https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.11096

# 21


ISSN 1832-9488


EDITORIAL

CRISTINA BONFIGLIOLI | A academia em tempos de pandemia



(08/2020 – 01/2021)

Núm. 21 Invierno 2020


ARTÍCULOS

MARCUS ALVES | Social time in the augustinian philosophy: the indexical retrospective interpretation of a sacred linear history

RIVAS PEDRO | Bien común e interés público en el pensamiento de Alasdair MacIntyre: consideraciones a propósito de un texto inédito

OMAR ALEJANDRO MURAD | La figura de la víctima: genealogía y usos argumentativos

LETÍCIA HELENA FERNANDES DE OLIVEIRA | O que é preciso para fazer o mundo? A physische geographie de Immanuel Kant

JOSÉ MARÍA GIL | Sobre el valor de la literatura para la enseñanza de la lengua

ANTONIO AUGUSTO PASSOS VIDEIRA; CARLOS PUIG | Realidad, lenguaje y belleza según Werner Heisenberg


ENTREVISTAS

NICOLÁS MARTÍNEZ SAEZ | Entrevista a Ángel Molina Molina.


RESEÑAS

EMILIO ALOCHIS | Reseña de Los bordes de la ficción, de Jacques Rancière

ELÍAS BRAVO | Reseña del libro Wittgenstein de Federico Penelas


https://periodicos.unifesp.br/index.php/prometeica/index info@prometeica.com

 

 

Equipo editorial


Editor en jefe

Emiliano Aldegani (Universidad Nacional de Mar del Plata, Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas, Argentina)


Editores Adjuntos

Cristina Bonfiglioli (Universidade de São Paulo, Brasil)

Flaminio de Oliveira Rangel (Universidade Federal de São Paulo, Brasil)

Ivy Judensnaider (Universidade Paulista, Universidade Estadual de Campinas, Brasil) Jimena Yisel Caballero Contreras (Universidad Nacional Autónoma de México, México)


Secretaria de redacción

Jimena Yisel Caballero Contreras (Universidad Nacional Autónoma de México, México)


Comité editorial

Agustin Adúriz Bravo (Universidad de Buenos Aires, Argentina), Alberto Clemente De La Torre (Universidad Nacional de Mar del Plata, Argentina), Ana Paula Bispo (Universidade Estadual da Paraíba, Brasil), Arindam Bose (Tata Institute of Social Sciences (TISS), India), Charbel El-Hani (Universidade Federal da Bahia, Brasil), Fernando Santiago dos Santos (Instituto Federal de São Paulo, Brasil), Xavier Ruiz Collantes (Universitat Pompeu Fabra de Barcelona, España), Jimena Yisel Caballero Contreras (Universidad Nacional Autónoma de México, México), Lucas Emmanuel Misseri (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas, Argentina), Maria Elice Brzezinski Prestes (Universidade de São Paulo, Brasil), Mariano Nicolás Hochman (Universidad de Buenos Aires, Argentina), Renato Marcone José de Souza (Universidade Federal de São Paulo, Brasil), Silvia Dotta (Universidade Federal do ABC, Brasil), Thais Cyrino de Mello Forato (Universidade Federal de São Paulo, Brasil), Vasil Gluchman (University of Prešov, Eslováquia), Waldmir Nascimento de Araujo Neto (Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil).


Asesores académicos externos

Abigail Vital – Centro Federal de Educação Tecnológica – RJ, Brasil, Alexandre Bagdonas – Universidade Federal de Lavras, Brasil, André Noronha – Instituto Federal de São Paulo, Brasil, Boniek Venceslau da Cruz Silva – Universidade Federal do Piauí, Brasil, Breno Arsioli Moura – Universidade Federal do ABC, Brasil, Carlos Eduardo Ribeiro – Universidade Federal do ABC, Brasil, Carlos Roberto Senise Júnior – Universidade Federal de São Paulo, Brasil, Daniel Quaresma Figueira Soares – Universidade de São Paulo, Brasil, Danilo Cardoso – Universidade de São Paulo, Brasil, Denilson Cordeiro – Universidade Federal de São Paulo, Brasil, Esdras Viggiano – Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil, Evaldo Araujo de Oliveira Filho – Universidade Federal de São Paulo, Francisco Ângelo Coutinho – Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil, Guilherme Brockington – Universidade Federal do ABC, Brasil, Helio Elael Bonini Viana – Universidade Federal de São Paulo, Brasil, Isabelle Priscila Carneiro de Lima – Instituto Federal da Bahia, Brasil, Ivã Gurgel

Brasil, Nei de Freitas Nunes Neto – Universidade Federal da Grandes Dourados, Brasil, Renato Kinouchi – Universidade Federal do ABC, Brasil, Renato Marcone José de Souza – Universidade Federal de São Paulo, Brasil, Simone Alves de Assis Martorano – Universidade Federal de São Paulo , Simone Nakaguma – Universidade Federal de São Paulo, Winston Schmiedecke – Instituto Federal de São Paulo, Brasil.

Formato de la publicación

Digital: Portable Document Format (PDF), Hyper Text Markup Language (HTML), Extensible Markup Language (XML), formato de e-books (ePub).

Idiomas aceptados

Castellano, portugués e inglés (lenguas de la publicación).

Normas de publicación https://periodicos.unifesp.br/index.php/prometeica/about/submissions Contacto

info@prometeica.com

Responsable

Emiliano Aldegani (Universidad Nacional de Mar del Plata, Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas, Argentina)

Diseño de isologo

Victoria Reyes (http://www.victoriareyes.com.ar)


Imagen de portada

Werner Karl Heisenberg: (Würzburg, 5 de diciembre de 1901 - Munich, 1 de febrero de 1976) fue un físico teórico alemán que recibió el Premio Nobel de Física en 1932, "por la creación de la mecánica cuántica, cuyas aplicaciones llevaron al descubrimiento, entre otras, de formas alotrópicas de hidrógeno". (https://pt.wikipedia.org/wiki/Werner_Heisenberg)

 

 

 

Contenidos #21


EDITORIAL

5-6 | CRISTINA BONFIGLIOLI | A academia em tempos de pandemia


ARTÍCULOS

7-19 | MARCUS ALVES | Social time in the augustinian philosophy: the indexical retrospective interpretation of a sacred linear history

20-34 | RIVAS PEDRO | Bien común e interés público en el pensamiento de Alasdair MacIntyre: consideraciones a propósito de un texto inédito

35-46 | OMAR ALEJANDRO MURAD | La figura de la víctima: genealogía y usos argumentativos

47-56 | LETÍCIA HELENA FERNANDES DE OLIVEIRA | O que é preciso para fazer o mundo? A physische geographie de Immanuel Kant

57-72 | JOSÉ MARÍA GIL | Sobre el valor de la literatura para la enseñanza de la lengua

73-84 | ANTONIO AUGUSTO PASSOS VIDEIRA, CARLOS PUIG | Realidad, lenguaje y belleza según Werner Heisenberg


ENTREVISTAS

85-88 | NICOLÁS MARTÍNEZ SAEZ | Entrevista a Ángel Molina Molina.


RESEÑAS

89-92 | EMILIO ALOCHIS | Reseña de Los bordes de la ficción, de Jacques Rancière

93-95 | ELÍAS BRAVO | Reseña del libro Wittgenstein de Federico Penelas

 

 

 

Editorial


https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.11099


A ACADEMIA EM TEMPOS DE PANDEMIA

A pandemia de Covid-19 deixou claro que o mundo não está exatamente dividido em países desenvolvidos, países emergentes e países pobres. Em todas as nações do planeta tem sido possível observar a fragilidade de inúmeros grupos sociais, que em seus próprios territórios nacionais, enfrentam as agruras provocadas pelo novo coronavírus.


Desse modo, tão logo instalou-se enquanto indelével realidade sanitária, a Covid-19 tornou-se foco de discussão em diferentes grupos acadêmicos do mundo todo, particularmente aqueles que não lidam com a doença diretamente. A principal questão que tem perturbado investigadores nas áreas de Ciências Humanas parece ser a de como produzir pensamento crítico e relevante diante dos números crescentes e impactantes de contaminados e de óbitos em todas as regiões do planeta. Como persistir conduzindo pesquisas em nossa área, que parece não poder contribuir de imediato para auxiliar na solução desse problema mundial e diante da expectativa do retorno do vírus e do consequente aumento de casos de contaminação em regiões nas quais a disseminação da doença está, aparentemente, sob controle? São inúmeros os debates realizados em transmissões ao vivo nas plataformas de vídeo, cujas gravações circularam pelas redes sociais, e em textos publicados em jornais e editoras que tornaram gratuitos o acesso aos seus conteúdos. Pensadores, filósofos ou não, como Byung-Chul Han, Miguel Nicolelis, Giorgio Agamben, Peter Sloterdijk, Jacques Rancière, Judith Butler, Antonio Negri, Vladimir Safatle, Natália Pasternak, Jérôme Baschet, Paul B. Preciado, Débora Danowski, Jean-Luc Nancy, José Gil, Emanuele Coccia, Eliane Brum, Eyal Weizman, Silvia Federici, Philippe Descola, Donna Haraway, Eduardo Viveiros de Castro são alguns dos que tornaram públicas experiências da pandemia a partir de suas áreas de atuação acadêmica, instigando-nos a pensar coletivamente sobre esse novíssimo flagelo humano.

Para alguns, o gesto maior de resistência é a militância política ou o ativismo solidário, que procura centrar esforços na ação em favor das populações em maior situação de risco frente à doença. Para outros, a escrita acadêmica é em si mesma uma forma de resistência, um modo de fazer o pensamento permanecer, de mostrar a resiliência e a potência que o pensamento tem de nos forçar a pensar, como disse Gilles Deleuze. Uma forma de usar o pensamento crítico como ato que fortalece o presente e prepara para o futuro, ainda que incerto.

A equipe de editores de Prometeica optou por essa segunda vertente e foi extremamente interessante perceber, ao reler os textos para a redação deste editorial, como os temas escolhidos para compor esta edição coincidentemente tangenciam ou até mesmo lidam diretamente com questões, conceitos e noções que nos são caros neste momento. Cada artigo ganhou uma nova significação pelo olhar de alguém que está, como muitos colegas da academia, mergulhada em lucubrações sobre o que nos aguarda a partir dessa prática nova que se impôs a todos, a do distanciamento social, a única prática realmente efetiva e definitivamente vinculada a uma ação de resistência, segundo Ghassan Hage.


Assim, curiosamente, esta edição número 21 apresenta textos a partir dos quais é possível pensar essa experiência única, intensa e comum a todos nós, provenientes desse mau encontro com o novo coronavírus. Experiências advindas do isolamento social, da perda, do luto, da solidariedade, do medo, da revolta face a ações governamentais ineficazes, contraditórias ou mesmo irresponsáveis.


Na abordagem realizada por Marcus Alves temos o interessante debate acerca da noção de tempo em Santo Agostinho e seu delineamento como tempo psicológico e social no cristianismo, a partir de seu esforço epistemológico para separar o tempo entendido como a eternidade divina do tempo percebido como duração humana.

Omar Alejandro Murad realiza uma análise metalinguística da noção de vítima a partir da visada interpretativa de Rene Girard, explorando a genealogia do termo e de seu uso desde as narrativas míticas até sua inserção nos discursos contemporâneos que organizam intervenções públicas coletivas e individuais acerca da figura da vítima.

Letícia Helena Fernandes de Oliveira explora as relações entre dois cursos seminais de Kant: o curso de Physische Geographie e sua Anthropologie, defendendo a importância da primeira para o desenvolvimento da segunda, bem como a relação dessas obras com a proposta kantiana referente à importância de ambas as experiências, uma vinculada à natureza e outra ao homem, para o conhecimento do mundo (Weltkenntniß).

Em seu artigo sobre o ensino de línguas, José María Gil investiga como o estudo de textos literários pode ser o eixo organizador do ensino da língua materna, uma vez que parece favorecer muito o desenvolvimento das competências de leitura e de comunicação.


Carlos Puig, por sua vez, realiza uma análise das noções de beleza e verdade nas Ciências Naturais, em especial na linguagem matemática, a partir do pensamento do físico alemão Werner Heisenberg (1901-1976). Puig explicita a relação estreita que o físico percebia entre a beleza dos fenômenos naturais e a beleza da ciência, enquanto linguagem matemática que busca a verdade, bem como o modo pelo qual o físico alemão recorre aos filósofos da Antiguidade e suas definições, para defender seu ponto de vista.


Explorando a filosofia política de Alasdair MacIntyre, Rivas Pedro discute as teses do filósofo acerca do bem comum, a partir de um conjunto de palestras do autor de 1994, algumas consideradas inéditas, com o objetivo de explorar a ideia de interesse público como conceito que estrutura as comunidades políticas modernas.


Ainda nesta edição, Nicolás Martínez Saez conversa com o medievalista Ángel Molina Molina sobre o surgimento dos jogos e outras formas de recreação na Idade Média e os paralelos possíveis com o papel do jogo no desenvolvimento da Ciência e da Filosofia modernas.

Por fim, a seção Resenhas conta com a colaboração de Emilio Alochis, que nos brinda com uma exposição cuidadosamente comentada de Los bordes de la ficción (2019), um conjunto de ensaios de Jacques Rancière sobre as relações entre escrita literária e a realidade a partir de obras de ficção e de não-ficção, enquanto Elías Bravo apresenta com detalhes preciosos o livro Wittgenstein (2020), resultado de um minucioso trabalho de investigação de Federico Penelas sobre o filósofo austríaco.


Apesar de reconhecermos os tempos difíceis que todos enfrentamos, é com alegria e muita esperança por dias melhores que entregamos aos leitores assíduos ou aos novos interessados em Prometeica mais uma edição.

Este foi o primeiro número de Prometeica editado durante a quarentena provocada pela pandemia de Covid-19. Esperamos que seja, também, o único, e que em breve as vidas de todas as pessoas em todo o mundo possa retornar de algum modo ao feliz hábito do convívio social amiudado que faz da nossa existência algo tão raro e precioso.


Estejam bem e aproveitem a leitura.


Cristina Bonfiglioli

Editora Adjunta

 

 

 

Artículos


https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.9988


SOCIAL TIME IN THE AUGUSTINIAN PHILOSOPHY:

THE INDEXICAL RETROSPECTIVE INTERPRETATION OF A SACRED LINEAR HISTORY


TEMPO SOCIAL NA FILOSOFIA DE AGOSTINHO:

a interpretação indicial retrospectiva de uma história sagrada linear


TIEMPO SOCIAL EN LA FILOSOFÍA AGUSTINIANA:

la interpretación retrospectiva indicial de una historia lineal sagrada

Marcus Alves
(Universidade Nove de Julho)
marcus.lyra@gmail.com


Recibido: 19/11/2019
Aprobado: 17/04/2020


ABSTRACT

The present essay focuses on ‘social time’, as distinct from the concept of this phenomenon on the scope of physics. Social time here inhabits the discourse, the habitus, expressed through practice as a medium over which human actions are formulated according to the logical possibilities it provides. Christianity knowingly propounded a linear history, as an endless process, and albeit sacred, punctuated by divine interventions. However, this linear sacralized history could only be properly understood with an exegetic medieval system; a set of intellectual rules rationally organized for the reconstruction of history through dormant signs and similes. The work of Augustine of Hippo provided tools for these interpretations. We attempt to demonstrate that we can find foundations of a Christian model of social time in his works, being ‘indexical’, as a meaning-creating process based on a retrospective reading of the linear history, an open book prone to interpretation. Augustine’s formulations about a psychological time, as a founding father of Christian theology, provide some important cues to this social notion of indexical time, and how it became so central to Western culture.


Keywords: Augustine, social time, discourse, signs.


RESUMO

O presente artigo enfoca o 'tempo social', como distinto das compreensões desse fenômeno na física; o tempo social habita o discurso, o habitus, expresso pela prática como um meio sobre o qual as ações humanas são formuladas de acordo com as possibilidades lógicas que fornece. Reconhecidamente, o cristianismo propôs uma forma histórica linear, como um processo contínuo embora ainda sagrado, pontuado por intervenções divinas. No entanto, essa história linear sacralizada só poderia ser adequadamente entendida por meio do sistema medieval exegético; um conjunto de regras intelectuais organizadas racionalmente para a reconstrução da história através de sinais e símiles inativos. Biograficamente, o

trabalho de Agostinho de Hipona forneceu ferramentas para essas interpretações. Podemos encontrar algumas das bases de um modelo cristão de tempo social, sendo a 'indexicalidade' como um processo de criação de significado com base na leitura retrospectiva da história linear como um livro aberto que pode ser interpretado. As formulações de Agostinho sobre seu tempo psicológico, como pai fundador da teologia cristã, fornecem algumas pistas importantes para essa noção social de tempo indicial e como ela se tornou tão central na cultura ocidental.


Palavras-chave: Agostinho, tempo social, discurso, signos.


RESUMEN

Este artículo se centra en el "tiempo social", a diferencia del concepto de este fenómeno en la física; el tiempo social habita el discurso, el habitus, expresado por la práctica como un medio sobre el cual las acciones humanas se formulan de acuerdo con las posibilidades lógicas que proporciona. Es cierto que el cristianismo ha propuesto una forma histórica lineal, como un proceso continuo, pero aún sagrado, marcado por la intervención divina. Sin embargo, esta historia lineal sacralizada solo podía entenderse adecuadamente a través del sistema exegético medieval; un conjunto de reglas intelectuales racionalmente organizadas para la reconstrucción de la historia a través de signos y símiles inactivos. Biográficamente, el trabajo de Agustín de Hipona proporcionó herramientas para estas interpretaciones. Podemos encontrar algunos de los fundamentos de un modelo cristiano del tiempo social, con la "indexicalidad" como un proceso de creación de significado basado en la lectura retrospectiva de la historia lineal como un libro abierto que puede interpretarse. Las formulaciones de Agustín de su tiempo psicológico, como el padre fundador de la teología cristiana, proporcionan algunas pistas importantes sobre esta noción social del tiempo índice y cómo se ha vuelto tan central para la cultura occidental.


Palabras clave: San Agustín, tiempo social, discurso, signos.


  1. Augustine and the subjectivist temporality


    Regarding the great Christian influencers at the beginning of our era to deal with the theme of ‘time’ as a leading factor in the organization of mundane affairs, a name that cannot be left aside is that of Aurelius Augustinus Hipponensis (354AD to 430AD), Augustine of Hippo, or Saint Augustine. Having become a referential pinnacle by the intellectual influence and cultural value conquered by himself, it is said that Augustine - after Saint Paul - “was the figure who played the most important role in the establishment and development of Christianity.” (le Goff, 2005: 16). His contribution to what would become the final aesthetics of the Christian linear temporality is also undeniable; Augustine was “Prominent among the early Church Fathers who, in their struggles against rival doctrines competing for the spiritual conquest of the Greco-Roman world, vigorously disputed the traditional cyclical view of time” (Whitrow Apud Fraser, 1972: 6). Augustine lies in the centrality of Christian construction of social time; in several excerpts of his works, be it de Doctrina, Confessions or City of God, the repetition of the Augustinian angst to uncover the nature of time draws attention. In the extensive work of Augustine, we find a curious constancy of themes related to the concepts of time and duration, even if cited en passant, varying from explanations regarding the creation of the world to more particular questions such as if the time of God differs from that of mundane creatures.

    The extension of his work exceeds the efforts of the present analysis, forcing us to focus on two of his most influential publications - that became official documents of the intellectual centrality of the Christian world - being De Doctrina and Confessions. Important to reinforce though that there is no consensus whether Augustine provided a definitive answer regarding time (Wetzel, 1995: 341). We should, however, consider the fact that many of the published researches on the topic consider ‘time’

    as a natural phenomenon that Augustine could potentially elucidate, and this perspective deeply diverges from the efforts of the present work. As James Wetzel puts it, Augustine is one of the most investigated theoreticians of Christianity and much has been said about his conceptions of time and eternity, but few take it from the vantage point of a reflex of a deeper historical context, so instead of a physical validation of his theory, “The best interpretations convey some religious gravity of Augustine's interest in time.” (Wetzel, 1995: 341). Here, however, we aim on investigating the epistemic sense of temporality in Augustine’s philosophy that provides meaning to a historical narrative, a Christian model of time that culturally bears an indexical foundation, based upon an interpretation of signs in a socially sustained historical narrative intending to provide an understanding of history through retrospective interpretation, by means of exegesis and other rational hermeneutic tools. This retrospective interpretation is the most important aspect of the Christian model of social time as we should explicate ahead.


    To begin with, we find the work entitled de Doctrina Christiana, four volumes written between 379 and 426 AD, in which Augustine, through his rhetorical style inherited from teaching Cicero’s Rhetorica (Chadwick, 2009: 12), already discerned different dimensions of time as distinct qualities between levels of existence, that convey a judgment of value and function to human actions. This work of Augustine’s - one of the most influential of the church among those that precede the Summa of Aquinas’ - had as its main function, to serve as a guide to the craft of teaching the Christian doctrine, as its name well presumes. It stood for the merit of providing orientations to the efforts of the exegetic and hermeneutic works, mainly supporting the appropriate interpretation of signs and similes spread in sacred biblical texts. Among the elements presented by the work as practical orientations to the ecclesiastical educators, we find: (i) grammar in its prototypical shape, claiming that the educator should not associate its knowledge concerning the bible only by its straight illuminations, but should instead, be fully capable of identifying within the net of an inspired text the meaningful elements. (ii) Geography and natural history standing to the realm of being capable of interpreting the relations between conditions of places and creatures taught about in biblical texts. (iii) Technology - whilst useful to interpreting similes and analogies provided by inspired scriptures. (iv) Pagan studies that englobe astrology and magical knowledge employed on discerning the origin of profane knowledge.

    (v) Logic - indispensable once the validation of logical inferences was not considered a plain human creation, but a “finding of a divinely provided fact” (Chadwick, 1995: 86). (vi) And lastly comes the concept central to the present analysis: Chronology. There should be a way for properly interpreting the meaning of history, and that takes place on retrospective interpretation of signs hidden in the Holy texts. This aspect also arrives as validation of argumentative processualities, helping to construct a logic narrative to a bigger and wider worldview. For example, in that time, “Ambrose had made a great impression by his claim that Jeremiah and Plato lived in the same century and therefore could easily have met and conversed in Egypt” (Chadwick, 1995: 86). Thus, the senses of chronology and logic were somehow entangled.

    However, the conception of a chronology bears with it something even more valuable than standing solely as an argumentative tool, being: the construction of bonds between historically correlated facts rendering a trans-historical textuality liable to an exegetical interpretation. What we have at hand with the work of Augustine in de Doctrina is a perspective of a deep awakening of senses towards the world, instrumented by ‘inspired reason’, as an operation of logical mechanisms in search of meanings, presumably inscripted in the world's materiality, dormant, waiting to be revealed through a proper conduct. Augustine (1995: 16) writes: “All teaching is the teaching of either things or signs, but things are learnt through signs. These are things, but they are at the same time signs of other things.” He goes further on discerning meaningful signs from simple material ‘things’, - that reinforces the need for a specific science of interpretation - in his words: “So every sign is also a thing, since what is not a thing does not exist. But it is not true that every ‘thing’ is also a sign” (Augustine, 1995: 16). So only trained eyes could decipher what is and what is not a sign of an ultimate truth. This conception of time present in Augustine’s works can only make sense if we consider that in de Doctrina he promulgates a worldview in which we are distanced from the promised land, trapped in a world-

    medium that sustains a meaningful web of signs, not disposed to aesthetic admiration only, but to investigation through inspired forms of discernment, we read:

    So in this mortal life we are like travellers away from our Lord: if we wish to return to the homeland where we can be happy we must use this world, not enjoy it, in order to discern ‘the invisible attributes of God, which are understood through what has been made’ or, in other words, to ascertain what is eternal and spiritual from corporeal and temporal things (Augustine, 1995: 17 - our emphasis).


    It is not a surprise that the prominence of temporal questions in Augustine’s works must occupy the centrality of the whole exegetic conception of the world, once narrativity is the facet of a linearized form of sacred history brought about by the Christian doctrine. First, it is deeply relevant to comprehend that Augustine does not deal with time as a substance of any physical order. Wetzel claims that the descriptive method of physics, to Augustine, appears to be only one more way to elucidate the perception of time as a phenomenon of consciousness (Wetzel, 1995: 343). This psychologist perspective from Augustine’s approach to temporal questions is crucial and it appears to be its problematic core. For instance, this same issue apparently raised great suspicion in Western philosophy. Russel and Wittgenstein came to a hard schism about Augustine’s works, as Wetzel puts it:


    Russell has Augustine begin with the world of time, only to lose it over the course of inquiry, whereas Wittgenstein has Augustine first lose his hold on time's reality, then regain it upon reflection (Wetzel, 1995: 343).


