possui cabeça, tronco e membros. Mesmo sem ter um rosto e portanto não demonstrar emoções este é considerado um dos seres cibernéticos mais assustadores do cinema. Este filme trouxe uma mensagem pacifista num período em que estava se iniciando a

guerra fria. Pode-se considerá-lo como tendo uma mensagem utópica. Este filme teve uma nova versão em 2008 dirigida por Scott Derrickson.


1958 – O Monstro de Nova York – este filme um famoso cientista morre em um acidente e seu pai, inconformado, transfere o cérebro do filho para o corpo de um robot. A principio o cérebro se adapta bem ao novo corpo mecânico, mas aos poucos passa a desenvolver dons de telepatia e premonição. Logo se torna violento e ataca Nova York. No entanto ao se deparar com seu filho, um menino de dez anos, a criatura percebe que não tem lugar neste mundo e se mata pulando do alto de um edifício. Apesar de não ser um filme memorável a criatura possui uma característica incomum: apesar de parecer um robot é na verdade um cyborg, pois nasceu biológico e recebeu extensões/próteses eletro/mecânicas. Trata-se de um filme distópico.


1965 – Perdidos no Espaço – Série televisiva que mostrava as aventuras espaciais da família Robinson. A série foi produzida pela Twenty Century/Fox entre 1965 até 1968. A trama tem inicio no ano de 1997, quando a família Robinson parte num disco voador chamado Jupiter-2 para Alfa-Centaury. Antes da partida o espião Dr Smith vai a bordo e reprograma o robot B9 para destruir a nave e seus tripulantes logo após a partida. Porém Smith fica preso na nave que decola. O robot passa então a destruir o sistema de navegação da espaçonave obrigando Smith a acordar os Robinsons que eram mantidos num estado de animação suspensa. O robot é desligado e reprogramado, no entanto os estragos são grandes e a nave fica vagando sem rumo pelo espaço, obrigando os Robinsons a pousarem no primeiro planeta que encontram. A partir daí começam as aventuras da família que a cada episódio encontram os mais estranhos alienígenas. Esta série tem sua importância por popularizar os robots, andróides, computadores e o conceito de alienígenas. Esta produção teve como base o livro Os Robinsons Suíços escrito em 1812 por Johann Wyss, e que por sua vez se baseou no livro Robinson Crusoe escrito em 1719 por Daniel Defoe. Apesar do robot possuir braços ele não pode ser considerado um andróide. A série por sua fanfarronice pode ser considerada utópica, apesar da família Robinson estar perdida, longe da civilização. Em 1998, foi lançado nos cinemas


Bibliografia


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Webgrafia


American Film Institute - www.afi.com