    The relation with the aspect of time as a meaningful attribution to an external ‘thing’ implies that although it is external and presumably objective, it can only be ultimately grasped as a phenomenon of consciousness. It is hard not to consider that, for these reasons “Of the great philosophers of the twentieth century, Wittgenstein probably comes closest to sharing Augustine's conception of philosophy” (Wetzel, 1995: 344). And then comes the problem of God’s ‘being’. Chronologies reside in the basis of the narrative structure of the Christian historical myth, and thus, face an epistemological aporia if one considers Augustine’s perspective of time: underneath the whole concept of historical chronology, there must be a permanently present deity immersed in an eternal temporal configuration. He provides a few answers in his parallel work “Confessions” (written between 397AD and 400AD), where we find a more explicit division on types of time, being ‘duration’ and ‘eternity’ systematically examined; “in the Eternal nothing passeth, but the whole is present; whereas no time is all at once present” (Augustine, 2005: 199). The ambivalence between ‘duration’ and ‘eternity’, claims Weinert, casts some troubles on the trail of establishing the concept of a purely linear time on the beginning of Christianism, forcing Augustine to define whether God inhabits human time or something else. For Augustine the answer is quite simple; God must be outside human time (Weinert, 2013: 13). It happens because questioning the classic paradigm about the broken inertia the act of Creation would mean that Augustine apparently knew that God should stand outside its own creation for a reason: If God inhabited the progressive temporal dimension as humans do, it would suppose that He would have made a ‘decision’ after being idle for a long time, implying that there occurred a shift of intentions that opens for interpretations concerning the perfection of the divine being. This aporia is registered in Confessions, seventh book, fifth chapter. God, thus, was and has always been the same apart from the creation, as He stands in eternity while humans inhabit duration.

    If God takes a decision in time, then time should be prior to God Himself. But what the Holy text says about it? The concept of creation ex nihilo is present in the Bible as “He spoke and they were made” (Psalm 33.9) and “By the word of the Lord were the heavens established” (Psalm 33.6). But a history immersed in a temporal linearity forces God to be expelled from inside of its own creation so that no vulnerability in his perfection has to be assumed through a discontinuity. To Augustine, “the divine act of creation is eternal, and there is no room for questions like “What was God doing before he made heaven and earth?” (Williams Apud. Stump & Kretzmann, 2006: 61). This weakness would be implied in the change inside the deliberation of a deity that ‘chooses’, takes decisions, comes to conclusions, thus creating what was not already foreseen. To create something is to undergo the decision of creation, to bring to an existence what was not there beforehand, configuring a change of ‘state’. In

    Revelation 1:8 we read: “I am the Alpha and the Omega - says the Lord God - who is and who was and who is to come, the Almighty.” Augustine was the one who, out of opposition to the pagan sarcasm of his day, needed to dissociate God from human time, avoiding a current confusion. They believed the eternity in which God dwelt to be an extension of the same time humans lived. Considering the act of creation in the face of this question would mean that creation was a spontaneous and deliberate act, compelling the understanding that God had made a ‘decision’ (that of creating the universe) and was thus previously idle. This prospect deeply troubled Augustine, even regarding Christian supporters; he emphatically wrote in Confessions “At no time then hadst Thou not made any thing, because time itself Thou madest” (Augustine, 2005: 200). As registers go, in response to the troubling question, "So what was God doing before He created everything?" They would repeatedly say, "It made hell hotter for curious questioners" (Chadwick, 2009: 135).

    Bullying with God, however, was not constrained to mere anecdotes and these issues became a very prolific source of questions centered on the discussion of the origin or nature of time. To understand the reason why this became a problem, it is necessary to keep in mind that the divine loneliness of monotheism completely ceases the dialogs in superior spheres - the dialog of the gods - opposite to what was common in Greek theogonies in their mythology, meaning that the Christianized universe becomes deeply silent, hence, being the silence itself the proof of a superior form of wisdom. As God cannot make decisions, the world is as it is, as it was, and as it is to come, as one. In this sense, Augustine’s account on the condition of the material world reflects a straight opposition to the creation of Plato’s Timaeus - a great reference of his time - in which reality comes into being as a reification of a demiurge’s will, so “Augustine rejects this account of creation as fabrication because of its presupposition that matter is coeval with God” (Mann Apud. Stump & Kretzmann, 2006: 41).


    It is also true that Augustine vehemently opposes the Christians who conceived eternity as a long duration, as if God could become weary within it (Chadwick, 2009: 135), hence, he takes the deity away from human history, embracing its completeness, but not dwelling within its movement. We find in these initial arguments a pattern of logical confusions that cannot be taken simply as deviations, but as symptoms of a greater historical and contextual pathos, heading towards the elaboration of an intellectual constructo about the inference of a deity in human history as the keystone of an indexical notion of social time. As Augustine elaborates a linear historical time for humans, and places God in an ‘eternal present’ found in the past and future all at once, the proposition between this and a temporal progression keeps bringing epistemological troubles, and it inserts God repeatedly into a fluid time (Marenbon, 2007: 54). We detect that much of these confusions, again, might derive from a heavy influence of Platonism (Whitrow, 1988: 191), whose basis do not leave space for metaphysical claims that comprehend distinct temporal dimensions.


    The Christian theological-philosophy stresses the need for a universal unity, in such a way that the descriptions of time-related categories follow rhetorical elaborations forcing them to ponder whether positive or negative in relation to this “universality”. This accounts to say that all the argumentative construction in this line of thought is based upon differentiation, having at its principle the epistemological tool of the concept of ‘resemblance’. If time is movement, then the Augustinian metaphysics apparently deduced that ‘eternity’ should presume a single never-ending moment - a stretched fragment - of the continuous time. With this, Augustine projects the same ‘time’ he experiences into the universe, as Farndell claims, so on the one hand God and humans inhabit different dimensions of temporality, while on the other, ‘eternity’ and ‘time’ are more into a distinct approach to the same condition, once the ‘eternity’ in early Christianity is, after all, a never ending ‘now’ (Farndell, 2010: 77). Consistent to all the temporal revolutions in the church’s dogma, perhaps here we witness the rise of the first components of an indexical approach to social time. Indexical time is a social discourse of time, promulgated and maintained orbiting the premise that “If Nature revealed such careful planning, it was easy to assume that history too was the unfolding of a design” (Haber Apud. Fraser 385). The hugeness of this postulate is such that we may say that this notion of time only finds a paradigm of such grandeur when Darwin creates a drastically new perspective of temporality deprived from ‘design’.

    Such had been the view of Christianity since St. Augustine, and even in the secularization of the Enlightenment, when salvationist history was under attack, it was easy to retain the concept of a transcendental time pattern in history through a divinized Nature (Haber Apud. Fraser: 385).


    To explicate its relations, Augustine discerns two forms of time, namely: the intended time and the distended time; the first being a composition of time as a conscious element, the latter as an exogenous temporality (Wetzel, 1995: 347). It is notable that these are adjacent issues extracted from the necessities imposed by the theism: In response to these difficulties, Augustine finally confers to the humanly experienced time a strictly psychological aspect. To this question, foreshadowed in Chapter 14 of the book XI, Augustine’s answer is only provided in chapter 27. There, we read that time is “a mental affection, or a disposition of his mind” (Wetzel, 1995: 346). To grasp the foundations of this gradual shift from the notion of a cosmic time towards a human-based mode of time, it is crucial to comprehend that narrative - a fundamental factor underlying any chronological linearity - is an element that is only present within cognitive articulations, perhaps, even as its inherent condition. Augustine seems to know that, and attempts to manipulate his argumentation’s syllogisms in such a manner as to reach this very shift, producing the documented sparkles of what will come to be known as the historical trend of the psychologism of time.

    Augustine approaches these conclusions in Confessions XI, in a very characteristic manner: Since the present moment is the only one that actually exists and not the past or the future, this condition means that time has to be analyzed from the standpoint of its plain observation, in other words, subjectively rather than objectively, and therefore, psychologically. With this argument Augustine makes room for the most varied interpretations, without adding particular qualities to each modality of time. From this aporia arises an ethereal figure of time in which the distinction occurs only through the peculiarities of perceptions. Among the common contradictions in the Christian initial elucubrations, this argument goes against the traces of Platonism identified in the same text, and again, accentuates the ideological divisions that the church was to witness in the coming centuries. We end up with a time that is linear, cumulative, and historical, as it is only accessible through rational operations, not only in terms of allowing its perception, but in terms of interpreting its similes too. The contradictions inherent in these works serve as important indications of changes in the modus and discourse between periods in which these works were made public, becoming huge influencers as cultural texts and official historical documentation.

    But it was not so straightforwardly accepted; the linear-rational scheme of time faced resistance in its implementation. Augustine indicates awareness regarding the difficulty of distinguishing the divine existence from the duration in which the human being is immersed, by the impossibility of defining what time itself is.

    From Augustine himself is the famous passage about the time, saying: “What then is time? If no one asks me, I know what it is. If I wish to explain it to him who asks, I do not know.”1 Marenbon (2007:

    45) asserts that Augustine's explanation, concerning the most complex pagan questions related to time, bases on the proposition that the world has not begun in time; it begins ‘with’ time. It is important to stress that from this point on, the human matter and the human world distance themselves from the divine sphere in such a fundamental way that this split finds no return over the centuries to come.


    Finally, it is - one could say - out of despair, that Augustine places the deity in an eternal "now" (14:17), which is no more than projecting the particular into the universal, extending, tearing, broadening the ephemeral fragment of time as if seen under the microscope. But underneath it all, the psychological characteristic imbued in Augustine's work reveals a crucial point for the church’s rituals that have the ambition to represent (bring to the present) historical facts. It could regard memory itself as the act of psychologically bringing something to the present (Wetzel, 1995: 348), thus, history as a



    image

    1 (Confessions: 11. 14. 17)

    narrated statement is a form of conferring meaning to a succession of happenings, and this function is present at the root of the ritualistic aesthetic manifestations of Christian linear temporality.

    We find in this stage an important point for the scope of the present analysis; the concept of time imbued in Augustine’s work bears a sentiment of continuity, and if time is cumulative and God participated in it, humanity then shares the same trail of divine interference, rendering existence as a linear sacred chronology, or the sacred history.

    This makes human, social, political happenings not only meaningful once juxtaposed, but above all, necessary to the final picture of history, as Revelation, or apocalypse. Hence, this figure of an opened chaotic sacred history is the cradle of the concept of progress. In the words of Mircea Eliade, it is “precisely within the official anti-millenarism of the church that it is recognized the first manifestation of the doctrine of progress … Only God knew the time of the End of the World and one thing seemed certain: this End was not near” (Eliade, 1972: 50). At this point, the world is no longer seen as submerged in an irreconcilable process of degradation and decay, and the ultimate end is postponed with the gradual abandonment of millenarian concepts, although the eschaton as a concept returns punctually throughout history.

    In the work of Augustine, the Aetas Christiana (Christ's age) rests upon all nations, and just as it could foreshadow the withering of the condition that Rome enjoyed, so could Christian salvation be supposed to all the emperors who succeeded as long as they were faithful to the Doctrina Christiana (Chadwick, 2009: 130). Important to register that Jesus is an aeviternal being for Augustine, as he inhabits both chronological temporality and eternity (Wetzel apud Stump & Kretzmann, 2006: 56). It is not for any other reason that the annual count to define the age - Christian in this case - was of disproportionate value to Christianity in its post-Roman stage, with the official institution of a count that had begun with the fact (discourse) of the coming of the Son of God to earth. The years following from a punctual divine intervention in human political history inaugurate an era as a foreshadowing sign of what is to come; the Anno Domini (AD, or years of God, in Latin), had its definition in 527AD through the work of Dionysus Exigus; even though his calculations were not considered correct for too long (Mosshammer, 2008: 339). It is not the creation of the universe that became the pinnacle of our time, but the physical occurence of Jesus in political history. This theological form of history is crucial, as Mircea Eliade reminds us, because for Christianity the procession of events in the world are no longer regarded as random occurrences; they become something profoundly meaningful. These ‘happenings’ in the apparent chaos are signs, similes, vestiges, traces, clues, and the linear configuration of time carries a central aspect: Redemption. He states:


    We must remind ourselves that, for Christianity, time is real because it has a meaning - the Redemption. "A straight line traces the course of humanity from initial Fall to final Redemption. And the meaning of this history is unique, because the Incarnation is a unique fact. Indeed, as Chapter 9 of the Epistle to the Hebrews and I Peter 3:18 emphasize, Christ died for our sins once only, once for all (hapax, ephapax, semel); it is not an event subject to repetition, which can be reproduced several times (pollakis). The development of history is thus governed and oriented by A unique fact, a fact that stands entirely alone (Eliade, 1954: 143).


    Two main points are worth mentioning: First, Eliade (1992: 139) recalls that the conception of linear time and history had already been stressed as early as the “second century by Saint Irenaeus of Lyon, being taken by Saint Basil and St. Gregory, finally being explored by Saint Augustine”. Second, concerning the conceptions of temporality that took wide cultural reach, we must consider that other ecclesiastical authorities tested the cyclical theory until later in history, starting with Clement of Alexandria, Minucius Felix, Arnobius and Theodoret, but “in the theories of Tycho Brahe, Kepler, Cardano, Giordano Bruno and Campanella, the cyclic theory survives” and parallels the pre-scientific temporal linearity of a Francis Bacon or Pascal, for example, albeit in the fifteenth and sixteenth centuries (Eliade, 1992: 141).


    Even millenarist perspectives permeated Christian forms of social time, for example, the eschatological theory in the work of Joaquim de Fiore, formulated between 1132 and 1202. This

    notion receives its most considerable impulse as a theory that divides human history into three moments according to the order of the Holy Trinity in the Eternal Gospel. First being Father (corresponding to the Old Testament and the time of Creation and foundation of time), Son (corresponding to the New Testament and the incarnation of Christ, and the teachings of enlightenment advanced there), and finally the Holy Spirit (corresponding to the moment when humanity should be completely oriented with the due clarification of the historical event of a divine incarnation, thus being complete). As just mentioned, however, at this point in history (we regard here 12th and 13th centuries) there are enough records that prove that the cyclic theory had not yet fully withdrawn from the ecclesiastical thought (Eliade, 1992: 141), and thus was actively opposed to the idea of linearity among strict intellectual circles, reappearing in various places under the most varied formulations.


    We should keep in mind that besides the indexical scheme of social time, during the fifteenth century, multiple other examples of Christian forms of chronologies existed in the shapes how official calendars were organized, presenting years in circular structures with the overlapping twelve phases of the annual zodiac cycle, being an extremely common format. It was also common that they included the demonstration of planting and harvesting seasons as purely technical guides, as Hodges claims (2008: 406), suggesting the complex dimensions of the social construction of conceptions of time serving sometimes as an instrument, sometimes as a signification of higher and mystical orders.


  2. The impact of the Augustinian psychological time


    Augustine seemed inserted in a historical condition in which ‘time’ does not receive full attention, and is regarded as a parallel phenomenon by the intellectual productions of his time. In this stage, Augustine draws up the following explanation: “Time is coming out of what does not yet exist, passing through what has no duration and moving into what no longer exists” (Augustine 1961, BK XI, Sect.21 apud. Weinert, 2013: 14), meaning that the topic of Time is invoked to the very centrality; in fact “Much of Book 11 of the Confessions is taken up with a meditation on the relationship between God and the created universe” (Burton, 2007: 15). And interestingly, the book 11 of Confessions - in which Augustine makes his projections about time - is among the most discussed articles in his work (Knuuttila Apud Stump & Kretzmann 2006: 109). Such is the incredible relevance of Augustinian discussion on time, regarding questions such as: how can you measure something that does not belong to any of the human senses? However, time itself is left out of most questions that address this theme during the Middle Ages. Apparently most medieval formulations regard time as a side-effect, a secondary phenomenon, derived from observations that come from our direct senses. In this regard we find curious excerpts of medieval thinking that lead to the conception of time as engendered by a mechanical aspect, thus, directly connected to the motions of celestial bodies, almost as their byproduct. As an example, relating to the miracle of Joshua, in which they stopped time to lengthen the day, Duhem registers that:


    From this the Averroists derived the following conclusion: If the diurnal movement stopped, all other movements, all other changes would have to stop, for there would be no time to measure their duration (Duhem, 1987: 297).


    Further on, Duhem stresses the relevance of the psychological aspect of time for Augustine in the light of the same biblical event, he writes: “Saint Augustine, on the contrary, derived from the miracle of Joshua a reason to deny the whole Peripatetic theory of time and to deny that time has any existence outside the mind” (Duhem, 1987: 297). Augustine’s Confessions keep alive this understanding, as John Duns Scotus reads it a half millennia after its publishing, who promptly denies the Aristotelian perspective of a mechanically sustained time, as registered in the fourth book of Scriptum Oxoniense (Duhem, 1987: 298). Throughout these periods, they often considered the concept of temporality as an element of mystery that covers a huge ditch between conscious observation and the mysterious foundations of the universe. Only divine enlightenment could reveal the obscurity of the element of time to the consciousnesses of its creation.

    In these lines, ‘time’ is regarded as a residue or a conscious ‘result’ and not necessarily as an independent substance. Although, Augustine recognizes the Aristotelian principle that the movements of bodies in the universe are linked to temporality or duration, he denies that they determine duration or time; on the contrary, if they stopped, time would continue to flow (Knuuttila Apud Stump & Kretzmann, 2006: 109). It deduces that forms of measurement are only insights of time, but no form of control over time would be ever possible, in opposition to the other four natural elements of Platonic philosophy upon which human ingenuity supposedly conquered absolute manipulation. This perspective, corroborated by Augustine, again, illustrates the relational doctrine of time, which, according to Philip Burton (2007, 16), derives from the insistent use of John 8:35 in the book 11 of Confessions, and resides on the use of the verb “speech” (loquor) as connection of Jesus from the beginning to eternity. Important to highlight though, that according to Friedel Weinert (2013: 14), the Augustinian perspective structures time as a phenomenon that starts from the observation of the movement of bodies in space, thus not providing a complete independence of time form physical movement: "time could not exist in an empty universe” he says. As a mode of measuring, unsurprisingly, we find links of temporality to its psychological aspect. The linearized construction of history interweaves with a form of rationality that is nothing but an inspired tool for interpretation (keep in mind Augustine’s early efforts in de Doctrina), and finally time comes handy as a conscious lens through which narrative meaning is uncovered.


    Investigating the Christian logic in the discourses of some of its most important names throughout history, we can highlight the ever-increasing presence of the elements of linearity. Augustine emerges

    - it is worth stressing - not as another side-proponent of linear temporality, but as the greatest name of Christian theology, and for this reason the impact of his work to establish a cultural sense of time is incommensurable. His sphere of influence is such that, as Jacques Le Goff points out: “all medieval theologians, without exception, were to some extent followers of Augustine” (Le Goff, 2005: 16). His premises quickly flowed from the intellectual core to the sentiment and the pathos of an age. The whole cultural process unleashed in the midst of the Christian discourse was, as we have pointed out earlier, engendered toward a historical tendency that slowly solidified the institution of the concept of “sacred linear time” in the centrality of a cultural establishment (Haber Apud Fraser, 1972: 395-396). It is very important to consider that, beyond all these metaphysical speculations at the heart of Christian philosophy, the actual attitudes toward time were in principle the direct reflection of their theoretical propositions.

    An example of its influence, as Le Goff (2005: 16) recalls, it is with Augustine's proposition that the basis of the jurists' arguments gradually oriented towards "absorbing the natural law of the state into a supernatural justice of ecclesiastical law". In any organization and production of Western politics and science that find the Christian illustration of the logic of the world as a common factor, we will somehow find copies of the matrix of behavior or thought as performance or narrative that leads towards linearized temporality as well as sacredness and its moral derivatives. It closely relates moral questions to indexical linear temporality as the medium of its realization, considering the actualization of morality as a group of subsequent historical facts. In this example, faced with questions about the problem of free will against the proposal of divine providence, in a linear temporality, Augustine explains in Consolation of Philosophy, Book five that: “since the order of the universe proceeds from Providence and that nothing is left to the initiative of men, it follows that our evil deeds also come from the Author of all that constitutes good” (Le Goff, 2005: 16).

    Here, Augustine waves at human actions as something distinct in dimension from the quality of God, who inhabits a whole from which all potentialities have already been, necessarily, freely realized. Thus, the human work, though free and susceptible to punishment, is free-willed, while God may also possess omniscience. If it were not, one could ponder: “Why, under these conditions, wait or beg?”, after all.


    It is precisely from these mystical formulations from Augustine about the nature of linear time that we witness some of the earliest efforts to add to the human consciousness the ability to formalize

    internally - psychologically - what would come to be regarded as a 'response' to an external phenomenon. This factor makes him one of the founders of psychological time, at first, as a mere relation of the sensation of before and after (Weinert, 2013: 13). Later, it would be understood that, as is currently evident, a psychological time is a time subjected to "psychological changes," which means that there is no temporal unit per se, nor the object of time to which we would all have access to, but a function of this aspect in our understanding, a category of knowledge with which we assume the powers of a temporal variation. The linear social time, being the facet of a deep concerning question about duration, becomes explicit as it receives along history a multiplicity of politically charged interpretations, being Augustine’s view one that provided profound cultural impacts.


  3. Some Final Remarks


These trends of thought of an eschatological linear time measured through rational operations resonate in other works along history, as in the above-mentioned case of John Duns Scotus (early 14th century). In a leap, this same aspect returns as late as the Cartesian thought. Even though it was divided into two elements (duration and time) time itself remains a mental entity while duration is regarded as an objective element. For proof of that, we see resonations in the Third Meditation where Descartes proposes that “God, and only God is self-caused” (Flage & Bonnen, 1997: 841) for, in the Cartesian postulate, the human mind establishes a relationship of “measurement” and “counting” to temporality to make it possible to contemplate its flow. His perspective is hence academically regarded as “cinematic” with duration being composed of divisible particles of temporality, taken as a constant, a continuum, put forth by conscious operation (Secada, 1990: 45), even though there was also the division between an objective duration and a subjective temporality. In Descartes’ words:


Of these attributes or modes there are some which exist in the things themselves, and others that have only an existence in our thought; thus, for example, time, which we distinguish from duration taken in its generality, and call the measure of motion, is only a certain mode under which we think duration itself (Descartes, 2002: 21).


To further extrapolate some parallels with Kantian noumena, its judgments and faculties could be, for logical reasons, perfectly convenient, but this could overflow the present scope. As long as Cartesian dualism is regarded, it is perhaps fair to state that it then shares a remarkable resemblance to the psychological proposition of Augustinian time, as it renders the subjective perspective as something isolated from the objective duration.


Time becomes an instrument of measurement of duration; ‘duration’ taken as a real datum, and time, presumably, its covalent mental model. This psychological perspective of time as a ‘potential time’ spotted by Pierre Duhem on Scotus’ works, sheds light upon the conception that Christian linear temporality is not just a manifestation of the mind despite physical phenomena, but on the contrary; although there were physical phenomena, the understanding of these phenomena would be of another order; namely a relation of ‘logos’ versus ‘substance’. We cannot thus claim that time would cease even if there was an extraordinary action, such as the paralysis of the celestial bodies (referred to as heaven). This denotes that temporality becomes a psychological phenomenon at the moment it indicates that the paralysis of celestial bodies would only interfere in the units, in the momentary absence of measures and reference points for the establishment of a mathematical or logical discourse about duration.

The importance of subjectivity as a provider of the truth to a discourse of reality engenders this dualist relation, as it will be present in the Principle of Sufficient Reason (PSR) later on, manifested as the basis of the Kantian claim about the linearity of time for example (Pruss, 2006: 37), proposing that time is a logical manifestation provided that - and only from the fact that - one can identify changes in nature that will give rise to the very concept of ‘time’.

It is very important, however, to point out that the autonomy of the rational elaboration of these conclusions does not render the argument invalidated by ‘subjectivism’. Relying on reason as a unit of measure cannot be, at this historical stage, a premise for the demoralization of results, because in this context reason itself can be nothing but the manifestation of the divinely enlightened human spirit, a mathesis. We must keep it in mind that Augustine occupies the central stage as the greatest proponent of rational techniques for identification of similes hidden in history through exegesis - as shown in the beginning of this work while concerning the cultural relevance of de Doctrina. To consider that humans had a purely subjective reason, and that this human reason was itself a result of historical, cultural, social and political conflicts would only become a prevalent idea much later in history, probably starting in Hegel (Honneth, 2003: 60). Therefore, Augustine's subjectivism or psychologism still carries out the autonomy of reason as an instrument of enlightenment, one more trick of God’s providence, and only in this way it can be properly understood.


Augustine’s works establish a worldview that imbues a linear temporality over historical reality that, first, stains the cloth of physical reality with ‘signification’, permitting the reading of the world's signs, a world supposedly designed in a linearized, continuous, finalist and above all, significant manner. Indexical social time - in the way Augustine designed it - is proved in the human manifestations of recreation of meaning, based on this conception of a sacred linear history, clearly seeing in the way Christian medieval temporality took history for its purposes, stipulating metrics and interpretive systems. These systems should then allow for a retrospective ‘reading’ of happenings in history, in order to interpret the condition of the ‘now’, and hence the future. From Augustine’s Doctrina Christiana therefore comes the set of rules by which the scattered signs are meant to be reunited, especially in the form of words through exegesis (Williams Apud Stump & Kretzmann, 2006: 68), to which the truest reality owes its interpretation.

The temporality sustained by this indexicality - on the assumption of history as a progressive cumulative line - permeated history with meaningful divine interventions susceptible to interpretation, turning the gaze of the ecclesiastical intellectual centrality backwards as a constant effort for the construction of cultural identities and search for the meaning of history as the greatest divine work of all. Augustine indicates the matter of history - as a revelation proper to the symbols through which divine reality manifests itself - as a picture waiting for its interpretation. Unsurprisingly, in his second book, De Doctrina, we read:


Whatever the subject called history reveals about the train of past events (from Latin “ordine temporum transactorum”) is of the greatest assistance in interpreting the holy books, even if learnt outside the church as part of primary education” (Augustine, 1996: 105).


This indexical notion of social time is a set of ideologically construed attitudes towards a sacred linearized historical time. It manifests itself in the premises that drive political actions, and in this sense, Augustine can be regarded as the first major proponent of a meaningful linear form of historical time, which underpinned the hermeneutic sciences that succeeded historically. Hence, in the core of this Augustinian indexical temporality we find the retrospective interpretation of mysterious happenings in history in search for meaning. According to Augustine, knowledge presents itself through signs or similes known by the proper study of chronologies (Chadwick, 2009: X).

These perspectives are persistent, present among the rituals of the indexical temporality that became the basis of scholasticism, reaching an extraordinary historical extension that ranges from Augustine to Aquinas, the Renaissance to enlightenment. These eras, by themselves, brought further layers and yet other paradigms for social temporality worth analysing, which indicate differences in types and complexities that must be saved for another time, given the broad scope of research regarding their rich vastness.

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https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.10732


BIEN COMÚN E INTERÉS PÚBLICO EN EL PENSAMIENTO DE ALASDAIR MACINTYRE

CONSIDERACIONES A PROPÓSITO DE UN TEXTO INÉDITO


COMMON GOOD AND PUBLIC INTEREST IN ALASDAIR MACINTYRE

considerations on purpose of an unpublished text


BEM COMUM E INTERESSE PÚBLICO NO PENSAMENTO DE ALASDAIR MACINTYRE

considerações a propósito de um texto não publicado

Rivas Pedro
(Universidad de A Coruña)
pedro.rivas@udc.es


Recibido: 03/06/2020
Aprobado: 03/08/2020


RESUMEN


Aunque las obras principales de MacIntyre son muy conocidas, existe un texto inédito que rara vez suele encontrarse citado y que es relevante para comprender sus tesis acerca de la Política. El texto recoge con mayor detalle, que en otros lugares de la obra del pensador escocés, sus tesis acerca del bien común. El propósito de este trabajo es exponer dichas tesis, completándolas con otros artículos de MacIntyre sobre la misma temática, para dar un cuadro más exacto de su pensamiento sobre el bien común. Al hilo de tal exposición se lleva a cabo una serie de comentarios que surgen de su lectura.


Palabras clave: Bien común. Interés público. MacIntyre.


ABSTRACT

Although MacIntyre's main works are well known, there is an unpublished text that is rarely quoted and is relevant to understanding his theses on Politics. The text contains in greater detail than elsewhere in the MacIntyre´s work his theses on the common good. The purpose of this work is to set out these theses, complementing them with other articles by MacIntyre on the same subject, to give a more exact picture of his vision on the common good. In the wake of this presentation, a series of comments are made that arise from reading it.


Keywords: Common Good. Public Interest. MacIntyre.


RESUMO


Embora os principais trabalhos de MacIntyre sejam bem conhecidos, há um texto inédito que raramente é citado e que é relevante para a compreensão de suas teses sobre Política. O texto contém em maior detalhe do que em qualquer outro trabalho do pensador escocês, suas teses sobre o bem comum. O objetivo deste trabalho é apresentar estas teses,

completando-as com outros artigos de MacIntyre sobre o mesmo assunto, para dar uma imagem mais exata de seu pensamento sobre o bem comum. Após esta exposição, são feitos uma série de comentários que surgem de sua leitura.


Palavras-chave: Bem Comum. Interesse Público. MacIntyre.


Introducción


La bibliografía sobre MacIntyre es muy numerosa y crece sin parar. Además, sus obras principales son bastante conocidas, al punto que algunas se consideran clásicos del pensamiento contemporáneo. Sin embargo, existe un texto inédito que rara vez suele encontrarse citado (como excepción, puede verse Ramis Barceló, 2012) y que por su contenido es relevante en sí mismo, y para comprender las tesis de MacIntyre acerca de la Política. Se trata de las Agnes Cuming Lectures in Philosophy, impartidas en el University College de Dublin los días 1, 2 y 3 de marzo de 1994, con el título Laws, Goods and Virtues: Medieval Resources for Modern Conflicts. La primera de ellas, titulada Natural Law as Subersive: the case of Aquinas fue publicada dos años después con el mismo título en el volumen 26 del Journal of Medieval and Early Modern Studies. Sin embargo, la segunda y la tercera de las lectures permanecen inéditas. La segunda de ellas lleva por título Natural law against the nation-state: or the possibility of the common good against the actuality of the public interest (MacIntyre, 1994a). La tercera se titula The Virtues of Practice Against the Efficiency of Institutions (MacIntyre, 1994b). A mi modo de ver, la relevancia estriba en que recogen con mayor detalle sus tesis acerca del bien común, que en otros lugares de la obra del pensador escocés. El propósito de este trabajo es, en primer lugar, exponer las tesis de tales conferencias, al mismo tiempo que se completan con otros artículos de MacIntyre sobre la propia temática, para tratar de dar un cuadro más exacto de su pensamiento sobre el bien común. Al hilo de tal exposición se lleva a cabo una serie de comentarios que surgen de la lectura de ambas conferencias. Por mor del espacio disponible, voy a centrar mis comentarios en la crítica que hace el autor respecto a la idea de interés público como concepto que estructura las comunidades políticas modernas.

Con todo, se debe hacer una referencia a la primera de las tres conferencias, la cual fue publicada posteriormente. En ella se lleva a cabo una aproximación histórica en la que se muestra que la perspectiva tomista con respecto al Derecho es la misma que la de los romanistas, en contraposición a la concepción de la relación del gobernante con el Derecho que tienen algunos de sus contemporáneos, como Luis IX de Francia o Federico II de Sajonia (MacIntyre, 1996: 61-83). La explicación tomista se comprende bien si, por un lado, se sitúa en la discusión entre quienes defienden que quien detenta el poder soberano es no sólo el que promulga sino el que crea y recrea el Derecho, y restringe el conocimiento del Derecho a expertos operadores autorizados por el soberano. Y por otro lado, quienes como el Aquinate, sostienen que los preceptos y principios del Derecho tienen autoridad antes de su promulgación por cualquier poder soberano y el conocimiento de tales preceptos y principios pertenece a toda persona racional común (MacIntyre, 1994b: 53).


La posición que MacIntyre personaliza en las personas de ambos reyes no es sino un precedente (con otras muchas diferencias relevantes) de las tesis políticas acerca de la soberanía formuladas con toda precisión siglos después. En efecto, la idea de soberanía significa ante todo el sometimiento del Derecho al poder político al comprender este último como el monopolio de las fuentes del Derecho. Este proceso se cristaliza en el siglo XIX con el movimiento codificador (Bobbio, 1979: capítulo III). La contraposición que muestra MacIntyre le sirve para poder ubicar la visión aristotélica y tomista de la comunidad política frente a la visión moderna, uno de cuyos antecedentes sería esa concepción de los reyes medievales que describe.


A mi juicio, las otras dos conferencias, las que se consideran en este trabajo, pueden ser tratadas aparte de la primera. En ambas, el elemento clave es la comprensión de una sociedad estructurada a partir del bien común, cuestión que se lleva a cabo en primer lugar mediante la comparación de este género de sociedades con las que se estructuran a partir de la idea de interés público, como ocurre en el Estado

liberal presente. En segundo lugar, afronta una crítica de estas últimas a la par que defiende el carácter no utópico de las primeras.


  1. Dos formas de comunidad


    Como se ha dicho, mostrar en qué consiste una comunidad estructurada en la idea de bien común, se lleva a cabo a través de la comparación con una comunidad estructurada a partir de la idea de interés público. Vamos a afrontarlo a partir de las diferencias que el propio MacIntyre señala entre ambos géneros de comunidades.


    1. La justificación política

      Hay que señalar el modo diverso de justificar políticamente cada tipo de comunidad. Esta diferencia le sirve para dar una explicación primaria de cada uno. Entiende por justificación política los argumentos que muestran por qué debemos, o no, aceptar como teniendo autoridad política los mandatos o las leyes de quien reclama autoridad ejecutiva o legislativa (MacIntyre, 1997: 242).


      Para entender una comunidad estructurada por el bien común, se hace necesario en primer lugar caracterizar qué se entiende por bien común. Para ello señala seis rasgos que pertenecen a la esencia del bien común:

      1. Se trata del bien de un tipo de asociación.

      2. No se reduce a los bienes de los miembros individuales de tal asociación.

      3. No se construye al margen de los bienes de los miembros individuales.

      4. Es parte de y en parte constituye los bienes de cada miembro individual.

      5. No toda asociación tiene un bien común porque puede constituirse con otros fines. En este aspecto la existencia de comunidades estructuradas conforme al interés público son ejemplos de lo que se sostiene.

      6. Los fines perseguidos para lograr un bien común sólo se alcanzan por individuos que actúan como partes de un todo comunitario, y que implícita o explícitamente comprenden su bien individual como constituido en parte por un bien o bienes caracterizables independiente y antecedentemente a la caracterización de su bien individual particular (MacIntyre, 1994a: 27).


      La noción de bien común de los que se asocian para lograr los fines de una actividad en particular es inseparable de las nociones de recto orden de la actividad y de bien común que consiste en lograr los fines a los que se ordena la actividad. ¿Qué tipo de actividad política resulta si se ordena de este modo tal actividad? Una actividad a través de la cual una comunidad ordena la variedad de prácticas e instituciones comprometidas en y sostenidas por sus miembros. El bien específico de una actividad política así consistiría en el vivir cooperativo de un tipo particular de vida en común, en la que la variedad de bienes prácticos tiene su lugar ordenado: se trata de un bien distintivo sin el cual los otros no se pueden lograr (MacIntyre, 1994a: 28). Para una visión aristotélica y tomista sólo podemos entender el derecho a la luz del bien. De ahí que el acuerdo racional sobre las reglas morales presupone un acuerdo racional sobre la naturaleza del bien humano (MacIntyre, 1990: 344-345).


      En cambio, cuando lo que estructura es el interés público, entonces la comunidad política es un escenario o estadio (arena) donde los individuos y grupos persiguen intereses privados y tienen también un interés común. El éxito de una política interesa solamente si afecta la satisfacción de las preferencias particulares. El interés común de un grupo existe en la medida en que afecta las preferencias de sus miembros. La justificación de la asociación reside en lograr un marco institucional que los individuos tienen interés en sostener. La expresión política de los bienes que cada uno persigue se entenderá siempre en términos de preferencias e intereses. Todo esto es característico de los estados contemporáneos, que incorporan entonces la aspiración a la neutralidad e imparcialidad con respecto a

      las pretensiones rivales sobre el bien y los bienes, tratando a estos bienes como expresión de preferencias e intereses (MacIntyre, 1994a: 28-29).

      A mi juicio, desde la perspectiva recién descrita, carece de sentido pretender que exista un bien común político. El bien es siempre particular. Lo más parecido a un bien común es la maximización de los bienes particulares coincidentes. Pero esos bienes no son propiamente comunes sino singulares y coincidentes, es decir, tenemos por bienes particulares realidades similares, o apreciamos como buenos los mismos bienes particulares. Pero el carácter de bondad de una realidad es siempre individual, singular, particular. El sentido de nuestras comunidades políticas es la protección de los bienes particulares y nada más.

      De ahí, la ausencia de algo verdaderamente común en el interior de la comunidad política. Aunque todos los individuos posean su persona y sus capacidades de manera igual, esto no significa que exista nada común entre ellos. Al contrario, todo se posee con el único fin de competir, de aumentar lo poseído por los demás. De este modo, si no hay nada realmente común, es difícil encontrar la propia identidad en la sociedad en la que uno se encuentra.


      En un trabajo anterior, MacIntyre hace una reflexión que profundiza más en lo dicho. Y es que los desacuerdos sobre el bien humano son numerosos y fundamentales: se da un divorcio entre reglas por un lado y concepciones del bien humano por otro. Para el pensamiento liberal (que se identifica con la concepción de la comunidad estructurada por el interés público), las instituciones públicas deben ser neutrales entre concepciones rivales del bien humano. La lealtad a una particular concepción del bien es cuestión de elección privada. El acuerdo requerido y el desacuerdo permitido sobre concepciones del bien se caracterizan por su comprensión de la relación entre libertad y razón: la autonomía del individuo racional se ejerce aceptando una de las visiones en disputa. Por tanto, elaborar, defender y vivir según una particular concepción del bien se restringe a la vida privada, mientras en lo público se debate sobre la obediencia a reglas morales para cada persona racional (MacIntyre, 1990: 346). De este modo, la privatización del bien asegura no sólo que carecemos de reglas morales compartidas adecuadamente determinadas, sino que elementos centrales de carácter moral no pueden llegar a ser objeto de discurso o de indagación sistemática y pública compartida (MacIntyre, 1990: 353).

      Desde mi punto de vista, la pertenencia del hombre a la sociedad no tiene una finalidad relacionada con el perfeccionamiento o bien propio del hombre. Lo que está detrás no es sino una comprensión del hombre que en el fondo resulta ser vacía. Paralelamente el hombre que se reúne en sociedad sigue careciendo de fines más allá de su permanencia en el ser (Hobbes, 2014: I, 14; Spaemann, 1980: 202). En nuestra opinión, la pérdida de la noción de finalidad a la hora de hablar del hombre y de su libertad conlleva a un empobrecimiento en el momento de concebir el hecho social porque éste en último término también es un hecho humano. En la sociedad, tal y como se concibe el hombre, no puede reconocerse, sólo puede sobrevivir. La ley posee una justificación funcional exclusivamente por referencia a la supervivencia humana pero no parece ni de lejos uno de los elementos básicos para el correcto desarrollo de la vida humana. La consecuencia inmediata es la concepción de la ley como mero límite; fundamental para sobrevivir, pero límite, al fin y al cabo, y como tal dotado de una fuerte carga negativa. Ahora la ley se “justifica” en el sentido más pobre de la palabra: no queda más remedio que vivir bajo la ley. Por tanto, lo positivo del hombre vendría a ser todo aquello que pudiera desarrollarse al margen de ella. En este sentido se entiende el carácter meramente instrumental de la comunidad política para la mentalidad moderna. La comunidad política, ahora el Estado, no añade nada al individuo singular en cuanto a sus fines: se pretende que no sea más que un simple medio eficiente. Pero, al mismo tiempo, se trata de un medio con vida propia y que es capaz de invertir la relación, es decir, de convertir al individuo en medio para sus fines.

      Más recientemente, MacIntyre ha insistido en que los desacuerdos morales en nuestras sociedades contemporáneas son irresolubles. La diferencia de tales desacuerdos cuando se daban en sociedades anteriores radica en que quienes ahora toman parte en ellos parecen presuponer la apelación a algún estándar impersonal al que referir los desacuerdos. Pero a la vez son conscientes de manera evidente

      de que no hay esperanza de que las convicciones de sus oponentes cambien por argumentos racional, lo que significa que no hay tal estándar (MacIntyre, 2008: 262).


    2. El modo de entenderse en comunidad


      A partir de lo anterior, se comprende el modo de entenderse en el interior de una comunidad. Para quienes defienden una comunidad estructurada a partir del bien común, el autogobierno de la comunidad se ejercita a través de unas actividades y una participación que es necesaria para que cada ciudadano logre su propio bien. Los fines de la actividad política son entendidos como internos a los fines individuales. El yo se constituye en parte a través de su actividad política y un yo sin tal actividad sería un yo carente, indigente. Hablar de bien común no niega la diferencia entre público y privado, sino que ubica tal diferencia en otro lugar, porque el yo es miembro también de comunidades más inmediatas que son independientes de y a la vez contribuyen a la comunidad política: el yo individual es más que sus actividades políticas.


      Para quienes sostienen una comunidad política estructurada a partir de la idea de interés público, el Estado es una agencia o grupo de agencias externo a ellos y a sus intereses privados. Incluso si ocupan papeles políticos, tal cuestión no constituye su identidad moral ni política. Por lo anterior, hablar de bien común no solamente es metafísico sino peligroso (MacIntyre, 1994a: 30). En efecto, el grado de identificación de un individuo moderno con la comunidad en que vive es condicional. Sólo en la medida en que satisfaga las condiciones prescritas por su particular concepción de los derechos, habrá una buena razón para identificarse. Lealtad familiar y patriotismo se ponen en cuestión (MacIntyre, 1991: 105).


      A mi modo de ver, como toda realidad compuesta de seres vivos, el Estado pareciera tener también vida propia (Cruz Prados, 2009: passim). Al pensarse a sí mismo como una realidad previa, el individuo singular tiene la consideración de lo otro (en este caso el Estado) como peligro, o incluso enemigo, por el simple motivo de que no parece posible reconocerse en él sino sólo en mí mismo. Para la mentalidad moderna que tiene por centro el valor de la autonomía de la voluntad, la propia realidad, la propia identidad, donde uno se reconoce, es apenas en sí mismo y con dificultad en algunos de sus semejantes. De modo que si tengo dificultad para reconocerme en el otro, mucho menos voy a reconocerme en una realidad posterior que viene a pretender ser la suma de todos. Esa realidad otra, que llamamos comunidad política y que adopta ahora los caracteres del Estado, es si cabe peor porque es más grande y fuerte que uno. Y está, eso sí, tan viva como uno, porque está formada por seres humanos. Así, ese otro es una realidad viva, que opera con mayor fuerza que un ser humano y que carece precisamente de aquello que puede hacer que uno se reconozca en él. Por eso, el afán cada vez mayor del ser humano ha sido no sólo evitar ser dominado por el Estado, sino también tratar de dominarlo a él para emplear precisamente toda su fuerza.


      La comunidad política en forma de Estado se presenta entonces como una estructura artificial que consiste fundamentalmente en poder. Y un poder que entra en inevitable conflicto con la realidad previa que es el individuo y sus derechos. Lo político es algo a lo que nos vemos abocados a regañadientes y en este repliegue del individuo sobre sí mismo, lo comunitario se ve siempre como peligroso, no identitario, ajeno. No es que se haya alejado del sujeto singular, sino que estaba lejos desde el principio. El impulso lleva a alejarse de esa construcción peligrosa donde uno no puede reconocerse porque no sirve a, sino que conspira contra el propio proyecto vital. En el fondo, parece latir una ilusión de una especie de cielo en la tierra compuesto por el individuo solo, pleno de derechos frente a ningún otro, rodeado de todos los bienes de la tierra, a los que tal vez añadir otros individuos en la medida en que se comporten como bienes.


      Lo anterior explica también que el contenido del pensamiento político a partir de la modernidad ha sido precisamente el poder. Porque ahora en el origen de lo político no hay sino un acto de voluntad, y a lo que da lugar es a una comunidad que se caracteriza precisamente por la soberanía. Es decir, por una voluntad que detenta la supremacía, que se impone. De esta manera, se reduce la participación en

      lo político a ejercer de alguna forma un acto de poder. Todo el objeto de la reflexión política consiste en la conquista, preservación y ejercicio del poder, en el diseño de sus límites y en cómo superar esos límites. Esto último no sólo ocurre si se piensa en los partidos políticos o en los representantes como sujeto de todas esas operaciones (conquista, ejercicio, preservación, etc.). También si se piensa en el individuo concreto como sujeto frente a sus propios representantes (o frente a los partidos políticos que intermedian entre ambos); en este caso, los contrapesos al poder, la división de poderes, los derechos individuales, etc., son también vistos como conquista, ejercicio y preservación del poder. En último término, si no hay más que un conflicto más o menos complejo de voluntades, se comprende que no se hable más que de poder. Todo lo cual muestra la imposibilidad de pensar en términos de verdadera comunidad porque no hay bienes que compartir. El poder, por su propia naturaleza, refleja el alcance de cada voluntad y en este sentido toda voluntad ajena es límite de la propia. Cuando los demás son límites es porque constituyen de nuevo una realidad distinta, ajena a mí, con quien sólo puede haber en el mejor de los casos coincidencia o compatibilidad, pero nunca verdadera comunidad.


    3. El tipo de razonamiento práctico


      La tercera diferencia tiene que ver con el tipo de razonamiento práctico que es propio de cada comprensión de la comunidad. Como el autor había señalado en un trabajo anterior, el desacuerdo fundamental sobre la naturaleza del bien que se da entre ambas concepciones de la comunidad, no es sólo teórico sino esencialmente práctico. Son concepciones rivales de la racionalidad práctica, de las relaciones de los seres humanos con el bien de sus acciones, de las reglas y virtudes prácticamente encarnadas que son específicas a cada concepción rival del bien. Esas concepciones sólo se confrontan decisivamente cuando se presentan tomando cuerpo en comunidades particulares. Es parte de la vida de familias, escuelas, hospitales, parroquias, vecindarios, lugares de trabajo; donde toma forma reconocible una particular concepción del bien. La indeterminación y empobrecimiento de la concepción basada en el interés público se ejemplifica en la propia realidad social (MacIntyre, 1990: 355-356).

      En el caso de las estructuradas en torno al bien común, la pregunta nuclear es: ¿qué es mejor para mí, en cuanto miembro de tal comunidad, en esta situación particular? La pregunta política entonces es:

      ¿qué lugar ocupa el bien de cada una de las actividades del individuo en la vida de la comunidad política? Por eso, la pregunta por mi bien, en determinada actividad, no puede divergir de la pregunta por mi bien, en cuanto miembro de la comunidad política. La pregunta no es tanto qué es lo mejor para mí, ni siquiera qué debo hacer, sino qué debemos hacer. Porque se trata de un razonamiento en común (en ocasiones explícitamente juntos) donde la conclusión puede suponer acciones diferentes pero coordinadas (MacIntyre, 1994a: 31-32).


      En un trabajo previo MacIntyre se pregunta cuáles son las creencias sustantivas, materiales, que debemos sostener si pretendemos ser agentes racionales prácticos e involucrarnos en genuinos debates racionales. A su juicio, que habitamos un género de comunidad en la que los participantes rivales del debate pueden ser tratados prima facie como dignos de confianza. Tal creencia se refuerza por la aceptación de una comunidad de normas sancionadoras. Con todo, una creencia compartida de este tipo, aunque necesaria, no es suficiente. Hace falta la pertenencia a una comunidad que comparte lealtad a alguna concepción total, tolerablemente específica del bien humano último. Sólo a la luz de tal entendimiento compartido los diferentes tipos de actividad e institución (cada uno con su bien o sus bienes subordinados) puede ordenarse en los términos del bien último. Existe así un estándar independiente de los deseos individuales o de los intereses de grupo (MacIntyre, 1991: 99).

      En el ámbito recién señalado la justicia es dar reconocimiento debido y retribución a cada persona o institución según su contribución a la vida completa de la comunidad. Así se expresa en normas que gobiernan formas de relación humana, que especifican lo que cada participante en la relación le debe a otros. Pero la investigación racional sobre la justicia depende del acuerdo previo sobre la naturaleza del bien y más fundamentalmente en las creencias básicas que definen y comprenden tal bien. En

      definitiva, la suma de la creencia en ser dignos de confianza más las creencias compartidas sobre el bien (MacIntyre, 1991: 100).

      En sociedades estructuradas por el interés público, el razonamiento práctico pretende responder a cuatro preguntas. (1) ¿Cómo deben, individuos y grupos, contribuir al sostenimiento de instituciones gubernamentales? (2) ¿Qué beneficios deben obtener, individuos y grupos, de la acción del gobierno?

      (3) ¿Qué garantías institucionales debe haber para asegurar los intereses, individuales y de grupo, de la interferencia del gobierno o de otro grupo? (4) ¿Cómo evitar que el gobierno sirva a intereses individuales o de grupo? Las respuestas parten de un esquema donde utilidad y derechos son centrales. Los actores se comprenden como maximizadores de utilidades en competición entre sí en un ambiente estable con expectativas racionales. Se institucionaliza la competición y el conflicto, aunque la manera de razonar será mediante la apelación a estándares impersonales e imparciales (MacIntyre, 1994a: 33- 34).


      En mi opinión, la reducción de lo político, a aquello que resulta conveniente a la permanencia y crecimiento del sistema económico, podría inducir a pensar que en el fondo es verdad que toda política es mercantil. Sería mercantil en la medida en que la falta de participación, la distancia entre representante y representado y la ausencia de identidad nos recuerdan la relación mercantil: lo único que queremos es la obtención de un servicio o un bien que sea acorde con lo que pagamos o con lo que creemos que se nos debe. A mayores, si tenemos en cuenta que la distancia no es solamente la que se produce entre representante y representado. En efecto, se ha vuelto un lugar común señalar que las relaciones formales entre burocracia y ciudadanos no son intersubjetivas, no crean vínculos orgánicos sino asimétricos. En nuestras sociedades presentes, la racionalidad burocrática no crea mediación sino aislamiento y separación. Esta relación de dependencia reforzaría las identidades de sujeto dador y activo frente a objeto receptor y pasivo. De esta forma, los ciudadanos despolitizados degeneran en clientes que hacen demandas cada vez más grandes a un Estado que no puede satisfacerlas.


      En la entraña de esta actitud, puede verse el origen de otro de los característicos peligros de nuestra política presente. En el fondo los ciudadanos están aceptando comportarse respecto a sus representantes como clientes. Si el representante se lo toma en serio, descubrirá que la manera de perpetuarse en el poder consiste precisamente en transformar a sus electores en clientes satisfechos. Para ello en la situación ideal se organiza un sistema a través del cual los ciudadanos obtienen un beneficio por nada. Y de igual modo el que gobierna emplea para ese beneficio lo que aportan otros grupos sociales o simplemente lo que obtiene a través de otros ingresos del Estado. Resulta así un sistema clientelar en el que en principio todos ganan. Los ciudadanos clientes apoyan sin dudarlo a su representante proveedor, que les colma sus posibilidades económicas privadas. Por su parte, el gobernante proveedor retiene así indefinidamente el poder (XX, 2017: 497-519 y las referencias allí citadas).

      A mi juicio, la imposibilidad de generar un sentido del bien común con el modelo del individualismo posesivo en nuestra era técnica e industrial se pone de manifiesto ante la dificultad de enfrentar el clientelismo. En efecto, desde la perspectiva del principio de representación, no parece que pueda haber reproche moral alguno a la venta del voto. Todo lo más se puede criticar que dicha venta sea producto de la carencia de bienes básicos porque supone una merma de la autonomía del elector. Pero al carecerse de bien verdaderamente común, no hay un término por respecto al cual juzgar al elector. Por eso la pregunta que queda abierta y a la que el fenómeno clientelar nos interpela, es si tiene alguna relevancia para una comunidad política democrática cuáles sean los motivos que mueven a los electores. Aunque se desconozcan, sin embargo, cabe preguntarse si existen razones o motivos mejores que otros, e incluso si los hay indeseables.

      MacIntyre sostiene además que en la sociedad presente el razonamiento práctico presenta importantes restricciones de tiempo y se enmarca en la enorme multiplicidad y heterogeneidad de las respuestas ajenas. Ante esta complejidad la decisión sólo es posible si se reduce todo a un grupo de reglas y generalizaciones breves y simplificadas (MacIntyre, 1994b: 59-61). Tales reglas abrevian y

      presuponen lo que es o se cree que es como conocimiento del rango de acuerdos sobre utilidad, derechos, contrato, en un contexto particular. Y en cada situación las reglas y generalizaciones son específicas al contexto. Por lo anterior, todo razonamiento práctico de este género es razonamiento en algún tipo particular de contexto, donde la especificidad está en las premisas de las que se parte (MacIntyre, 1994b: 66).


      Tiempo atrás MacIntyre había señalado que en sociedades donde la moralidad se define independientemente del bien, la relación entre las diferentes reglas morales desaparece y el resultado es que las cuestiones morales se presentan como un paquete de problemas separados, aislados e irresolubles (MacIntyre, 1990: 354). En nuestras sociedades presentes, estructuradas a partir del interés general, respondemos a cada problema moral y social de manera fragmentada. Nunca la respuesta está informada por una concepción del tipo de comunidad que queremos y que reconozca la contribución peculiar de cada grupo social a la vida de la comunidad (MacIntyre, 1991: 107). Ahora bien, esta compartimentalización es sólo una señal de algo más profundo, como es un yo dividido. Porque nuestras comunidades contemporáneas se mueven entre dos realidades. En unos roles, se nos pide que pensemos y actuemos como individuos, con los propios deseos, preferencias, principios, cálculos, elecciones que rigen el obrar. Todos estos son propios de la vida económica, donde uno es competidor o consumidor. Y también de la vida política donde uno es candidato, elector, detentador de un cargo público o simple espectador. Al mismo tiempo, hay otras funciones y relaciones donde uno se dirige a los bienes comunes de familia, vecindario, lugar de trabajo; donde la pregunta es por cómo trabajamos juntos y como somos capaces de lograr nuestros bienes comunes y compartidos. Los individuos son extraños para sí mismos, el yo contemporáneo es un yo dividido (MacIntyre, 2008: 266-267).


    4. Los problemas más característicos


      En cuarto lugar, se plantea cuáles son los problemas más característicos de cada uno de los modelos. Las sociedades organizadas por el modelo del bien común tienen un problema endémico: siempre es objeto de debate cuál es el bien común aquí y ahora para esta determinada comunidad política. Es necesario un debate articulado y existen desacuerdos que son en ocasiones disruptivos. Por otro lado, cabe siempre el riesgo de identificar el bien común con el bien particular de quien gobierna y su imposición (MacIntyre, 1994a: 35).


      En el caso de las comunidades articuladas por el interés público, hay que señalar que sostenerlo tiene un coste lo que lleva a preguntarse cómo se distribuye el coste y cómo se justifica tal distribución (MacIntyre, 1994a: 29). Además, por lo visto, al tratar cómo es el razonamiento práctico al interior de tal comunidad, se puede esperar que cada uno se pregunte si no podrá acceder a los beneficios que el interés público sostiene, pero sin los actos de contribuir a ellos. Se trata de lo que denomina el problema del free-rider. Este problema puede surgir en las sociedades estructuradas por el bien común, pero se tratará precisamente de quienes no razonan conforme al bien común y por tanto a su propio bien, mientras que el free-rider razona según el esquema del interés público (MacIntyre, 1994a: 34- 35).

      Comparece aquí la cuestión de qué esperamos del gobernante. Si en el fondo estamos ante un problema de poder, de su conquista y preservación, en realidad permanecemos en el ámbito de los juegos de voluntades. Y la pregunta que se hace quien gobierna sigue firme: ¿por qué debo aceptar límites a mi voluntad? En el fondo no se aceptan, sino que se imponen. El por qué existen frenos al ejercicio del poder es algo que no termina de explicarse. O, mejor dicho, algo para lo cual se da una razón o justificación extrapolítica. Pero, vistas las cosas con perspectiva netamente política, lo único que debe hacer quien gobierna es imponer su voluntad. A fin de cuentas, es la pasión por imponer la propia voluntad lo que le ha llevado hasta allí y lo que le sostiene en su afán por permanecer. No debe extrañarnos entonces que emplee todos los métodos a su alcance para lograr su propósito porque todos son políticos en la medida en que son ejercicio del poder. En último término, las razones extrapolíticas que se plasman en el Derecho para limitar tal ejercicio de poder pueden seguir siendo vistas como otras voluntades que aspiran al poder en pugna con quien lo detenta. Seguiríamos así en el irresoluble

      conflicto de voluntades, en la medida en que no hay nada realmente al margen de éstas. La desconfianza hacia lo político de quienes no ejercen el poder es inevitable en este orden de cosas. Y parece inevitable la tendencia de quienes lo ejercen por sobrepasar las barreras extrapolíticas que se les ponen.

      Por otro lado, MacIntyre señala que en tales comunidades se parte de una variedad de filosofías políticas rivales que no se ponen de acuerdo ni siquiera en los propios términos del debate, porque cada uno usa los suyos, aunque se presente como razonamiento según estándares imparciales. Y al mismo tiempo se excluye a quien niegue la racionalidad supuesta del marco de juego (MacIntyre, 1994a: 46).

      Con anterioridad MacIntyre había desarrollado este problema. A su juicio, la concepción de los derechos característicamente invocada por quienes se ven envueltos en un conflicto de derechos, y los procedimientos retóricos empleados para avanzar en las propias pretensiones de derechos que toman cuerpo en tal concepción, son tales que invocarlos o emplearlos supone verse inmerso en un error. El idioma dominante y la retórica imperante de los derechos no pueden servir genuinamente a propósitos racionales y es mejor evitarlos. Porque para un debate racional sobre aplicación de la moral o de conceptos valorativos es necesario un estándar independiente de deseos, preferencias y voluntades de las partes contendientes al que apelar, y que pueda mostrar por qué las razones de un punto de vista son superiores al otro. Si falta tal estándar, nada diferencia a un supuesto debate racional o valorativo del mero choque de deseos, preferencias y voluntades. En ausencia de dicho estándar no habrá forma de valorar aquellas razones que uno se da a sí mismo para juzgar y obrar de modo particular (MacIntyre, 1991: 96-97).

      Aún más, cada vez más asuntos entran en el terreno de lo discutible, se refuerza, a la vez, la tendencia a apelaciones a principios como deseos, preferencias y voluntades, y se hace necesario defenderse de la posibilidad de ser instrumento de tales deseos, preferencias y voluntades ajenas (MacIntyre, 1991: 100-101).

      Por último, también ha señalado la dificultad de las sociedades estructuradas por el interés público en justificar la lealtad necesaria para que tal sociedad florezca, toda vez que se parte de un concepto individualista y minimalista de bien común (MacIntyre, 1997: 242). En efecto, en los estados contemporáneos, la lealtad de grupos heterogéneos puede retener acuerdos temporales cuando la carencia de tales acuerdos supone pagar un precio demasiado alto. Para eso, quienes gobiernan tienen que adoptar diferentes e incompatibles posiciones: unas veces en nombre de consideraciones de mercado, otras no: unas veces aceptando la responsabilidad por un aspecto de la vida social, otras no; unas veces por la tradición, otras por la modernización. Para eso hace falta una bolsa de valores variados de los que echar mano de uno ad hoc para cada situación. Ante el conflicto no hay un orden de principios al que apelar sino sólo el resultado de coaliciones de interés y de poder determinadas por las élites (MacIntyre, 1997: 245).


    5. El género de participación

      En quinto lugar, se puede hacer referencia al género de participación que es requerido por cada uno de los tipos de comunidad. Las sociedades articuladas en función del bien común requieren un consenso político grande y compartido sobre los bienes en general y sobre el bien común específicamente. Aunque pueda haber desacuerdo y debate, al menos se comparte el tipo de actividad que comparte acuerdo y desacuerdo. Lo anterior exige sociedades de tamaño pequeño (MacIntyre, 1994a: 36). Puede añadirse también que el grado de involucramiento necesario supondrá también una mayor visibilidad de la realidad política (MacIntyre, 1994a: 41).


      Con todo, en un trabajo posterior ha señalado que, aunque una sociedad política informada por la noción de bien común requiere un alto grado de cultura compartida, sin embargo, es muy diferente a aquellas cuyos lazos esenciales son los de una tradición cultural compartida. Dicho de otro modo, una

      polis no es un Volk. La primera sólo se da si se comparte al menos una lengua, modos formales e informales de deliberación y un amplio grado de comprensión común de prácticas e instituciones. Esto deriva generalmente de una tradición cultural común, pero sirve siempre a los fines de una comunidad en la que los individuos son capaces de cuestionar a través de la deliberación común lo que se da por supuesto hasta el momento por la costumbre y la tradición sobre su bien y el bien de la comunidad. Una polis es una comunidad, potencial o actual, de auto-escrutinio, de indagación racional. Los lazos del Volk son pre y no racionales (MacIntyre, 1997: 241). Por eso mismo, el Volk no logra una lealtad política justificada (MacIntyre, 1997: 244).

      Por el contrario, las comunidades organizadas en función del interés público presuponen que la participación amplia es imposible y no existe confianza en los demás. El diseño institucional es de distribución de costes y beneficios, asegurar la confianza y predictibilidad con independencia de la confianza personal. Las comunidades pequeñas se tratan como unidades que sirven a la unidad mayor. Además, ahora el conocimiento social es muy especializado (MacIntyre, 1994a: 37) y el involucramiento es menor lo que genera una política más opaca hasta el extremo de haber creado el concepto mismo de razón de Estado donde resulta moralmente buena la actuación de actores públicos que privadamente sería rechazable (MacIntyre, 1994a: 41).


      A mi juicio, por lo visto hasta ahora, se entiende que la situación descrita genera la desafección de la vida política por parte de los ciudadanos. Principalmente porque tomar parte en lo político es participar en algo ajeno en lo otro. ¿Para qué voy a querer participar en algo que me resulta ajeno? No tiene sentido entrar en un ámbito donde no es posible encontrar la propia identidad. Es más, lo lógico es buscar a alguien que me represente. De este modo puedo dedicarme a ejercer el conjunto de libertades de la vida privada, donde me encuentro y me identifico, y entregar a otros los ámbitos de mi desinterés. No se trata de que ésta sea la causa de la aparición del principio de representación política, pero concuerda perfectamente con el sentido que se le da en el Estado moderno (Constant, 1989 [1819]: 268; 281-282). De nuevo, podemos observar que las tensiones entre representante y representado tienen difícil solución si el contenido de lo político es únicamente el poder. Buscamos a alguien que nos represente, pero damos por hecho que propiamente está ahí no tanto para eso cuanto para permanecer en el poder y ejercerlo.


      Tenemos así el problema de la distancia entre representante y representado. Hay que preguntarse si en el fondo esa distancia es buscada por el propio representado quien carece de interés por sus libertades políticas más genuinas. En el modelo del individualismo posesivo no hay interés en la comunidad política (Macpherson, 2002 [1962]: 257-262). El ser humano es libertad, pero libertad para disponer de su persona y su propiedad de cara a las relaciones mercantiles: no hay interés en lo que hace el representante en la medida en que éste proteja esa manifestación concreta de la libertad individual.


      Puede observarse la clásica dificultad de la falta de participación en la vida política por parte de los ciudadanos. Y es que, como consecuencia de lo anterior, no tiene sentido la participación en lo público. Porque en el modelo humano del individualismo posesivo no hay lugar relevante para otro uso de la libertad que no sea el que específicamente se refiere a las relaciones de cambio. En efecto, participar en lo público significa únicamente no poder ejercer las libertades privadas. Si todo lo social es solamente instrumento para el sostenimiento y crecimiento del sistema económico, las fuerzas individuales no deben servir a nada que no sea dicho sostenimiento y crecimiento (Polanyi, 2011 [1944]: 86-127). Se emplearán en lo político en la mínima medida posible. El principio de representación aparece como la mejor fórmula para dedicar ese mínimo imprescindible. La distancia entre representante y representado y la ausencia de participación política son coherentes con una sociedad de mercado.


    6. El modo de entender las virtudes


      En la tercera de las conferencias, MacIntyre desarrolla algunas diferencias más que se pueden añadir a las mencionadas. En sexto lugar hay que referirse al distinto modo de entender las virtudes. Para el

      modelo de comunidad estructurada en bienes comunes, es decir, para el modo aristotélico tomista de entender las virtudes, éstas son medios para lograr fines, es decir para alcanzar bienes, el bien común o el bien sin más. Pero al mismo tiempo son partes constitutivas de los fines a los que sirven y son valiosas por sí mismas. En la perspectiva de las sociedades modernas, estructuradas por el interés público, las virtudes son en realidad habilidades (skills) que sirven siempre a un fin y se valoran solamente como medios, es decir, son valorativamente neutrales (MacIntyre, 1994b: 71).

      Además, para el modelo aristotélico la virtud pertenece a la persona y no a la función (MacIntyre, 1994b: 71). Por eso, la respuesta a qué vicios y virtudes tiene una persona es la misma a cómo esa persona ordena los bienes en sus actividades diarias. Es decir, se juzga, política y moralmente, las virtudes de uno como persona. Por eso, la vida familiar y de amistad se distingue de la vida política pero no es irrelevante. Y la educción moral se convierte en tarea de toda la comunidad (MacIntyre, 1994b: 74). Para el sentido moderno, la virtud lo es para la función más que para la persona y se adscribe a la persona en cuanto player (MacIntyre, 1994b: 71). Por eso, las habilidades son siempre específicas a cada contexto y el individuo debe reconocerlas en el área de su vida como tal o cual papel o función (MacIntyre, 1994b: 69-70). En cierto sentido la única habilidad que sirve para todo es la adaptabilidad para la eficacia y por eso no importa qué otras habilidades exhiban uno en otros contextos (MacIntyre, 1994b: 71).

      Por lo anterior, para la perspectiva aristotélico-tomista, las virtudes en determinados contextos pueden ser ineficaces, al menos para los estándares modernos de eficacia.


  2. Utopía y realidad del bien común y el interés público


    Las anteriores diferencias indican ya cuál es el modelo de MacIntyre sostiene. Con todo, su defensa pasa todavía por dos aspectos más. En primer lugar, mostrar el carácter no utópico del modelo basado en el bien común. En segundo lugar, señalar las críticas al modelo basado en el interés público.

    En efecto, la principal crítica que se puede hacer al planteamiento de MacIntyre es que pensar en una comunidad política aristotélica es irreal y utópico porque las estructuras de la sociedad moderna excluyen la posibilidad de comunidades y políticas locales. Responde que la ética y la Política aristotélica proveen de base racional para un modo distintivo y reiterado de actividad social, que se puede ejemplificar en prácticas pasadas y presentes y que son reflexivas y están articuladas por el bien común (MacIntyre, 1994b: 54). Hay experiencias de prácticas donde los participantes descubren razones para obrar que son reconocibles como buenas razones por quienes reconocen los bienes. Así, al compartir tales bienes y fines se ven envueltos en un tipo diferente de relación social. Al regenerar así una práctica, se crean organizaciones cooperativas que son una forma nueva de comunidad y los individuos deben plantearse y responder qué lugar ocupa tales bienes y fines en sus vidas. Se recrea una comunidad local y aparece un acuerdo significativo en dónde está la dirección del bien común, en el reconocimiento de las mismas cualidades intelectuales y morales como virtudes, y en la lealtad compartida a unas normas morales categóricas. En el fondo hay una tendencia ineliminable en todo orden social y cultural a alcanzar modos de autocomprensión aristotélicos (MacIntyre, 1994b: 55-57).

    MacIntyre ha tratado de ser algo más propositivo en un trabajo posterior donde se pregunta en qué condiciones es posible una sociedad en la que los individuos aprendan sobre sus bienes individuales y comunes de modo que las preguntas sobre la justificación de la autoridad se respondan a través del debate y de la indagación racional. La respuesta a este interrogante aparece en muchos otros lugares de su obra. En efecto, se trata ante todo de una vida política (i) donde se reconozca la obediencia a la ley natural; (ii) donde la autoridad del derecho positivo derive de la ley natural y sea reconocida por la gente común; y (iii) esa misma gente comprenda que veracidad, respeto, paciencia, cuidado y mantenimiento de las promesas son requeridas para alcanzar a conocer lo necesario sobre el bien. Lo anterior requiere de las cuatro virtudes cardinales y se trata de una comprensión compartida de bienes, reglas y virtudes (MacIntyre, 1997: 247).

    Se da en contextos locales que la política contemporánea excluye. Se trataría de comunidades de pequeña escala, autosuficientes frente a las incursiones del Estado y del Mercado. Tales comunidades rehúsan la compartimentalización porque comparten visiones de lo virtuoso. Por eso, defienden la integridad frente a la adaptabilidad característica de la modernidad presente (MacIntyre, 1997: 248- 249).


    Es en este orden de cosas donde, como en otras ocasiones, MacIntyre afirma no ser comunitarista. A su juicio, el comunitarismo no es un rechazo del liberalismo, sino sólo un diagnóstico de algunas de sus debilidades, al punto de que hay versiones liberales y comunitaristas que se complementan y no se contradicen. La comprensión comunitarista del bien común no es la que él ha descrito, aunque sólo sea porque el bien común y el bien individual se eluden en el planteamiento comunitarista (MacIntyre, 1997: 244, 246).

    Frente a esto, es cierto que las agencias corporativas, públicas y privadas, del mundo presente marginalizan este tipo de prácticas, al menos de dos modos. Por un lado, la división del trabajo por la que cada uno realiza unas instrucciones específicas a una fase de la operación dejando a otros administrar el conjunto (MacIntyre, 1994b: 54). Años más tarde ha insistido en el problema de las élites y en la carencia de lugares en las sociedades políticas contemporáneas para el debate racional y la deliberación abiertos a todos en sus vidas diarias. Esto es la contraparte de la restricción del debate político a una élite privilegiada, que hace que el ciudadano común rara vez sea otra cosa que un espectador político (MacIntyre, 2008: 263). Por otro lado, el éxito en las sociedades modernas se mide primariamente y a veces sólo por la obtención de bienes externos a las prácticas (dinero, poder, estatus, reputación) y cuando los bienes externos se constituyen en fines de las actividades, estas dejan de ser prácticas en sentido aristotélico (MacIntyre, 1994b: 54).


    Y es aquí donde aparecen las críticas más directas al modelo de sociedad propio de la modernidad. En efecto, en este se separa lo que cada uno toma por su fin individual y los fines de las prácticas en que uno participa. De esta forma todo bien se entiende en términos de bien de un particular individual, y bien es aquello que alguien valora como tal. Así, un idioma de preferencias e intereses no se entiende en términos de bienes compartidos sino de preferencias e intereses individuales y de grupo que a veces coinciden y a veces entran en conflicto (MacIntyre, 1994b: 55). Los derechos son ahora áreas exentas de intervención ajena. Los derechos se conectan cada vez más con los individuos qua individuos, concebidos tales individuos al margen de su rol social o de sus relaciones sociales. La multiplicación de pretensiones de derechos no sorprende si se reconoce la ausencia de cualquier forma compartida de justificación racional y de cualquier criterio compartido para identificar los derechos y su contenido (MacIntyre, 1991: 102, 104).

    Por eso, parece como si las posibilidades de la modernidad política sólo se alcanzan si se rompe los lazos con la propia comunidad local. Ésta tiene que resistir la posibilidad de ser asimilada a la Política y la Economía del moderno Estado Nación. Los problemas del mismo son simplemente enunciados, pero se deducen de la caracterización del modelo de comunidad articulado desde el interés público: la profesionalización de lo político reducido a un asunto de élites, donde las masas quedan como clientes, votantes u objetos del management legislativo y administrador, quien a su vez establece las alternativas políticas posibles (MacIntyre, 1994b: 76). La relación con los gobernados se rige por las reglas de la relación de una multinacional con los consumidores. El Estado desarrolla un tipo de acción política antagonista de la local y autosuficiente. Al mismo tiempo, necesita recursos que sólo logra precisamente de las agencias gubernamentales y de las empresas. Frente a esto, una comunidad local requiere de resiliencia, inclinación a aprender de la propia historia, generosidad hacia los extraños y sabiduría práctica (o prudencia). El Estado moderno se rige en cambio por la ambición, la movilidad social y geográfica, la desigualdad económica, el avance tecnológico (MacIntyre, 1994b: 77-78).


    Lo anterior es causa de la reaparición del fenómeno populista. Parece que es una de las posibles reacciones características de quien descubre que hay realidades que escapan a la decisión humana y no deberían. Otra cosa es que sea una respuesta satisfactoria o que genere males mayores que los que

    pretende evitar. Los enemigos del populismo, que se han hecho con esos ámbitos de la autonomía del individuo, se caracterizan precisamente por parecer anónimos. Más aún, ni siquiera se puede decir que respondan a personas concretas. No es posible aportar mucho más, porque en el mundo de las cosas humanas la posibilidad de previsión es pequeña: el populismo es una reacción posible, pero no necesaria. Representa una manifestación de queja, alarma, desengaño, frustración, desencanto, de sentirse engañado ante el estado de cosas. Y es que ese estado de cosas no parece coincidir con las promesas del hombre contemporáneo (Ionescu & Gellner, 1969; Piccone, 1995: 81-142).


    Por su parte, la llamada economía de mercado y sus efectos impiden las relaciones sociales necesarias. Las reglas que impone esta economía impiden a unos el trabajo, condena parte de la fuerza laboral de las sociedades menos desarrolladas y genera sociedades según intereses competitivos y antagonistas (MacIntyre, 1997: 249-250). En los trabajos más recientes ha insistido de nuevo en los problemas de la desigualdad económica. En efecto, al problema de la profesionalización de lo político se une la desigualdad de acceso y de influencia sobre los que toman las decisiones políticas. Tales desigualdades tienen sus raíces en las que hay respecto a los bienes y al poder económico. Incluso la educación prepara para aceptar una sociedad de desigualdades y no para la deliberación racional compartida sobre la vida y los bienes en común (MacIntyre, 2008: 263). Conforme crece la desigualdad el sentido de la inversión se dirige precisamente a maximizar la riqueza y el ingreso de una minoría cada vez menor. La desigualdad es efecto de la necesidad de maximizar el beneficio que empuja a las corporaciones públicas y privadas y a las agencias públicas a tratar a la población como fuerza de trabajo para ser empleada, desempleada o retirada antes o después. Es un tipo de economía que es enemiga y destructiva de una gran cantidad de proyectos vitales a través de los cuales los individuos y grupos buscan bienes individuales y comunes y su bien último. Es decir, las relaciones económicas impiden las relaciones necesarias para lograr el bien común (MacIntyre, 2008: 264-265).


  3. A modo de conclusión


El extrañamiento de lo político, la sensación de fatalismo ante fuerzas incomprensibles, la percepción de pérdida de libertades, remite en último término a un abandono por parte del propio ser humano de ámbitos que no debería haber abandonado. Y que ahora no parece capaz de recuperar porque el tiempo se agota ante las exigencias de una vida económica incesante que siempre requiere más. Pareciera que los problemas de la representación solamente pueden superarse a través de una real y efectiva participación política. Sin embargo, la noción de autoconservación del individuo entendida como adaptación a las exigencias de pervivencia del sistema pone de manifiesto que tal participación es difícil, en la medida en que no sirve a este fin. Al contrario, participar en la vida política distrae al sujeto de la necesaria acomodación a la función económica que le viene fijada. Dicho de otro modo y con palabras más simples, la pregunta que cualquiera se hace ante el requerimiento a participar en lo político es simplemente cuándo. Y la respuesta inmediata es nunca, porque el tiempo necesario no existe. De nuevo, nos encontramos con que cada vez es más difícil pensar en términos de participación política, bien común, identidad compartida.

Esto explicaría también que nos resulte intolerable que la acción de quien ejerce el poder suponga de algún modo una pérdida de nuestras libertades privadas que consisten principalmente en nuestra autonomía económica. Por eso, lo peor que puede hacer quien gobierna es subir los impuestos, enriquecerse a costa del erario público, no lograr modificar el curso de la actividad económica cuando ésta genera desempleo o inflación, etc. En el fondo, lo que buscamos en nuestros representantes es un gestor (por acción o por omisión) de lo económico y nada más. De ahí, que los límites que le ponemos al poder político sean los recién descritos. Lo que ocurra en el ejercicio de este no nos importa mientras nos permita el máximo ejercicio de nuestra autonomía en lo privado. Por eso, hoy en día hablar de Política es cada vez más hablar de Economía. Es más, cuando parece escapar es para caer en manos de la comunicación reconvertida pura y simplemente en marketing, es decir, en venta. De la misma manera, se explica la actual profesionalización de lo político. Se trata de un problema de gestión, palabra característica del mundo empresarial. Pero estamos ante una realidad meramente

técnica. Se requieren gestores económicos que sean capaces de permitirme maximizar en la medida de lo posible mis libertades económicas privadas.


Referencias


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https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.10257


LA FIGURA DE LA VÍCTIMA

GENEALOGÍA Y USOS ARGUMENTATIVOS


THE FIGURE OF THE VICTIM

genealogy and argumentative uses


A FIGURA DA VÍTIMA

genealogia e usos argumentativos


Omar Alejandro Murad
(Universidad Argentina de la Empresa (UADE) Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas de Argentina)

muradoma@gmail.com


Recibido: 10/02/2020
Aprobado: 31/03/2020


RESUMEN


En nuestros días la figura de la víctima gobierna una buena parte de las intervenciones públicas de colectivos e individuos que no solo se asocian con minorías o grupos subalternos, sino que también gobierna el discurso de instituciones, colectivos e individuos que tienen un lugar consolidado en el statu quo. Una mirada rápida sobre la cuestión descartaría el uso de esta figura como una estrategia para generar agencia, puesto que la víctima se caracteriza por su pasividad. Sin embargo, el caso es que su utilización en el espacio público habilita ciertas prerrogativas en el agente que la invoca, al mismo tiempo que lo coloca en una posición que no necesariamente se caracteriza por su pasividad, sino que, al contrario, la figura dota al agente de posibilidades de acción muy específicas. En particular, en este trabajo nos proponemos poner en discusión este punto de vista considerando algunos ejemplos de negacionismo en torno al carácter de la víctima en cuanto tal. La negación de la víctima a partir de la disputa de su posición por parte de sus victimarios nos pone sobre aviso de un tipo de intervención verbal que tiene como ámbito de discusión a la figura de marras. En este trabajo proponemos, por una parte, historizar esta figura a partir del trazado de su genealogía, utilizando como insumos teóricos los estudios de Rene Girard y, por la otra, analizar retóricamente algunos casos ejemplares en los que se hace visible el tipo de agencia que caracteriza su uso. Para ello, nos serviremos de ejemplos tomados de la literatura de la historia y de las ciencias sociales y del movimiento feminista.


Palabras clave: Víctima. Retórica. Negacionismo.


ABSTRACT

Nowadays, the figure of victim rules several public interventions of individuals and collectives that not only belong to minorities and subaltern groups, but also it rules institutional, collective and individual discourses, that have a consolidated place in the

statu quo. A quick look over this issue discards using this figure as a strategy of agency due to a victim is characterized by its passivity. However, the case is that its use in the public space able to certain prerogatives in the agent that invokes it and, at same time, it puts him or her in a position that is not necessarily characterized by its passivity but, on the contrary, this figure endows to the agent with very specific possibilities of action. Specifically, in this work we propose put into question this point of view considering a few examples of negationism about the character of the victim in such. The negation of the victim through the means of disputing its position by its aggressor attracts our attention a kind of verbal intervention that uses the figure of the victim. In this work we propose, on the one hand, to historicize this figure making its genealogy based on Rene Girard’s studies about sacrifice and, on the other hand, to analyze rhetorically a few exemplary cases that visibilizes the type of agency that characterize its use. To do that we take examples from history and social sciences literature and the feminism movement.


Keywords: Victim. Rhetoric. Negationism.


RESUMO

Em nossos dias, a figura da vítima governa boa parte das intervenções públicas de grupos e indivíduos que não apenas se associam a minorias ou grupos subordinados, mas também governa o discurso de instituições, grupos e indivíduos que têm um lugar consolidado no status quo Uma rápida olhada na questão excluiria o uso dessa figura como estratégia para gerar agência, uma vez que a vítima é caracterizada por sua passividade. No entanto, o caso é que seu uso no espaço público permite certas prerrogativas no agente que o invoca, enquanto o coloca em uma posição que não é necessariamente caracterizada por sua passividade, mas, pelo contrário, a figura confere agente de possibilidades de ação muito específicas. Em particular, neste trabalho, propomos discutir esse ponto de vista, considerando alguns exemplos de negação em relação ao caráter da vítima como tal. A negação da vítima da disputa de sua posição por seus autores nos alerta sobre um tipo de intervenção verbal que tem como espaço de discussão a figura de marras. Neste trabalho, propomos, por um lado, historiar essa figura a partir do traçado de sua genealogia, utilizando como entradas teóricas os estudos de René Girard e, por outro, analisar retoricamente alguns casos exemplares nos quais o tipo de agência que caracteriza seu uso se torna visível. Para isso, usaremos exemplos extraídos da literatura de história e ciências sociais e do movimento feminista.


Palavras-chave: Vítima. Retórica. Negação.


Introducción


Una manera de abordar el estudio de las ansiedades de una época, tanto pasada como presente, es escuchar el murmullo que reverbera como un ruido de fondo sin que, por eso mismo, le prestemos mayor atención. Aquello de lo que hablamos todo el tiempo y que nos hace hablar es un material de primer orden para delinear las formas que habitan nuestro presente. Así, por ejemplo, cualquiera que realice la búsqueda del término ‘víctima’ en Google encontrará miles de entradas que se ocupan de cuestiones que van desde las víctimas de tiroteos, robos, accidentes de tránsito, estafas, y otros eventos y acciones más o menos accidentales o intencionados, hasta los topoi más comunes de nuestra época sobre las víctimas del Holocausto, de la bomba atómica en Hiroshima y Nagasaki, civiles de Palestina, violencia de género, discriminación étnica, religiosa o sexual, abusos, entre muchas otras. Incluso se pueden hallar referencias a víctimas de maltrato aplicadas a diferentes animales. Las víctimas exceden el ámbito de lo humano.

La heterogeneidad de las víctimas, la variedad de significados que alberga el uso del término ‘víctima’, y la apelación a esta figura en los más diversos debates y contextos discursivos: periodísticos, políticos, jurídicos, históricos y memorialísticos, siempre públicos, la convierten en una auténtica keyword de este tiempo. Vale la pena señalar que Raymond Williams no reconoce el término en sus Keywords de 1976 (1983). Y es notable también que, en la actual recuperación del proyecto de Williams por parte de la Universidad de Pittsburg, la entrada “victim” es señalada como una de las palabras más relevantes del debate público de las sociedades contemporáneas, porque liga las experiencias traumáticas de individuos o grupos con políticas públicas y de defensa de derechos, en el marco de amplias discusiones. Como esa misma entrada señala, en estas discusiones se ha criticado el uso del término “víctima” para los casos de abuso, o para caracterizar a diversos grupos minoritarios y se propone en su lugar el término “sobreviviente” que destaca la resiliencia del agente victimizado. El rechazo se basa en la idea de que la noción de “víctima” supondría un agente pasivo que dificulta la percepción de la agencia individual y colectiva y de esa manera obtura su empoderamiento. Con todo, este rechazo descuida el uso de la figura de la víctima como una acción argumentativa que produce efectos muy precisos de agenciamiento a partir de la redescripción de un ámbito de posibilidades de acción.


A excepción de quienes han padecido un accidente, es decir que han sufrido acciones o eventos no intencionados, en todos los casos restantes la invocación de la figura de la víctima siempre supone el padecimiento de una relación asimétrica de poder. Ese es el elemento diferencial que distingue a la víctima de cualquier otro tipo de relación. En algunos usos la figura es invocada para redescribir una situación, haciendo visible la asimetría entre quienes son dominados y quienes dominan. En estas ocasiones, la figura se vuelve un ámbito de disputa en sí mismo, puesto que los agentes identificados como víctimas son dotados de ciertas prerrogativas, mientras los victimarios adquieren ciertas responsabilidades por las consecuencias de sus actos. Sin embargo, este escenario ideal raras veces se da. Como ámbito de disputa, lo más común es que a la víctima, i.e., quien ha sufrido un daño como consecuencia de hallarse en una posición desventajosa dentro de una relación de poder, se le nieguen las prerrogativas que trae aparejada la figura a partir del uso de estrategias muy específicas de interacción verbal. Estas estrategias pueden ser identificadas como técnicas retóricas.


En lo que sigue nos interrogaremos por la utilización de esta figura en el espacio público. Nuestra hipótesis es que habilita ciertas prerrogativas en el agente que la invoca, al mismo tiempo que lo coloca en una posición que no necesariamente se caracteriza por su pasividad, sino que, al contrario, la invocación de esta figura dota al agente de posibilidades de acción muy específicas. Son estas posibilidades de agencia las que se ponen en juego de manera un tanto paradójica en las intervenciones verbales que tienen como objetivo la inversión de estas prerrogativas y el consecuente borramiento o, más bien, invisibilización de la relación asimétrica de poder que es la que en primer lugar hace posible la posición de la víctima. A esta invisibilización de la puede considerar una forma de negacionismo, puesto consiste justamente en negarle a la víctima su carácter como tal.

Por eso, la recurrente elección de esta figura para efectuar intervenciones públicas nos lleva a la pregunta sobre su funcionamiento y posibilidades de agencia. En este trabajo realizaremos las siguientes tareas: en primer lugar, historizaremos esta figura a partir del trazado de su genealogía atentos a los cambios en su dimensión normativa; en segundo lugar, analizaremos algunos casos testigo en los que se hace visible el tipo de agencia que caracteriza su uso. Para ello nos serviremos de ejemplos tomados de la literatura de la historia y de las ciencias sociales y de la crítica feminista.


El enfoque que vamos a adoptar es retórico y esto por varias razones: primero, porque la extensa tradición retórica, más larga incluso que la de la filosofía, provee de un vocabulario que permite analizar al lenguaje sin comprometerse con los objetos sobre los cuales versa dicho vocabulario.2


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2 El uso de un metalenguaje nos permite evitar la circularidad o petición de principio en la que incurriríamos si utilizamos en nuestro análisis los mismos términos o conceptos que estamos analizando. Parte del problema de analizar, por ejemplo, la figura de la “víctima”, consiste en evitar su caracterización de antemano sobre cómo debería ser una víctima, y luego evaluar que tan cerca o lejos se halla de

Segundo, este metalenguaje retórico desde siempre ha llamado la atención sobre los actos verbales, i.e., sobre el discurso considerado como una acción. Esto evita el engorroso trabajo de deslindar cuándo un acto verbal modifica algún aspecto del mundo o del comportamiento de los agentes respecto del mundo y cuándo no lo hace. Nos libra, por ejemplo, de la fatigosa distinción entre teoría y práctica. Desde un punto de vista retórico, decir y hacer son una y la misma cosa. Tercero, esto no lleva a la consideración de la imaginación y su capacidad de crear ficciones como la facultad humana de primer orden en función del conocimiento. La imaginación y sus ficciones no se oponen al conocimiento y la realidad, sino que éstas son un producto de aquellas (Blumenberg, 2018; Grassi, 1999; 2015; Frye; 1991; Kermode; 2000; Pepper, 1942). Finalmente, el análisis de las intervenciones verbales situadas, de situaciones retóricas, nos permite ver el modo en que las disputas verbales se sirven de un acervo tópico común que funge como fuente de argumentos, y en este caso, como una plataforma de distribuye posiciones dentro de un ámbito de relaciones de poder.3


  1. Genealogía de la figura de la víctima

    La figura de la víctima aparece primero como una figura narrativa, i.e., caracteriza lo que puede hacer un personaje, su agencia. Luego, puede ser analizada también según su estructura inmanente o esquema. En ambos casos, las figuras sirven tanto como fuentes para la invención de argumentos como insumos que permiten lograr un efecto estilístico. El modo en que las figuras se combinan atiende principalmente al auditorio al que están dirigidas y pretenden antes que nada lograr un efecto que es tanto cognitivo como práctico, i.e., procuran tanto transmitir conocimiento como modificar la conducta del auditorio. Analizaremos primero la etimología y la forma narrativa de esta figura y luego su esquema figurativo.

    “Víctima” es una voz latina cuya etimología es imprecisa. Su significado alude al sacrificio de animales e incluso personas. Hay quienes la asocian a la misma raíz de victoria, siendo “víctima” quien es sacrificado como resultado de una derrota. Pero esta etimología popular tiene numerosos detractores y ciertamente parece más bien producto de un prejuicio que resultado del análisis filológico. Una etimología más cuidada la relaciona a una voz etrusca ligada al significado de “elegir” y “seleccionar” ofrendas a los dioses, asociada a su vez a la voz latina “vigere”, i.e., “ser honrado” o “vigoroso”, que daría por resultado exactamente lo contrario a la etimología anterior, algo así como “lo que está en el más alto honor”, es decir, “ser seleccionado para el sacrificio”. También podría estar relacionada a la voz latina “vicis”, i.e., “giro” u “ocasión”, aludiendo al intercambio de ofrendas y dones con los dioses. En todos los casos, la víctima es lo que se ofrece en sacrificio a los dioses, y tiene un sinónimo en el término “hostia”.


    En inglés, en castellano y en la mayoría de la lenguas romances el significado principal del término víctima es prácticamente el mismo, (1) “persona o animal sacrificado o destinado al sacrificio”.4 La Real Academia Española atestigua este significado desde la edición de 17805 y la edición del 2001 recoge cinco acepciones, aparte de la mencionada que encabeza la lista: (2) “Persona que se expone u ofrece a un grave riesgo en obsequio de otra”, (3) “Persona que padece daño por culpa ajena o por causa fortuita”, (4) “Persona que muere por culpa ajena o por accidente fortuito”, (5) “Quejarse


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    dicha definición el uso considerado. Esta estrategia analítica metalingüística es la que ha utilizado Hayden White en Metahistoria para analizar el lenguaje utilizado por los historiadores en sus escritos (White, 2010). A menudo esta estrategia se confunde con una dimensión teórica del análisis textual, y hasta cierto punto es lícito hacerlo (Partner y Foot, 2013: 1). Sin embargo, la introducción del término “teoría” implica siempre una dimensión práctica de la cual el primer distingo se halla escindido, lo que trae aparejado una serie de distinciones y aclaraciones que subtienden una concepción del lenguaje a la que no suscribimos. Por eso, la utilización de un metalenguaje basado en el léxico retórico nos exime de estas distinciones y aclaraciones que poco agregan a nuestro trabajo.

    3 El concepto de “relaciones de poder” lo tomamos de Michel Foucault, quien ha explicitado sus presupuestos en numerosos trabajos, por ejemplo en Vigilar y castigar (1998).

    4 En inglés desde finales del siglo XV se lo utiliza con el siguiente significado: "living creature killed and offered as a sacrifice to a deity or supernatural power, or in the performance of a religious rite", desde 1650 se atestigua el significado de un daño, tortura o muerte, infringida por otro, desde 1718 alude a quienes han sufrido desastres o accidentes y desde 1780 a quienes han padecido un engaño. Entrada victim en Online Etymology Dictionary, recuperado en: https://www.etymonline.com/word/victim#etymonline_v_7770.

    5 Así aparece la entrada “víctima” en la edición de 1780: “La ofrenda viva, que se sacrifica y mata en el sacrificio”.

    excesivamente buscando la compasión de los demás”. La acepción (3) recién aparece en la edición de 1925, mientras las acepciones (4) y (5) recién en la edición del 2001.6 Mientras las dos primeras recogen el sentido original del sacrificio, las últimas tres introducen las nociones de culpabilidad e inocencia, ambas relacionadas en el siglo XX con el lenguaje jurídico, en relación tanto con delitos simples como con genocidios y otras violaciones a los derechos humanos.


    En este breve recorrido por diversas acepciones de la voz “victima” podemos advertir un desplazamiento semántico que, sin abandonar nunca el carácter digamos pasivo de quien es victimizado, poco a poco van ganando visibilidad ciertas atribuciones que le conciernen a la palabra, tales como su padecimiento gratuito y, más específicamente, la identificación genérica de aquel que le infringe dicho padecimiento (el victimario) como parte del significado del término de marras, con total independencia del atributo arcaico respecto del honor que ostenta la víctima al ser obsequiada a los dioses como ofrenda.


    1. La figura de la víctima en la narrativa

      Desde un punto de vista narrativo, la figura de la víctima aparece en casi todos los relatos míticos y en la literatura antigua en general. Por ejemplo, el héroe mítico o trágico a menudo es una víctima en el sentido arcaico de víctima propiciatoria o chivo expiatorio. Aquí la víctima funciona como un pharmakos, i.e., tiene la función ritual de conjurar todos los males de la sociedad a partir de su sacrificio. Como tal, es investida de ciertos rasgos que la hacen identificable, que la vuelven un objeto de persecución: puede ser un extranjero, tener malformaciones físicas o enfermedades, ostentar un rango social bajo, realizar transgresiones a los tabúes más comunes como la prohibición del incesto o el parricidio, etc. Como lo evidencia el caso de Edipo, en general la víctima propiciatoria ostenta no uno sino varios de estos rasgos. (Girard, 2002: 36 ss.) La víctima como pharmakos se halla uniformemente distribuida en toda la literatura antigua en la forma de mitos, tragedias, comedias, etc. No solo en la cultura occidental, sino también en la americana, asiática, africana, oriental y, en fin, mundial. Está presente en cosmogonías, en el teatro griego, en los relatos para el entretenimiento popular, el romance, la tragedia moderna, etc. El punto de vista de todas estas narrativas es, justamente, el del victimario. (Girard, 2002: 37) Lo importante de este primer momento de la víctima como pharmakos es la invisibilización del perseguidor, i.e., de la selección y articulación de los rasgos que identifican al chivo expiatorio. (Girard, 2002: 261) Por eso, no se problematiza en absoluto su inocencia o culpabilidad; al contrario, se asume que merece ser una víctima, alcanza con el reconocimiento de sus rasgos victimarios. Como ha señalado Nortroph Frye en relación con la tragedia antigua,


      El pharmakos no es inocente ni culpable. Es inocente en el sentido de que lo que le acontece es mucho más grave que cualquier cosa que pudiese provocar lo que él haya hecho, como el escalador cuyo grito ocasiona la avalancha. Es culpable en el sentido de que es miembro de una sociedad culpable o habitante de un mundo en el que tales injusticias son parte inevitable de la existencia. Los dos hechos no llegan a juntarse, permanecen irónicamente aparte. El pharmakos, en resumidas cuentas, se encuentra en la situación de Job. Job puede defenderse contra la acusación de haber cometido algo que haga que su catástrofe sea moralmente inteligible; pero el éxito de su defensa la hace moralmente ininteligible (Frye, 1991: 64).


      En sentido estricto, el punto de vista del perseguidor, al no problematizar moralmente la culpabilidad o no de la víctima, la da por sentada. Por eso, alcanza con mostrar lo rasgos que la hacen objeto de persecución. En la tragedia griega, por ejemplo, alcanza con el error o equivocación del héroe, hamartia, que pone en funcionamiento todo el mecanismo persecutorio. La víctima no tiene que hacer otra cosa que equivocarse en base a un desconocimiento sobre sí mismo y sobre las fuerzas a las que se enfrenta. Esto lo lleva a hacer lo que no puede, de manera que las consecuencias de sus acciones no



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      6 Entrada “víctima”, Instituto de Investigación Rafael Lapesa de la Real Academia Española (2013): Mapa de diccionarios [en línea], Recuperado en http://web.frl.es/ntllet.

      son las que él espera. El resultado de las acciones del héroe es la transgresión del orden establecido – por ejemplo, en Edipo matar a su padre y tener relaciones incestuosas con su madre- pero, al mismo tiempo, estas mismas acciones restauran, a partir del sacrificio del héroe, ese mismo orden. “El transgresor se vuelve restaurador -escribe Girard- e incluso en fundador del orden que ha transgredido, anticipadamente en cierto modo” (Girard, 2002: 60). El pharmakos se vuelve a un tiempo veneno y remedio como el pharmakon médico. Un ejemplo de transgresor-restaurador es Prometeo quien desobedece a Zeus y les obsequia el fuego a los hombres. Aunque es castigado por su transgresión, con esa misma acción funda también la cultura humana basada en la técnica. Otro ejemplo, esta vez tomado de la mitología azteca, es el de Nanauatzin, el dios purulento que se arrojó como ofrenda al fuego para convertirse luego en el sol (Girard, 2002: 80 ss.).


      Esta frondosa literatura nos muestra que la víctima como pharmakos es a un tiempo aborrecida y venerada. (Girard, 2005: 103) Su situación no es retratada en términos de culpabilidad moral, sino que la fuerza de la figura radica en su capacidad de invertir las relaciones de daño o perjuicio entre los perseguidores y sus víctimas. Es la causa de ciertos males como la discordia, la enfermedad o la sequía, pero también su remedio. El punto de vista del perseguidor se hace presente allí donde se naturalizan los rasgos que autorizan algún tipo de violencia sobre el agente victimizado o sacrificado. Los relatos son portadores de una asimetría de poder entre la víctima y el victimario que oculta el acto selectivo del último reparando, en cambio, en ciertos rasgos que porta el agente seleccionado. Invisibiliza, pues, el poder que elige este o aquel agente como chivo expiatorio y lo hace colocando toda su atención sobre la víctima.


      Girard encuentra en el mecanismo del chivo expiatorio un modelo arquetípico que sirve para conjurar la violencia, cuya fuerza es a un tiempo desestructurante de lo social, pues disuelve todas las jerarquías, pero también fundante de la sociedad, pues solo a partir del ritual del sacrificio se apacigua la violencia indiferenciada. De allí que considere que todas las religiones encuentran su nacimiento en esta violencia fundadora, y que los mitos son un modo privilegiado de recordarla y legitimarla. La religión y el mito se fundan en la violencia y el sacrificio la purga, paradójicamente, con violencia ritualizada. (Girard, 2005: 100).

      Un segundo momento en la historia de esta figura está representado en los evangelios, en particular en la Pasión de Cristo. Varias veces señalan que los perseguidores “aborrecen sin causa”, y Jesús le pide a su Padre que los perdone pues “no saben lo que hacen” (Girard, 2002: 258; 265). En la lectura de Girard, la revelación no es otra cosa que la denuncia del mecanismo generador de mitos, del chivo expiatorio, que anida en el punto de vista de los perseguidores. La Pasión de Cristo expone bajo una luz racional este mecanismo sin conseguir, por eso mismo, crear otro mito. Es la primera gran desmitificación del punto de vista del perseguidor, nacida en “el mismo seno del universo perseguidor” (260). Esto se ve con claridad en el cambio semántico de términos clave como ‘perseguir’ o ‘testigo’. Señala Girard que


      En el latín clásico ninguna connotación de injusticia va ligada a la persequi; el término significa simplemente: perseguir ante los tribunales. Fueron los apologistas cristianos, especialmente Lactancio y Tertuliano, quienes decantaron persecutio en el sentido moderno. Se trata de la idea muy poco romana de un aparato legal al servicio no de la justicia sino de la injusticia, sistemáticamente torcido por las distorsiones persecutorias. En griego, de igual manera, mártir significa testigo y es la influencia cristiana lo que hace evolucionar la palabra hacia el sentido actual de inocente perseguido, de víctima heroica de una violencia injusta (261).


      Lo que cambia aquí es justamente el punto de vista bajo el cual se percibe a la víctima. En la relación víctima/victimario la tradición nos ha legado numerosos testimonios desde la perspectiva del segundo de estos términos, pero recién el cristianismo invierte esta relación, colocándola bajo la luz del primero. El punto de vista de las víctimas es el de su inocencia, su completa falta de responsabilidad, su no culpabilidad y, en fin, su denuncia de una falsa atribución causal: las víctimas no son responsables de los males que se les adjudican. Por eso, los evangelios señalan a Jesús como el paráclito, es decir, la voz griega de ad-vocatus, el que “habla en nombre de otro”, el abogado universal que intercede por las víctimas inocentes (Girard, 2002: 269-270). En la narrativa evangélica se invierte

      el punto de vista del perseguidor y se asume el de las víctimas, perseguidas sin causa, pues son inocentes. Esta inversión ha dejado profundas huellas en la cultura, en el lenguaje, dotando de nuevas valencias, de nuevas propiedades y atribuciones a la figura de la víctima. Y al hacerlo la ha convertido en un ámbito verbal de disputa, en un auténtico topos contemporáneo.

      Tal es así que, en el siglo XX, en el contexto de la victimología, una subdisciplina de la flamante criminología, en el topos de la víctima la inocencia se vuelve el baremo que permite evaluar si se trata de una víctima ideal, es decir auténtica, o no. Desde sus inicios, y al igual que otras áreas de los estudios en criminología, la victimología busca clasificar y tipificar los distintos casos en los que un agente que padece un delito o daño puede ser catalogado como víctima. Al hacerlo, subrepticiamente evalúa cuál es el grado de responsabilidad o culpabilidad (guilty) de la víctima en el delito que ha padecido. La idea rectora es que la víctima no solo es pasiva, sino también activa en el proceso de criminalización y de esta forma su rol es definido a partir de una interacción con el criminal (Moriarty: 2008, 23). Al igual que la idea lombrosiana de que algunos hombres “nacen criminales”, von Hentig, uno de los fundadores de esta subdisciplina, sostenía que algunos hombres “nacen víctimas”. Así, los ancianos y los niños, los inmigrantes y las personas con problemas psicológicos o cognitivos, las minorías raciales y las personas de conductas promiscuas, entre otros agentes de “riesgo”, son propensos a ser víctimas (Moriarty, 2008: 22). Además, es preciso notar que uno de los términos clave utilizados por la victimología para culpar a la víctima, “victim precipitation”, fue acuñado en 1958 por Marving Wolfang para describir los casos en que un agente se convierte en víctima como resultado de la comisión de un delito. Su discípulo, Mechanim Amir aplicó unos años más tarde la misma denominación para describir los casos de agresión sexual (Moriarty, 2008: 25-26). Pero entre uno y otro caso, se da una diferencia nodal, puesto que una persona que agrede a otra con un cuchillo y está dispuesta a matar puede convertirse a su vez en víctima de homicidio por parte del agredido. Y lo mismo le podría ocurrir a un ladrón que muere en ocasión de robo. Pero el concepto resulta inaplicable a una mujer que ha sufrido una violación, puesto que considerarla propensa a ser víctima bajo este esquema implicaría en primer lugar que intentaba violar, o dañar de alguna manera, a su agresor. Esta línea de argumentación, desarrollada por la naciente victimología, trafica el supuesto de que el daño ocasionado es susceptible de una responsabilidad compartida entre el agresor y la víctima. Y ciertamente el desarrollo posterior de la subdisciplina hasta nuestros días no se ha privado de este enfoque.7


    2. Análisis del esquema de la figura de la víctima

      Pasemos ahora brevemente al análisis del esquema de la figura de la víctima. Encontramos en ella una relación entre dos términos correlacionados a partir de una distancia, i.e., de una asimetría que señala la posición exacta de cada uno de los puntos conectados por dicha relación de presuposición recíproca. En esta presuposición anida el tropo de la metonimia, puesto que la mención de uno de ellos dispara inmediatamente su asociación con el otro término. Así, quién dice “víctima” dice siempre “victimario”.

      Además de la metonimia que asocia estos dos términos, en el esquema de esta figura opera el tropo de la ironía que los correlaciona a partir de la inversión de los valores de cada uno de los términos correlacionados. Las cualidades de un término presuponen lo opuesto en el otro término. Así, lo contrario de la víctima es el victimario; la víctima supone siempre un 'victimario' y viceversa. Para lograr el efecto de transvaloración o la realización de la transmutación de las propiedades de un término en el otro, la aparición de uno de ellos en el contexto de la figura de la víctima supone siempre


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      7 Un ejemplo relativamente reciente es el caso de la presentación mediática y jurídica del femicidio de dos jóvenes argentinas ocurrido en Ecuador poniendo el foco en su carácter de “víctimas propiciatorias”, i.e., haciéndolas responsables de su carácter de víctimas. Julissa Mantilla (8 de marzo, 2016). Ius 360 “el estereotipo de la víctima propiciatoria”. Recuperado en https://ius360.com/columnas/el- estereotipo-de-la-victima-propiciatoria2/ (consultado 25/01/20).

      la elisión de las cualidades invertidas del otro. En la afirmación "x es una víctima" está contenido "hay un victimario de x".

      Este mecanismo hace posible la suspensión de los efectos de juzgar a x como víctima y pone el foco en determinar si efectivamente aplica o no la figura de víctima al juicio sobre la situación de x. Pasa inadvertidamente de nivel semántico, elevándose del objeto hablar sobre "la víctima x" hacia hablar sobre "hablar sobre x como víctima". En otros términos, se pasa de la figuración de una experiencia personal o vicaria, al lenguaje utilizado para caracterizar un tramo de experiencia personal o vicaria bajo la figura de víctima. Sobre todo, este desplazamiento de uno a otro nivel busca discutir la pertinencia de la aplicación local, singular e histórica, de la figura. Este giro es de suma importancia pues al volver sobre la figura como “figura”, cambia el contexto que hace posible su interpretación y de esa forma disputa la normatividad que anida en la relación asimétrica de poder que la constituye como tal. La piedra de toque utilizada para decidir si aplica o no la figura de la víctima es el criterio de "inocencia". La única víctima "real" es la víctima inocente. De allí que, en general, los argumentos para discutir la idoneidad o no de una víctima pongan el foco en socavar su inocencia.


      Hasta el momento hemos detectado dos técnicas retóricas que hacen posible la inversión verbal del rol de la víctima, convirtiéndola en victimario, e inversamente, de victimario a víctima. La primera es la intervención dialéctica que hace uso de la antífrasis, una variante de la negación irónica, que consiste en aludir a las cualidades opuestas a las que posee un objeto (Beristáin, 1995: 271). En este caso, consiste en dos negaciones y una afirmación: “vos no sos la víctima, yo no soy el verdugo, vos sos el verdugo”. El efecto que se consigue con esta técnica no solo es la inversión de las cualidades de uno y otro término, sino también el cambio del contexto que estos suponen.


      La otra técnica retórica utilizada para redescribir narrativamente evaluaciones morales invirtiendo su valor es la paradiástole (Skinner, 2007: 307 ss.).8 Aristóteles, Cicerón y Quintiliano llaman la atención sobre esta técnica que no consiste en la mera sustitución de un valor por su contrario, por ejemplo la valentía por cobardía, sino en asignarle al comportamiento real de un agente un carácter moral de signo contrario al que le adjudican nuestros adversarios dialécticos. Así, por ejemplo, señala Aristóteles,


      Pero tanto para alabar como para vituperar conviene tomar también lo que está próximo a la realidad, como si se identificase con ello. Por ejemplo, representar al precavido como calculador e intrigante, al simple como bueno y al insensible como manso. Es decir, que siempre hay que atribuir a cada una de las cualidades semejantes según lo que más convenga. Por ejemplo, presentar al iracundo y al furioso como francos; y al arrogante, como de gran altura y distinción; a los que exceden en algo, como si poseyesen las virtudes correspondientes, al audaz como valeroso y al pródigo como liberal (Aristóteles, Retórica, 1367b).


      Lo que consiguen ambas técnicas aplicadas a casos de redescripción de la figura de la víctima es el cuidadoso borramiento de la relación asimétrica de poder constitutiva de la figura. A diferencia de otras figuras, la víctima presupone siempre un contexto de desigualdad que la constituye y hace posible. Como hemos visto, en un primer momento, como chivo expiatorio esta relación asimétrica está prácticamente invisibilizada y el foco es colocado en el punto de vista de los perseguidores, de los victimarios. En un segundo momento, el punto de vista de la víctima invierte el juego de visibilidades y queda expuesto el problema moral de la inocencia de las víctimas. Una vez señalada la asimetría entre víctima y victimario, ya no se puede borrar de la figura. Pero en este punto la disputa se desplaza hacia la consideración misma de la inocencia que permitiría distribuir correctamente el juego de responsabilidades y prerrogativas que anidan en esa figura. La inocencia de la víctima señala


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      8 A propósito de la paradiástole utilizada como una técnica de redescripción evaluativa de acciones y eventos, Skinner escribe: […] “puede decirse que la esencia de la técnica consiste en reemplazar una descripción evaluativa dada con un término rival para que sirva para caracterizar la acción no menos plausiblemente, pero que sirva, al mismo tiempo, para colocarla bajo una luz moral de signo contrario. Uno busca así persuadir a su audiencia para que acepte la nueva descripción, y por consiguiente, para que adopte una nueva actitud hacia la acción en cuestión.” (Skinner, 2007: 308).

      directamente la responsabilidad moral del victimario, causante de un daño injustificado. Al mismo tiempo, habilita moralmente a la víctima a dar cuenta de su padecimiento, a decir su verdad.9


  2. Análisis del uso de la figura en espacio público


    En el libro ¿Cómo conversar con un fascista? Reflexiones sobre el autoritarismo de la vida cotidiana, Marcia Tiburi nos da algunos ejemplos sobre el uso abusivo de la figura de la víctima por parte de sectores conservadores propio de nuestros días. Por ejemplo, ella cuenta que

    Tiempo atrás, un diputado, conocido por una homofobia que expresaba de múltiples formas, apareció como quien “invertía el juego” del prejuicio que quien prejuzga recrea a cada instante, colocándose en la posición de alguien que sufría “heterofobia”. Desde su punto de vista, era una víctima de odio por ser un representante de la heterosexualidad en una sociedad en la que la homofobia es la regla. Sin embargo, y aún más grave, trataba de ocultar esa regla mediante una equiparación con algo con lo que no había comparación posible. Simplemente, intentaba que su acto tuviera varios efectos: el primero sería la disminución de la gravedad de su habitual gesto homofóbico; el segundo, la banalización de la homofobia, ya que, comparada con su contraria, sería algo en cuyo nombre las personas actúan de forma banal y, por tanto, natural. Finalmente, las víctimas de homofobia serían criminales al convertirse en heterófobos. Cambiando el lugar de la víctima, equiparando los crímenes y las víctimas, ya no tendríamos víctimas ni criminales, y el diputado, como criminal, resultaría ileso, habiendo conseguido, además, hacer caer sobre su víctima la condición de culpable (Tiburi, 2015: 63-64).


    El pasaje es clarísimo en cuanto a la descripción y análisis del uso verbal espurio de la figura de la víctima. El uso de la antífrasis es transparente: con su intervención el diputado mentado niega primero ser un victimario, un perseguidor, luego niega que los perseguidos, los homosexuales, sean víctimas, y finalmente afirma ser él mismo víctima de discriminación. Quisiera destacar, además, la importancia de la inversión del lugar del victimario, en este caso el diputado homofóbico, por el lugar de la víctima, los homosexuales en una sociedad homofóbica. Lo que la autora señala como regla, la homofobia de la sociedad brasileña es invisibilizada por este uso de la figura de la víctima. El resultado es la equiparación de víctimas y victimarios y el borramiento de todas las responsabilidades que le atañen a unos y las prerrogativas de los otros. Y tal vez lo más importante, al hacerlo encuentra nuevos medios para perpetuar las relaciones de dominación existentes en dicha sociedad. Aquí la heteronormatividad es la matriz de relaciones de poder que queda perpetuada e invisibilizada con este uso de la figura de la víctima.


    En nuestro país un caso ejemplar del uso político de la víctima inocente lo hallamos en el prólogo al Nunca Más escrito por Ernesto Sábato. El argumento general es que en la Argentina se libró una guerra entre dos fuerzas, dos demonios, que tuvieron como rehén a la sociedad argentina en su conjunto. Emilio Crenzel destaca que, en el programa televisivo del Nunca Más Sábato, refiriéndose a las desapariciones, declaró que


    […] esto no es un problema político, como se suele argüir, esto es un problema ético y religioso. Personalmente, creo que ha sido el reinado del demonio sobre la tierra”. Estos “actos demoníacos”, prosiguió, se cometieron “no ya contra los presuntos o reales culpables de algo, sino contra la inmensa mayoría de inocentes absolutos [...] (Crenzel, 2013: 7).


    El tópico es conocido. La presunta “inocencia absoluta” de la sociedad argentina desliga automáticamente a la sociedad civil de cualquier responsabilidad.10 La guerrilla, en cambio, que


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    9 Sobre el rol del testimonio de víctimas hay una frondosa literatura. En nuestra lectura seguimos las tesis de Verónica Tozzi en torno al estatus privilegiado del testimonio de las víctimas en término tanto epistémicos como morales y de la paradoja que conlleva el dar cuenta de eventos y experiencias indecibles y que, al mismo tiempo, requieren ser dichos. (Tozzi, 2012).

    10 Federico Lorenz en su libro Las guerras por Malvinas señala que “La juventud, entre los años setenta y ochenta, fue vista tanto como depositaria de los valores sagrados de la Patria como campo propicio para la propaganda subversiva. Un elemento central en los reclamos por parte de los familiares de los desaparecidos consistió en minar la base del argumento militar para su culpabilización: aquel que los involucraba en actividades “subversivas”. Si para el Estado represor toda actividad partidaria, política y cultural era sinónimo de la subversión, las jóvenes víctimas debían estar libres de ese pecado. Al mismo tiempo, para resaltar los crímenes dictatoriales, y destacar

    comenzó con acciones subversivas no es inocente y, en consecuencia, por más que se caracterice como aberrantes las torturas y las desapariciones es, con todo, responsable. La estrategia argumentativa no solo invisibiliza la responsabilidad de los políticos, empresarios, Iglesia y sociedad civil en general, en la represión ilegal y las desapariciones, sino que además iguala en poder y responsabilidad a los militantes revolucionarios y a los militares profesionales que formaban parte del poder represivo del estado argentino. Invisibiliza, pues, la enorme asimetría entre unos y otros contendientes y los medios ilegales, que vulneran las garantías del estado de derecho, utilizados por los militares. Es natural, en consecuencia, que la alusión a la inocencia en el ámbito de discusión sobre la represión de la última dictadura tienda a ser percibida como una forma de despolitizar las acciones de los agentes involucrados y, en particular, de borrar la responsabilidad de los militares devenidos verdugos e, inversamente, de responsabilizar a los militantes revolucionarios de su propia victimización.

    Un último ejemplo. Valentina Salvi realizó un estudio sobre las estrategias memorialistas del ejército argentino después de la sangrienta dictadura que protagonizó. El libro lleva el sugestivo título De vencedores a víctimas. Allí Salvi describe como en un primer momento la memoria institucional del ejército asumió su participación en lo que denominaba guerra sucia como un triunfo sobre la subversión. Sin embargo, desde finales de los años 90 del siglo pasado, la estrategia discursiva institucional dio un giro brusco. Lo militares pasaron de ser héroes de una guerra sucia a víctimas de la guerrilla. Escribe Salvi:


    […] la figura de las “víctimas militares” permitió a la fuerza poner de relieve determinados hechos, personas y periodos del pasado reciente y ocultar, minimizar y disimular otros para salir del ámbito cerrado de la memoria corporativa e ingresar a la escena pública con un discurso verosímil y disputar los sentidos sobre el pasado que se cristalizaron en los últimos veinticinco años en torno a la memoria de los desaparecidos. Por otro lado, la facultó a renovar su deteriorada imagen con nuevas justificaciones y argumentos sobre lo actuado, con el propósito de apuntar al fortalecimiento de una memoria interna de la institución y al reconocimiento de la sociedad y el Estado (Salvi, 2012: 64).


    Como queda puesto en evidencia por el fragmento citado, la apelación a la figura de la víctima lejos de desagenciar al discurso institucional y a los militares en general, los dota de nuevos recursos argumentativos y justificaciones de su accionar. En este caso, a partir de la técnica de la paradiástole los militares logran articular una descripción corporativa de sí mismos como víctimas. Para eso, se apoyan, por una parte, en la narrativa humanitaria desarrollada por los organismos de derechos humanos y, por la otra, en eventos acaecidos cuya valencia transforman de una guerra contra la subversión en la que como agentes históricos se reconocen como héroes y mártires de la patria, a una guerra fratricida que los encuentra como una de las tantas víctimas de una guerra civil (Salvi, 2012: 206). En este caso, al igual que en el anterior, la responsabilidad por las acciones cometidas en el marco de la guerra fratricida se reparte entre ambos bandos. La ilusión es justamente que hay dos bandos y que están en igualdad de condiciones. De esta manera borran, o más bien, invisibilizan, sus responsabilidades repartiéndolas con la de las víctimas legítimas. Pero hay más. Los militares también reparten los derechos adquiridos por las víctimas a partir de sus padecimientos; corporativamente reclaman para sí las prerrogativas de las víctimas, sus derechos y reconocimiento público. Buscan de esta forma legitimar una institución desprestigiada por su accionar durante la dictadura. En suma, se sirven de esta estrategia de redescripción narrativa para disputar un ámbito simbólico y dotar a su causa de valores positivos. En otras palabras, su redescripción hace posible que se agencien de un ámbito de posibilidades de acción que se supone vedado para la contrafigura de la víctima, es decir, el victimario.


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    su inocencia, la imagen de los jóvenes se apoyó en dos elementos: su carencia de toda participación política, y su escasa edad” (2006:160).

  3. Conclusiones


En este trabajo hemos realizado la genealogía de la figura de la víctima para mostrar el modo en que algunos de sus usos argumentativos hacen posible la agencia de aquellos que invocan esta figura para redescribir sus acciones. Para ello, hemos optado por un enfoque retórico, puesto que cristaliza la manera en que el lenguaje verbal es una forma de acción cuyos efectos son de la máxima relevancia cuando se trata de modificar la percepción de una situación o agente histórico, e influir en la manera en que otros agentes actúan y perciben el mundo. En este caso particular, hemos mostrado que la figura de la víctima, que de ordinario pasa por ser desagenciante y pasiva, es en realidad una fuente de argumentos que provee de agencias muy específicas a quienes la usan. En consecuencia, esta figura se vuelve un ámbito de disputa simbólica en sí misma. Hemos procurado también que nuestro análisis de algunos de los usos de esta figura de cuenta de su extendida utilización en los más diversos debates e intervenciones públicas.


Finalmente, hemos querido llamar la atención sobre el potencial negacionismo que anida en el uso frecuente de esta figura. Negacionismo que consiste en invisibilizar la posición subordinada de un agente inmerso en una relación de poder que es constitutiva de la figura de la víctima y de la cual han surgido las prerrogativas de quienes la invocan. Las dos técnicas identificadas para lograr la inversión de la relación víctima-victimario, y la consecuente invisibilización de la víctima real, nos permiten calibrar el alcance de las intervenciones verbales en la arena pública que invocan a la “víctima”, al mismo tiempo que nos alertan sobre los peligros que anidan en ella. Tal vez, lo que podría considerarse como una trampa en la invocación de la figura es que, para quien ha sufrido el daño físico y psíquico de ser objeto de los más diversos abusos, ser investido por ella significa también la obligación de dar cuenta una y otra vez del carácter de víctima frente a la disputa constante de los victimarios. Justamente porque la figura no es ni pasiva ni desagenciante, como una mirada ingenua podría considerar, es que la misma se vuelve un espacio de disputa atractivo para esta forma de negacionismo. Nuestra intención en este trabajo ha sido contribuir al análisis crítico del lenguaje utilizado para representar lo social, en la convicción de que la tarea de redescripción del mundo no llega nunca a un final y de que, por eso mismo, es preciso disponer de las herramientas de la crítica para dar las batallas por el sentido de las cosas munidos de sus frutos.


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O QUE É PRECISO PARA FAZER O MUNDO?

A PHYSISCHE GEOGRAPHIE DE IMMANUEL KANT


WHAT IT TAKES TO DO THE WORLD?

the physische geographie of Immanuel Kant


¿QUE SE NECESITA PARA HACER EL MUNDO?

la physische geographie de Immanuel Kant


Letícia Helena Fernandes de Oliveira
(Universidade Federal do Paraná)
leticiahelenafoliveira@gmail.com


Recibido: 18/11/2019
Aprobado: 10/06/2020


RESUMO

O objetivo deste trabalho é analisar os motivos que fizeram o curso de Physische Geographie de Kant ser crucial para o desenvolvimento de sua Anthropologie. Sua proposta inicial é fundamentada na intenção de aplicar uma abrangência filosófica na geographie, que segundo ele não existia até então, visto que ela era considerada apenas como uma constituição natural do globo. Não convencido de que estava no caminho certo, ele anuncia em 1758 um novo curso de geografia com uma nova perspectiva, de que a geografia, seja uma preparação para a filosofia em geral, fazendo com os alunos pudessem se distanciar de conceitos vagos para abstrações mais claras. Dez anos mais tarde, em 1755, ele anunciou que iria ministrar um curso sobre anthropologie da qual o seu primeiro curso era parte complementar. O complemento de ambas reside no sentido de que as experiências que possuímos referente a natureza e do homem constituem juntas o conhecimento do mundo (Weltkenntniß), do qual Kant se interessava. Sendo assim, o conhecimento do homem é ensinado pela anthropologie e o conhecimento da natureza é ensinado pela physische geographie.


Palavras-chave: Geografia Física. Cidadão do Mundo. Antropologia. Pragmático.


ABSTRACT


The objective of this paper is to analyze why Kant's Physische Geographie course is crucial for the development of his Anthropologie. His initial proposal is based on the intention of applying a philosophical scope to geography, which he did not think existed until then, since it was considered only as a natural constitution of the globe. Not convinced that he was on the right track, he in 1758 announces a new geography course with a new perspective, that geography is a preparation for philosophy in general, allowing students to distance themselves from vague concepts to clearer abstractions. Ten years later, in 1755, he announced that he would teach a course on anthropology of which geography was a complementary part. Their complement lies in the fact that our experiences of nature and man together constitute the knowledge of the world

(Weltbürgers) of which Kant was interested. Thus, the knowledge of man is taught by anthropology and the knowledge of nature is taught by physische geographie.

Keywords: Physical Geography. World knowledge. Anthropologie. Pragmatic.


RESUMEN

El objetivo de este trabajo es analizar las razones que hicieron que el curso de Kant Physische Geographie fuera crucial para el desarrollo de su Antropología. Su propuesta inicial se basa en la intención de aplicar un alcance filosófico a la geografía, que, según él, no existía hasta entonces, ya que se consideraba solo como una constitución natural del globo. No convencido de que estaba en el camino correcto, en 1758 anunció un nuevo curso de geografía con una nueva perspectiva, que la geografía sería una preparación para la filosofía en general, permitiendo a los estudiantes distanciarse de conceptos vagos a abstracciones más claras. Diez años después, en 1755, anunció que iba a impartir un curso de antropología, del cual su primer curso era una parte complementaria. El complemento de ambos radica en el sentido de que las experiencias que tenemos, respecto a la naturaleza y al hombre constituyen en conjunto el conocimiento del mundo (Weltkenntniß), en el que Kant estaba interesado. Así, el conocimiento del hombre es enseñado por la antropología y el conocimiento de la naturaleza por la geografía física.


Palabras – clave: Geografía Física. Ciudadano del mundo. Antropología. Pragmático.



Introdução


O ser humano é capaz e necessita de uma educação, tanto no sentido da instrução quanto no da obediência (disciplina).


(Kant, 2007: 207).


O professor Kant teve sua filosofia fertilizada por sua própria genialidade, bastaria olhar o período pré- crítico e crítico para reconhecer o que ele pôde fazer. As aulas de (Geografia Física) Physische Geographie11 proferidas a partir de 1757 em Königsberg se encaixam perfeitamente nesse contexto de grandes feitos. Embora, pareça impensável que um filósofo que dedicou grande parte de sua vida a questões mais conhecidas - digamos assim, tenha se interessado pelo tema da geografia, mas não só se interessou como procurou ensiná-la por quase quarenta e nove anos, enquanto exercia a função de um Privatdozent12. A geografia não é uma obra propriamente dita, mas um curso, ela foi ensinada através das próprias anotações do Kant (Diktattext) – característica comum na Alemanha, já que muitos professores estariam ministrando suas próprias aulas através de suas próprias anotações e não com um livro base, como era de costume. Quando a geografia foi anunciada no catálogo de cursos da Universidade de Königsberg a intenção do filósofo era de considerara-la não somente enquanto uma constituição do globo terrestre, e tudo o que nele contém, como ele dizia ser feito até então, mas considerar, principalmente, uma certa abrangência filosófica para esse ensino geográfico.

Para fortalecer um vínculo entre a geografia e da dita abrangência filosófica, ele aponta ter procurado em outros inventários a respeito, desde a obra de Varenius até Lulofs, sobre os fundamentos gerais da


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11 Todas as demais traduções às obras de Kant utilizadas aqui estão referidas na bibliografia. As referências a Kant seguem a 1° (A) ou 2°

(B) edição das obras, abreviadas classicamente como KrV: Crítica da Razão Pura. Para a geografia, a abreviação utilizada é a PG e a antropologia, a abreviação é Anth. Todas as demais traduções constam na bibliografia.

12 Essa função foi exercida por Kant de 1740 a 1755. Seu título de Privatdozent foi obtido com a apresentação de sua dissertação apresentada à Universidade de Königsberg.

disciplina (Arnoldt, 1908: 193). Portanto, quando resgatou suas influências, Kant criou seu próprio esboço e pôde então lecionar o curso da maneira pela qual ele estava planejando. Contudo, ao que parecia ser um único anúncio e uma única forma de ensinar tal assunto, o professor ainda fez mais dois comunicados importantes. O primeiro deles se deu logo em seguida do seu primeiro anúncio, em 1758, quando informou novamente no catálogo de cursos, que iria continuar o ensino da geografia, mas com outras amplificações. Dessa maneira, seu objetivo com isso seria fornecer aos alunos uma formação mais consolidada, se afastando de conceitos vagos para pensamentos claros e concretos concernentes a sua formação. Na visão do autor prussiano, os alunos, ao entrarem em contato com esse ensino, estariam na realidade, se preparando para uma vida prática, porque de fato conheceriam melhor sua morada, e sobretudo, teriam conhecimentos teóricos mais aperfeiçoados, o que não poderia ser feito apenas por uma disciplina. Com essa ampliação fica claro também que a geografia encontrará sua segmentação e é a partir disso que dez anos depois do anúncio desse projeto, o autor acaba por reconhecer a antropologia – ensinada no semestre de inverno de 1772/73, como parte complementar da geografia.


Por que são partes complementares? A geografia para ele é uma preparação para o Conhecimento do mundo (Weltkenntniß), uma instrução para uma vida acadêmica útil, segundo ele. Em outras palavras, Kant não só encontra a segmentação da geografia na antropologia, como também atribuí funções a cada um desses cursos. A geografia, por sua vez, ensina o que diz respeito ao externo e a antropologia tematiza o homem enquanto o ser que está no mundo, como alguém que é pragmático.

Portanto, para compreendemos com mais acuidade de que modo a geografia está ambientada na filosofia de kantiana, procuraremos, neste artigo, levantar as seguintes perguntas (1) por qual razão ela é essencial para a antropologia, (2) qual são as implicações do curso mais especificamente as críticas sobre autenticidade da obra, bem como os problemas de tradução. Considerações importantes sobre as

(3) características gerais do curso e sua estrutura e (4) se existe e qual é a relação desse curso com a antropologia. No valemos, da introdução do curso de geografia – que por muitas vezes parece mais reveladora que o restante do curso, assim como pontos principais da antropologia e de alguns comentadores sobre o tema, já que nossa intenção aqui não é esgotar o tema, acreditando levianamente que estaríamos respondendo tudo isso em definitivo.


O curso de Physische Geographie de Kant


O curso de Geografia Física não exerce a atenção que deveria entre alguns pesquisadores da filosofia kantiana, mesmo que esse curso tenha sido proferido por quarenta anos na Universidade Königsberg nos anos de 1756 a 1800, durante seis horas semanais (Arnoldt 1908: 193)13. Com essa dedicação, quase exaustiva do professor, dá qual não é cabível passar desapercebida, nos perguntamos, por que Kant dedicou boa parte de sua carreira como docente à essas aulas? A resposta parece simples, mas é carregada de implicações.

Sabe-se que além de filósofo, Kant era também professor. Sua atividade professoral foi exercida até os últimos momentos de sua produção filosófica – à medida que produzia, ele ensinava, e isso fica claro para os que se debruçam sob suas obras. O tempo de contribuição do autor como docente é de quarenta e um anos, às atividades se iniciaram no semestre de inverno de 1755/56 e foram concluídas em meio ao semestre de verão de 1796. No início de sua carreira, Kant era Privatdozent, essa função foi exercida de 1755 a 1770, o que lhe permitia oferecer cursos particulares em que era pago diretamente por seus alunos, sendo livre para o ensinar o que e como quisesse. Um dos cursos que exercia enquanto


13 Estas informações foram retiradas do site Kant in the Classroom https://users.manchester.edu/FacStaff/SSNaragon/Kant/Home/index.htm, a página tem como o objeto fornecer o maior número de dados possíveis sobras as aulas ministradas por Kant, incluindo anotações dos próprios alunos e do filósofo. O material fornece uma ampla referência para os estudiosos de Kant, nos possibilitando compreender com mais clareza o contexto de suas obras.

um Privatdozent era a geografia física, e de início pode parecer que essas aulas são apenas uma mera obrigação formal que sua profissão lhe exigia, mas ela não pode ser olhada como apenas uma obrigação financeira do professor, pois isso desautoriza a importância e o desenvolvimento do tema da geográfico em primeira instância.

Diferente da Antropologia, a geografia não se tornou uma obra escrita propriamente dita por Kant depois de ter proferido diversas aulas a respeito, porque após isso, o filósofo autorizou que F. Theodor Rink editasse as anotações e a publicasse em 1802, enquanto apenas um curso, sendo o primeiro editor a fazê-lo. A edição reúne as anotações de vários alunos que acompanhavam o curso, e quando o texto estava sendo preparado para publicação, recebeu uma revisão do próprio Kant (Ribas, 2011). Contudo, mesmo com a revisão do autor, parece que entre seus estudiosos, não foi lhe poupadas críticas, sobre o conteúdo e autenticidade do curso, porque a edição de Rink é vista sob de um ponto de vista problemático. Ora, é necessário levar em conta que essa edição provém de anotações de alunos; mas antes que essas anotações tomassem forma, o filósofo prussiano ensinava através de suas próprias notas – o chamado Diktat-Text, em outras palavras, estamos lidando com um círculo vicioso de anotações livres e difíceis de serem tematizadas em sua concretude.

Louden, ao sair em defesa da importância do curso e não de Rink, delineia bem essa questão de autenticidade e conteúdo ao dizer que num primeiro momento se pensa que a negligência editorial de Rink é também a negligência para geografia, pois o consenso parece ser: esse texto não é confiável, fique longe disso (Louden, 2014, p. 454). Porém, para ele o problema não para por aqui, uma vez que Rink editou também outros trabalhos de Kant, incluindo palestras sobre Pedagogia (Padagogik), publicado em 1803, do qual também foi criticado. Todavia, foi muitas vezes mais traduzido e publicado que a geografia, há pelo menos um tradução de Louden, publicada pela primeira vez em 2007 no volume de Antropologia, História e Educação da The Cambridge Edition (Zoller e Louden, 2007), as palestras sobre Pedagogia de Kant também foram traduzidas três vezes para o francês, cinco para o espanhol e quatorze Para o italiano (Louden, 2014: 453), o que reforça o fato de que a indiferença à geografia não está apoiada apenas em por problemas com Rink.


Em uma posição diversa, Olaf Reinhardt aponta que as notas editadas por Rink foram “insatisfatórias desde o início, o que resultou em poucas revisões (Reinhardt, 2011: 103). Essa insatisfação com a relação ao que o curso apresenta e como ela se apresenta, parece estar atrelada, para Reinhardt por dois motivos, o primeiro deles é falta de precisão de Rink ao transcrever as notas e ao desejo do jovem Kant de conseguir um compromisso com a sua Universidade, mediante a trabalhos publicados, já que seu ofício na época era ser como Privatdozent. Reinhardt indica que como um Privatdozent (1755-1770), ele dependia inteiramente das taxas que seus alunos pagavam para frequentar suas palestras; em outras palavras, ele tinha que ser um professor bom e popular, e ele era. Ele, portanto, precisava de um assunto para ensinar que fosse novo, atraente para os alunos. Geografia física parecia uma o outro curso, por sua vez, era a antropologia, que, como mostra Werner Stark neste volume, cresceu essencialmente fora das aulas de geografia. Desse modo, a geografia foi muito bem-sucedida, desde que Kant a ensinou com inúmeras revisões ao longo de sua carreira como professor e filósofo. Possivelmente uma razão para sua popularidade foi que, em um sentido muito específico, avançou em uma nova abordagem para a ciência, por exemplo (Reinhardt, 2011: 104).


O posicionamento de Reinhardt parece indicar, num primeiro momento, que como Kant dependia de aulas particulares, ele precisava de um assunto popular e inteiramente novo, para ser popular e fazer com os estudantes se sentissem atraídos por uma nova problemática, e a geografia seria seu alvo. Em seguida, ele parece propor que a antropologia, que se desenvolveu essencialmente dos cursos de geografia seguiu essa mesma onda de popularidade da época, sem demais discussões profícuas a respeito (Cf. Hinske, 1992), o autor discute a que se deve o nascimento das aulas de antropologia. Por último, ele delineia o sucesso da geografia à guisa de um avanço específico para a ciência, isto é, uma abordagem que ele considera totalmente nova. Analisemos então cada uma dessas afirmações de Reihnardt.

No que tange a uma obrigação profissional nos parece ser difícil dizer o contrário, sim, ele precisava de aulas, mas não, sua obrigação profissional não parece ser a única condição sobre o interesse de Kant em relação ao curso. (Ribas, 2009) sustenta justamente isso, pois seria um erro muito grande desprender a geografia dos conteúdos do seu sistema filosófico em relação ao mundo, em face de um compromisso profissional. Existe um comprometimento de Kant com assuntos relacionados a terra, ou melhor, sobre a “superfície da terra” e o curso referido foi uma das formas de tematizar esse assunto. Reinhardt não deixa de fazer menção ao fato de a antropologia ter praticamente nascido dos cursos de antropologia, nos autorizando a compreender que, apesar de geografia ter problemas pertinentes, ele não deixou de ser parte fundamental para o nascimento da antropologia.

Em seguida, é imprescindível mencionar que ele a reconhece, isto é, a geografia, como um avanço científico presente no século XVIII, visto que há uma mudança de perspectiva científica por causa da publicação do Sistema Natural de Linneu (Systema Naturae), publicado em 1735, sendo um fator determinante para que essa mudança de perspectiva pudesse acontecer. Contudo, sua intenção em apontar esse deslocamento científico é, na realidade, para mostrar como o professor de Königsberg não foi influenciado por Lineu, já que como o autor aponta, apesar de Kant usar Lineu como base em sua classificação geográfica, Kant não fez nenhum trabalho de campo, seu único objetivo em ministrar as palestras era permitir a orientação correta dos alunos no mundo (Reinhardt, 2001: 105).

Após as críticas Reihnardt, ele parece reconhecer no final de sua argumentação que a geografia é um dos textos mais longos de Kant sobre a problemática do mundo, e fornece uma base para uma compreensão melhor dele – apesar de seus pontos nevrálgicos. Com esse reconhecimento seria impossível não perceber que apesar de indicar o que existe de problemático na obra, ao mesmo tempo ele reconhece o que ela tem de importante. O autor aponta de boa vontade que sem essa base sólida, não poderia ser desenvolvido outros aspectos importantes da filosofia de Kant. É como se o jovem filósofo partisse sistematicamente para conhecer o máximo possível sobre o mundo físico antes de passar a perguntas mais fundamentais sobre como sabemos o que sabemos. Sem esse pano de fundo, ele não teria sido capaz de escrever seus outros ensaios "científicos" e talvez também os grandes trabalhos filosóficos. É claro que existem erros de fato e, obviamente, Kant entendeu muitas coisas erradas; devemos lembrar, no entanto, que ele também acertou muitas coisas. E parece-me que um deles é que ele estava lançando as bases para um método de investigação na Geografia que o levaria a coisas maiores (Reinhardt, 2011)


Reihnardt entende que Kant errou e acertou em muitas coisas, mas de fato estabeleceu bases sólidas em relação a sua investigação da geográfica o que o levou a coisas grandiosas, ou até maiores que essas citadas, seu interesse não é apenas histórico e tampouco descritivo, é um fôlego de entender o mundo, ordená-lo em procurar seu lugar nele, tento como fio condutor o conhecimento do mundo (Weltkenntniß).


Ter o Conhecimento do Mundo (Weltkenntniß)


Poderíamos nos perguntar por que a geografia é tão crucial para o desenvolvimento das ideias de Kant a respeito da antropologia? A resposta parece estar no que ele diz na Einleitung für die physische Erdbeschreibung, em que Kant no diz que o mundo é o todo, o cenário (Schauplatz) onde nossas experiências acontecem, é a base sobre o qual nosso conhecimento é adquirido e aplicado (Kant, 2012: 04). O mundo se apresenta como o teatro no qual as experiências se desenvolvem, mas não é tão simples assim. Para que essas experiências possam se desenvolver de acordo com um fim, Kant oferece como apoio um duplo sentido de mundo – enquanto objetos dos sentidos, um externo (Natur) e outro interno (Seele) Alma ou o Homem (Mensch). O externo, corresponderá a geographie e o interno a anthropologie, juntas elas constituem o conhecimento do mundo (Weltkenntniß), é com isso que temos de interpretar o mundo, enquanto essas duas descrições (So wie wir indessen einen doppelten Sinn haben, einen äußern und einen innern: so können wir denn auch nach beiden die Welt). É válido ressaltar que a distinção entre sentido externo e sentido interno é entre geografia e antropologia. A distinção que ele faz entre geografia e história nesse trabalho é secundária, pois é uma distinção que

pertence apenas ao sentido externo. Portanto, em relação à geografia, a história é inteiramente a história da natureza. Por outro lado, há uma história, concebida como história moral, que se relaciona à antropologia (May, 1970)


Ora, se o mundo possuí uma dupla interpretação ou forma de considerá-lo, e essa dupla interpretação é assegurada por duas disciplinas distintas, mas que ambas são formas de compreender o homem e o mundo, fazendo com que Kant já anunciasse a antropologia como parte complementar de seu primeiro curso, mesmo que de forma indireta.


É sabido que as experiências da natureza e do homem estão unidas e juntas constituem o conhecimento do mundo (Weltkenntniß), mas para conhecer o mundo é preciso mais do que apenas vê-lo enquanto um agregado de várias experiências que iremos ter. A descrição física da terra é, portanto, a primeira parte do conhecimento do mundo. Pertence a uma ideia que se chama propedêutica do conhecimento para chamar o mundo. O conhecimento, ao que tudo indica, não podem se constituírem como um agregado porque devem ser um sistema, uma vez que o todo precisa estar antes das partes, o que propõe uma certa chave de leitura: a ideia de uma arquitetônica. Ele concorda que essa seria uma condição de todas as ciências, e a ideia arquitetônica no sentido de criar as ciências: para criar uma casa, ele diz, se faz a ideia de um todo e as partes é que são derivadas (Kant, 2012: 158). Sobre a arquitetônica do conhecimento Conceição considera o seguinte que o conhecimento do mundo é concebido como um sistema que conecta os cursos de Antropologia e de Geografia, pois ambos são pensados como lições introdutórias dele, ou seja, como doutrinas introdutórias de um sistema que fazem parte. Isso faz sentido, pois segundo o autor as experiências que nós temos da natureza e do homem constituem juntas o Conhecimento do mundo, a primeira é tematizada pela Geografia e a segunda pela Antropologia (Conceição, 2017).


O Weltkenntniß proposto pelas duas disciplinas está atrelado a uma ideia de preliminar, um exercício, em relação ao sujeito, um exercício que ele próprio precisa fazer. Em outras palavras, estamos inseridos no mundo e podemos conhecer sua constituição enquanto um exercício e um sistema de que fazem parte. Quando esse conhecimento se constituí dessa forma é necessário que ele possa ser expandido, para que o desenvolvimento do homem continue. Nesse caso, esse conhecimento do qual falamos é expandido pelo contato com outras pessoas, ou em palavras mais precisas, pela história (Geschichte) e pela geografia, ambas como ferramenta dessa ampliação. A história, como entendida por Kant, preocupa-se com o jogo do comportamento humano "em geral", e não com ocorrências individuais. O conhecimento deste último, presumivelmente, é o papel do "conhecimento comum". O ensino principal de Kant, no entanto, é que a história, distinta da filosofia da história, é uma disciplina empírica (May, 1970)

A primeira, de acordo com Kant, diz respeito a uma descrição no tempo (Zeit) e a segunda, uma descrição do espaço (Raume). Considerar que o tempo (Zeit) o espaço (Raume) são fatores determinantes parece ser um pequeno retorno à Crítica já que o filósofo determinou essas condições, quando ele tratou da possibilidade do conhecimento. Desse modo, sobre espaço ele nos apresenta que através do sentido externo (uma propriedade de nossa mente) nós nos representamos os objetos como fora de nós, e todos eles no espaço. Aí são determinadas, ou determináveis, sua figura, sua quantidade e sua relação recíproca. O sentido interno, por meio do qual a mente intui a si mesma ou a seu estado interno, não fornece, de fato, nenhuma intuição da alma mesma como um objeto; ele é, no entanto, a única forma determinada sob a qual é possível a intuição do seu estado interno, no sentido de que tudo o que pertence às determinações internas é representado em relações de tempo (Kant, 2006: 37).

Já sobre o tempo ele indica que não se trata de um conceito empírico que tenha sido derivado de alguma experiência. Pois a simultaneidade e a sucessão (Zugleichsein und Aufeinanderfolgen) não se apresentariam à percepção caso a representação do tempo não lhes servisse a priori de fundamento. Somente sob a sua pressuposição se pode representar que algo seja em um mesmo e único tempo (ao mesmo tempo) ou em diferentes tempos (um após o outro) (Kant, 2006: 46).

A intenção de Kant ao nos apresentar os conceitos referidos é nada mais que estabelecer as relações temporais justamente na dimensão fenomênica, essa dimensão fenomênica, por sua vez, tem embasamento na tese da Idealidade Transcendental do tempo, uma vez que sua dimensão temporal permite que os conceitos possam ser inteligíveis. A tese da Idealidade Transcendental nos permite perceber que o espaço (Raume) e o tempo (Zeit) são os conceitos que justificam o fenômeno e a coisa em si: o fenômeno enquanto objetos representacionais e coisa em si (Ding an sich) cujo estado não pode ser determinado por uma intuição pura. A intenção de fazer referência a essas duas importantes passagens está no fato dela nos possibilitar pensar a geographie também em relação à crítica, assegurando sua validade dentro do sistema, e não como algo periférico.

Contudo, no curso de geographie ele não apresenta essas mesmas considerações sobre espaço e tempo, apenas diz que a história (Geschichte) são eventos que ocorrem um após o outro no tempo (Zeit) e a geografia são os fenômenos que acontecem sucessivamente, no espaço (Raume) (Kant, 2012: 161). Primeiro é necessário consideramos o fato de a Crítica ter sido publicado em 1781/87 em suas respectivas edições, e com isso, nos é permitido dizer que as considerações sobre como se dá, qual sua possibilidade extensão do conhecimento já estavam, de certa forma, estabelecidas. Em 1802, quando a edição do curso veio à tona, Kant retornou a sua conhecida concepção de conhecimentos – mais especificamente sobre as condições de possibilidade dele, usando isso como fundamento para tratar da geographie. Em segundo lugar, ao que tudo indica, se Kant não tivesse anunciado que iria ministrar um curso sobre a anthropologie, o exercício preliminar do conhecimento do qual ele mencionou ficaria incompleto, o que fundamenta a necessidade fazê-lo, ou seja, fornecer um curso complementar.


A geographie, portanto, é o instrumento que ele usa para tematizar não só o homem, mas o seu objeto de conhecimento sistemático, porque seu objetivo é esse, conhecer. Com isso, ela é uma disciplina propedêutica do Weltkenntniß e, sendo útil à vida, prepara para o exercício da razão prática (Durmaier, 2014, p. 85). O intuito é fazer com o que o aluno se torne mais preparado para a vida e, de alguma forma, consiga fazer pleno uso dos conhecimentos adquiridos. Por conta disso, é possível interpretar que a geographie emerge de um ângulo de um estudo empírico da natureza, (Sanguin, 1994). Fato que se coaduna perfeitamente com a necessidade de relacionar esse conhecimento através das relações de tempo (Zeit) e espaço (Raume), sugerindo que ambos admitem coisas.


A leitura do curso apresenta ao leitor que as palavras escritas ali fomentam um olhar multifacetado. O curso não apenas é o instrumento do Weltkenntniß, que por sua vez, já é parte complementar da anthropologie, mas também prepara o estudante para vida e permite que ele possa conhecer sua morada, isto é, o teatro de suas experiências. A letra de Kant, a geografia é a propedêutica que visa um conhecimento do homem como ele é, que pode ser encontrado e confirmado posteriormente na Antropologia (Sanguin, 1994). Geografia à guisa da antropologia é um modo de definir o conhecimento que o homem pode ter a respeito do mundo. Ele não só precisa do conhecimento do mundo (Weltkenntniß) ele precisa se tornar também um cidadão do mundo (Weltbürgers).


Entre a geografia e a antropologia: ser um cidadão do mundo (Weltbürgers)

A antropologia foi ensinada no semestre de inverno em Königsberg em 1772/73 com término em 1796. As palestras ministradas por Kant a respeito de sua antropologia, como já citadas anteriormente, formam, segundo sustenta (Jacobs, 2003) “a sua mais popular oferta acadêmica, em termos de atendimento, interesse e acessibilidade”, diferentemente de seus outros escritos, dos quais possuíam uma escrita menos acessível dificultado a compreensão de suas ideias por parte do público externo. A carta a Marcus Herz de 1773, confirma que oferecerá um curso de antropologia, o qual pretendo transformar em uma disciplina acadêmica própria... expor através dela as fontes de todas as ciências, ciências da moral, ou habilidade, do convívio social, dos métodos de educar e governar seres humanos, e assim, de tudo o que pertence ao prático.... Incluo muitas observações da vida comum, de forma que, meus leitores terão muitas oportunidades para comparar sua própria experiência com as minhas considerações e assim, do início ao fim, achar as aulas divertidas e nunca áridas. Em meu tempo livre, estou trabalhando em um exercício preparatório para alunos a partir desse (na minha opinião) muito

prazeroso estudo empírico (Beobachtungslehre) da habilidade, prudência, e até sabedoria que, junto com a geografia física e diferente de toda outra instrução, pode ser chamado de conhecimento do mundo (Kant, 2012: 145-46)


Com o anúncio da antropologia na presente carta percebemos a intenção de Kant de torná-la uma disciplina acadêmica que expusesse as fontes de todas as ciências e, principalmente, dos métodos de governar e educar os seres humanos em sentido pragmático - semelhante com o anúncio do curso referido anteriormente. Nesse sentido, o homem é educado e tem como seu próprio fim os conhecimentos e habilidades que servem para o uso no próprio mundo (Kant, 2007: BA III).

Temos habilidades e conhecimentos que se aplicam no mundo porque o homem é o seu fim, e em vista disso, não temos apenas um tipo de conhecimento sobre o homem, mas dois tipos sendo eles, o fisiológico – do qual é rejeitado veemente por Kant, e o pragmático. Enquanto o primeiro se fundamenta do ponto de vista dos fatos empíricos, voltando para a investigação do que “a natureza faz do homem” o pragmático tem seu progresso construído em torno das ações do sujeito, ou seja, investiga o que “o homem faz de si mesmo” (Kant, 2007: BA IV).


Já se descortina que existem dois polos diferentes sobre o conhecimento a respeito do homem, percebemos que, enquanto o a antropologia fisiológica é movida por causas naturais, das quais modificam o objeto e permitem que ele seja impulsionado, a antropologia pragmática não segue o mesmo caminho. O conhecimento do ponto de vista fisiológico conhece as factualidades empíricas, enquanto o conhecimento pragmático conhece realidades que podem ter efeito sobre as nossas ações (Wilson, 2006, p. 29). Por outro lado, o conhecimento pragmático, Kant aponta que para ampliar a memória ou torná-la ágil, ele utiliza as percepções sobre o que considerou prejudicial ou favorável a ela, e para tanto precisa do conhecimento do ser humano, isso constitui uma parte da antropologia de um ponto de vista pragmático, e precisamente desta nos ocupamos aqui (Kant, 2007: 121-21)

O pragmático indica que o homem precisa ser educado, para que possa se tornar um cidadão do mundo (Weltbürgers), por isso o ensino da antropologia não pode permanecer no campo meramente teórico, porque conhecimentos precisam ser aplicados. Esse conhecimento em sentido pragmático é formado pela geografia física e pela antropologia, e juntas formam o chamado conhecimento de mundo (Kant, 2007: 7-122). Logo, a antropologia em sentido pragmático se constitui enquanto as ações do homem como ser que age livremente, auxiliado pelos meios de determinados conhecimentos, uma vez que ele recebe formação dupla, isto é, na escola e no mundo. Destarte, o sentido da antropologia pragmática é trabalhar com um conhecimento do ser humano, para que ele se torne o cidadão do mundo (sie Erkenntnis des Menschen als Weltbürgers enthält). O aluno precisa conhecer muito bem todas as informações que recebe na escola, precisa pensar criticamente para estar preparado para a aplicação desses saberes no mundo.


A geografia é genuinamente uma descrição de coisas relacionadas a lugares e, certamente, a diferença entre esses lugares. Ela ajuda a ampliar o conhecimento do mundo (Weltkenntniß), é uma propedêutica, que vê seu terreno ser ampliado, posteriormente, pela antropologia. Já ficou expresso que o conhecimento sobre a nossa morada é mais do que essencial, sem ele não saberíamos nos orientar, prosseguir, progredir.

Os dois cursos, quando analisados nos permitem levantar reflexões bastante interessantes a respeito e, sobretudo, percebermos como o homem e o conhecimento representam algo complexo. Sua descrição da natureza não parece estar relacionada somente a pressupostos descritivos, em outras palavras, sem nenhum objetivo claro. Na realidade, Kant tem objetivos claros quanto aos dois cursos, e os descreveu para o bom leitor, que ao averiguar atentamente a geografia e antropologia, percebe como ambos estão relacionados para fundamentar a formação do sujeito, mostrando como sua filosofia pode ser multifacetado.

Conclusão


Ao início do texto levantamos quatro perguntas, sendo elas (1) por qual razão a geografia seria essencial para a antropologia, (2) quais são as implicações do curso no que diz respeito a autenticidade da obra e problemas de tradução que dificultam a compreensão da geografia à letra de Kant, (3) o que Kant traz de novo nesse curso de geografia e como ele está estruturado e (4) qual é a possível relação de curso referido para a antropologia. Como o esperado, não esgotamos pergunta alguma – o que é um bom sinal, apenas podemos considerar pontos importantes, sendo eles, a geografia se não considerada essencial, pode ser olhada como ponto de partida para o desenvolvimento da antropologia, visto que no próprio texto da antropologia há um resgate de um conceito já levantado antes, o de conhecimento de mundo (Weltkenntniß), por exemplo.


Porém, mesmo avançando de uma obra a outra (antropologia e geografia) ainda nos vemos amarrados as pertinentes considerações sobre os problemas de compreensão de geografia, visto que as notas são feitas a partir de anotações de alunos que, na época, eram ouvintes assíduos dessas palestras, e após o compilado dessas notas, como era de se esperar, são difíceis de serem contextualizadas. Todavia, Kant pode não ter inovado ao limite quando o seu novo curso, já que ele não foi o primeiro a lecioná-la, mas com certeza inovou em um ponto significativo, o de trazer para a geografia uma reflexão filosófica, em que o aluno se vê, praticamente obrigado a primeiro, questionar como é sua relação com o mundo em que vive, bem como a natureza e qual o seu papel nela e em segundo, deixar de ser um mero expectador a respeito e fazer algo. Na antropologia isso é desenvolvido com cautela porque a intenção é que o homem faço algo de si mesmo e seja um cidadão do mundo (Weltbürgers), desse modo, talvez não haja uma relação explícita de um curso e outro, mas relação tímida, através de pequenos detalhes deixados pelo autor, em que se nota que objetivos diferentes foram traçados para cada curso, mas que dê certa forma se unem quando é preciso voltar e analisar novamente qual é o papel do sujeito.


Existe um espaço a ser explorado pela geografia, e nossa experiência é expandida através dela, a geografia pode ser vista como um convite, sobre a possibilidade de nos expandirmos, e sermos melhores. Kant em diversas vezes deixou claro o seu objetivo de fazer com a geografia é um conhecimento necessário que ajuda o homem a ser melhor, que ajuda o aluno a ser melhor, o ajuda a pensar com clareza. O autor, ao anunciar seu curso, deixou claro a sua intenção em apontar que os alunos precisam pensar por si mesmo, precisam ampliar seus horizontes, e sobretudo, conhecer sua própria morada. Esse ponto, em específico, para o autor configurava uma defasagem no ensino, da qual ele queria consertar através de palestras que tampassem essa lacuna, oferecendo um conteúdo amplo a respeito. Essa necessidade de querer ampliar os horizontes de seus alunos através do conhecimento é a o resultado de um Kant professor e suas aulas expressavam isso de forma consciente. Ele pretendeu atrair pessoas, aguçando sua curiosidade, tal qual a curiosidade de um viajante que procura saber e conhecer mais.


O lamento de Kant por conta do ensino só se compara a sua vontade de mudá-lo, propondo uma pedagogia criativa, característica de seu gênio criativo. E logicamente, a geografia não pôde fazer tudo sozinha, ela precisou da antropologia como parte complementar de um objetivo que Kant já havia dado início, a antropologia vai continuar esse movimento de auxiliar os alunos a se orientarem para a vida.


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https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.9962


SOBRE EL VALOR DE LA LITERATURA PARA LA ENSEÑANZA DE LA LENGUA

ON THE VALUE OF LITERATURE FOR LANGUAGE TEACHING
SOBRE O VALOR DA LITERATURA PARA O ENSINO DA LÍNGUA

José María Gil
(Universidad Nacional de Mar del Plata – Consejo Nacional de Investigaciones

Científicas y Técnicas)
josemariagil@gilmdq.com


Recibido: 07/11/2019
Aprobado: 09/02/2020

Education is the laboratory in which philosophic distinctions become concrete and tested.

John Dewey (1916: 384)


RESUMEN

La filosofía sirve, entre muchas otras cosas, para fundamentar los objetivos, las metodologías y las decisiones que se toman en educación. En la primera parte del artículo se muestra cómo actúa esta concepción de la “la filosofía como saber fundacional” en los casos de la incidencia de la tarea para el hogar en el rendimiento académico y de la evaluación de la competencia lectora. La segunda parte está dedicada a mostrar que el estudio de los textos literarios puede ser el eje organizador para la enseñanza de la lengua porque favorece enormemente el desarrollo de la competencia lectora y de la competencia comunicativa. El análisis de las dos primeras partes da lugar a una serie de conclusiones en virtud de las cuales podría decidirse qué hacer en la enseñanza de la lengua.


Palabras claves: Filosofía, educación, lengua, lectura, literatura.


ABSTRACT

Philosophy serves, among many other things, to support the objectives, methodologies and decisions taken in education. The first part of the article shows how this conception of “philosophy as foundational knowledge” works in the case of the impact of homework on academic performance and in the case of the evaluation of reading literacy. The second part is dedicated to show that the study of literary texts can be the organizing axis for language teaching, because it greatly favors the development of reading literacy and communicative competence. The analysis of the first two sections gives rise to a series of conclusions by virtue of which it could be possible to decide what to do in language teaching.


Keywords: Philosophy, education, language, reading, literature.

RESUMO


A filosofia serve, entre muitas outras coisas, para apoiar os objetivos, metodologias e decisões tomadas na educação. A primeira parte do artigo mostra como essa concepção de “filosofia como conhecimento fundamental” atua no caso do impacto da lição de casa no desempenho acadêmico e no caso da avaliação da proficiência em leitura. A segunda parte do artigo é dedicada a mostrar que o estudo de textos literários pode ser o eixo organizador do ensino da língua materna, pois favorece muito o desenvolvimento das competências de leitura e de comunicação. A análise das duas primeiras partes dá origem a uma série de conclusões em virtude das quais se pode decidir o que fazer no ensino da língua materna.


Palavras-chave: Filosofia, educação, linguagem, leitura, literatura.


  1. La filosofía como saber fundacional de la educación

    La sociedad y, con ella, la educación, siguen cambiando a ritmo vertiginoso. Por ejemplo, las habilidades de competencia lectora que se consideran hoy indicadores del desarrollo cognitivo y social de una persona, son diferentes de los indicadores de hace quince o veinte años, y es muy probable que tales indicadores y exigencias sigan cambiando rápidamente en el futuro (Britt, Goldman y Rouet, 2013; Klauda y Guthrie, 2015; Leu, 2015; Richter y Dapp, 2014; Schaffner, Philipp y Schiefele, 2016; Schwabe, McElvany y Trendtel, 2015).

    En contextos siempre complejos o cambiantes, la filosofía de la educación permite fundamentar los objetivos que se buscan y las metodologías que se necesitan implementar (Bunn, 2017; Catalano, 2015; Gil, 2018; Goodlad, 1979; Mills, 1972; Ornstein, 1991). De este modo, la filosofía provee fundamento a decisiones que impactan de forma muy concreta en la vida de niños y adolescentes.

    Por ejemplo, la filosofía actúa como saber fundacional de las investigaciones sobre la incidencia de la tarea para el hogar en el rendimiento académico y en la calidad de vida. En este sentido, buena parte de la investigación educativa ofrece bastante evidencia empírica a favor del efecto positivo de la tarea escolar en los resultados académicos (Blazer, 2009; Chang, 2014; Cooper, Robinson y Patall, 2006; Cooper, Steenbergen-Hu y Dent, 2012; Pomerantz, Moorman y Litwack, 2007; Xu, 2013). Así y todo, “cuando este efecto se analiza en detalle aparecen resultados inconsistentes [con esta hipótesis] y, en algunos casos, contradictorios” (Fernández, Suárez y Muñiz, 2015: 1075). En efecto, varios trabajos coordinados por Ulrich Trautwein critican con dureza la metodología misma de las investigaciones que defienden la correlación entre la tarea para el hogar y la mejora del rendimiento académico. Allí se sugiere que muchas de esas investigaciones no se respaldan en un modelo estadístico lo bastante desarrollado como para ofrecer un análisis riguroso de las variables involucradas (Trautwein, 2007; Trautwein y Köller, 2003; Trautwein y Lüdtke, 2007, 2009; Trautwein, 2009).

    Más allá de los necesarios debates metodológicos, muchas investigaciones coinciden en que una cantidad razonable de tarea sí tiene un efecto positivo en el rendimiento escolar. Por ejemplo, a partir de un análisis estadístico, Fernández, Suárez y Muñiz concluyen que en Matemática “alrededor de una hora de tarea diaria parece suficiente para alcanzar resultados satisfactorios” (2015: 1080). Sin embargo, también hay investigaciones que van más allá de una crítica a la metodología estadística, y directamente cuestionan que la tarea para el hogar sea beneficiosa en sí misma. Estas investigaciones se apoyan en evidencia empírica que muestra que la tarea escolar puede causar graves problemas de distinta índole, tales como baja de la autoestima y depresión (Bennett y Kalish, 2006; Kohn, 2006; Samway, 1986), conflictividad familiar (Buell, 2004; Dudley-Marling, 2003; Kralovec, 2000), descuido o abandono de actividades deportivas (Ryba, 2017) y hasta rendimiento escolar insatisfactorio (Barber, 1986; Galloway y Pope, 2013; Hinchey, 1995; Vaterott, 2018).


    Ahora bien, la fundamentación última sobre la cuestión de si dar tarea o no, y cuánta (en el caso de darla) es un problema filosófico con el que deben tratar los educadores. Dicha fundamentación no

    puede estrictamente ser ofrecida por las ciencias empíricas de la educación ni tampoco por las disciplinas que dan sustento epistemológico a las asignaturas escolares, como la matemática, la lingüística, la biología, etc. En efecto, la concepción según la cual es mejor no dar demasiada tarea (o no dar tarea alguna) es de carácter filosófico, porque se cree necesario que los niños deben tener tiempo libre para ser niños. Por otro lado, la concepción según la cual es preferible dar una buena cantidad de tarea, porque por medio de ella se estimula el sentido de la responsabilidad para la vida académica y laboral, también es una concepción filosófica.


    Repasemos entonces esta cuestión. Tal como se ha visto, hay una buena cantidad y variedad de investigaciones cuya evidencia empírica muestra que la tarea para el hogar puede contribuir decididamente a mejorar el rendimiento académico. Pero también hay investigaciones serias cuya evidencia empírica muestra que la tarea escolar puede ocasionar trastornos psicológicos o sociales, algunos de ellos muy serios. Hay incluso investigaciones que cuestionan la idea misma de que la tarea conlleva mejoras en el rendimiento escolar. Esta discordancia no implica que las investigaciones sobre la tarea para el hogar carezcan de rigor metodológico. La falta de acuerdo más bien pone de manifiesto que las investigaciones en educación no manejan “experimentos controlados” en los conocidos términos de Nagel (1968), porque no pueden (ni deberían) ejercer una manipulación de todas las variables involucradas. Para dar ejemplos de trazo grueso, una investigación cuantitativa que correlacione el rendimiento en los exámenes, con la tarea para el hogar, no podrá tener en cuenta el perjuicio causado al tiempo que los niños dedican al juego, a los deportes o simplemente al ocio. Por contrapartida, una investigación cualitativa de los conflictos familiares promovidos por la tarea no podrá tener en cuenta la correlación cuantitativa entre la tarea y el rendimiento en los exámenes. Dicho sea de paso, Nagel sugiere que está más allá de cualquier posibilidad humana, aun en el laboratorio más completo o en el estudio de campo mejor planificado, eliminar completamente las imprevisiones en todas las circunstancias.


    Así las cosas, muchos filósofos y educadores de prestigio han observado que la filosofía no solo es el punto de partida, sino también la base de las decisiones en educación (Dewey, 1916; Goodlad, 1979, 1984; Hopkins, 1941; Smith, Stanley y Shores, 1957; Stenhouse, 1967; Tyler, 1949). De esta forma, la filosofía se constituye en el fundamento de los objetivos, los métodos y los fines de la educación. Siempre convendrá entonces que esa fundamentación sea explícita y sistemática, que acompañe además a las planificaciones, a las propuestas y a las acciones concretas. La alternativa de explicitar los fundamentos parece mejor que reconstruir o inferir las creencias que subyacen a las prácticas educativas. En este sentido, John Dewey ha sugerido que la filosofía puede llegar a definirse como “la teoría general de la educación” y que el principal asunto de la filosofía consiste precisamente en fundamentar los objetivos y los métodos de la educación. Para Dewey, la filosofía permite encontrar, en definitiva, “una formulación explícita de las actitudes cognitivas y éticas que se adoptan ante las dificultades de la vida social” (1916: 383).


    La filosofía, entonces, no es solo el punto de partida para las escuelas, sino también la base sobre la que se erige el currículum. En palabras de Dewey, “la educación es el laboratorio donde se concretan y se evalúan las consideraciones filosóficas” (1916: 384). Dewey se muestra tan convencido de la importancia de la filosofía que la ve como la compañera atenta y ubicua de todo proceso educativo. Según él, la filosofía es necesaria para el desarrollo de las disposiciones fundamentales que nos permiten estar en contacto con la naturaleza y con las demás personas, tanto en el aspecto intelectual como en el emocional. En esta misma línea, Tyler (1949) propone que la filosofía en la que se sustenta un proyecto educativo es la primera pantalla para visualizar el desarrollo social y personal que se está buscando. Así, los intentos de definir qué es una buena educación, qué es una buena vida y qué es una buena sociedad terminan fortaleciendo los valores democráticos en las escuelas. Entonces, según esta concepción de Dewey y Tyler, la filosofía sirve (entre otras cosas) para dar fundamento a la educación, y aun a las ciencias y prácticas sociales en general. Esto es lo que puede denominarse la concepción de “la filosofía como saber fundacional”. Si esta concepción es viable, entonces debería explicitarse una justificación filosófica de cada una de las decisiones tomadas en educación, las cuales por cierto afectan a un gran número de personas.

    Para explicitar esa fundamentación, necesitamos situarnos en un punto de equilibrio que no preste excesiva atención a un aspecto en desmedro del otro, con el que se encuentra en tensión. En efecto, no debe hacerse demasiado énfasis ni en el modelo curricular ni en las demandas de los estudiantes, ni en el desarrollo cognitivo ni en el desarrollo social, ni en la excelencia ni en la equidad. La razón de ello es que una atención excesiva a uno de los aspectos de estas antinomias va a llevarnos al descuido, cuando no al abandono del otro (Ornstein, 1991; Gil, 2018). Lo que necesitamos es una filosofía de la educación prudente, que tenga en cuenta la sustentabilidad política y económica de un proyecto, que sirva a los estudiantes y al resto de la sociedad. En pocas palabras, la filosofía es necesaria y hasta inevitable para fundamentar las decisiones que se toman en educación. Por ello, digámoslo una vez más, la filosofía tiene un carácter de saber fundacional.


    Considérese otro caso en el que se advierte que la filosofía actúa como un saber fundacional de la educación. Una corriente importante de las investigaciones educativas propone la necesidad de evaluar competencias antes que la evaluación de contenidos o temas puntuales. Por ejemplo, desde hace varios años, el programa PISA (Programme for International Student Assessment) de la Organización para la Cooperación y el Desarrollo Económico (OCDE) sostiene que la evaluación de competencias “no pone la atención en que determinados datos o conocimientos hayan sido adquiridos” sino que “busca identificar la existencia de ciertas capacidades, habilidades y aptitudes que, en conjunto, permiten a la persona resolver problemas y situaciones de la vida” (OCDE, 2006: 6). Según este enfoque, en el caso de la competencia lectora no interesa demasiado qué y cuánto leyó una adolescente sino “qué capacidad [tiene] para identificar ideas y argumentos en el texto, qué destreza [tiene] para reconocer problemas y planteamientos distintos” (OCDE, 2006: 7).

    Esta metodología de la evaluación de habilidades admite que los “conocimientos específicos” tienen valor. Sin embargo, entiende que “la aplicación” de esos conocimientos en la vida adulta depende de “la adquisición de conceptos y habilidades más amplios” (OCDE, 2006: 5). Así, por ejemplo, el conocimiento específico de nombres de plantas y animales es menos importante que la comprensión de conceptos más amplios, como el cuidado del medio ambiente, el uso responsable de la energía o el cuidado de la salud. Según el comité de expertos de la OCDE, una persona tiene un buen nivel de competencia lectora si es capaz de entender textos, usarlos, evaluarlos, analizarlos e involucrarse con ellos para así alcanzar sus objetivos, desarrollar su conocimiento y sus condiciones, y participar activamente en la vida social (OCDE, 2019: 28). Numerosas investigaciones ponen de manifiesto la importancia de la competencia lectora en ámbitos muy diversos. Por lo general se acepta que la competencia lectora constituye un requisito imprescindible para el desenvolvimiento exitoso en la mayor parte de las áreas de la vida adulta (Ananiadou y Claro, 2009; Cunningham y Stanovich, 1997; Smith, 2000).


    Ahora bien, la concepción de la lectura y de la competencia lectora han ido cambiando a lo largo del tiempo, porque se relaciona con los cambios en la sociedad, la economía, la cultura y a tecnología. Así, la lectura está lejos de entenderse como una habilidad que se desarrolla sólo durante la niñez y en los primeros años de escolaridad. Más bien, la lectura constituye un complejísimo sistema que no sólo se desarrolla a partir de procesos neurocognitivos y culturales, sino que también puede ir perfeccionándose (o deteriorándose) con el paso del tiempo (Britt, Goldman y Rouet, 2013; Perfetti, 2007; Rayner y Reichle, 2010). Debe consignarse también que las nuevas tecnologías modificaron rápida y profundamente el modo en que las personas leen e intercambian información. Hoy, las personas se ven ante la necesidad de adaptarse a esos cambios para manejar diversas fuentes y aprender con ellas (Leu, 2015).


    Un caso que pone de manifiesto la correlación entre el concepto de competencia lectora y los cambios históricos es la revisión del marco para su evaluación en las pruebas PISA. Así, en las evaluaciones de 2018 se conservan aspectos sustanciales que vienen de los primeros modelos, pero se efectúan modificaciones de alguna importancia. De manera especial, se incorporan tipos de textos que surgieron en los últimos tiempos a partir de los dispositivos electrónicos y de los soportes digitales. Por medio de ello se espera comprender de forma más fehaciente el uso real que hoy se hace de los textos. En efecto,

    la competencia lectora digital se ha hecho preponderante en muy poco tiempo. Hasta mediados de la década de 1990 la mayor parte de la lectura se efectuaba en papel, pero hoy en día la mayor parte de la lectura es digital. En este contexto, la navegación se convierte en un factor clave en la comprensión y la producción de textos.

    Desde luego, la lectura tampoco es un proceso que se despliega en el vacío (Mc Crudden y Schraw, 2007). Muy por el contrario, las actividades de lectura están motivadas por propósitos específicos de la vida diaria (White, Chen y Forsyth, 2010). Recordemos la concepción de las pruebas PISA: una persona que llega a ser una lectora competente entiende los textos con los que se relaciona de forma cotidiana, los evalúa, reflexiona sobre ellos y se involucra con ellos. De esta forma, esa persona alcanzará los objetivos que busca en los textos, desarrollará su conocimiento y participará en la vida social (Britt y Rouet, 2012).

    Ahora bien, una vez que las ciencias de la educación dieron cuenta de la competencia lectora, empieza el trabajo de la filosofía. Dicho trabajo comienza cuando los educadores se preguntan qué es lo que conviene evaluar. Por ejemplo, desde sus orígenes la evaluación PISA “se despega de la mera noción del texto literario” para ocuparse de “una variedad considerable de textos propios de las diferentes circunstancias que puede enfrentar un ciudadano contemporáneo en su vida cotidiana” (OCDE, 2006: 7). Esta clase de evaluación implica de algún modo que los contenidos o temas de las asignaturas dedicadas a la enseñanza de la lengua, son relativamente secundarios para el desarrollo de la competencia lectora. Esta concepción de la evaluación también implica, al menos débilmente, que la memoria no participa de forma activa en la comprensión de textos, y que hasta puede ser contraproducente para el desarrollo de estrategias de lectura eficaces. Una muestra cabal de estas implicaciones es la siguiente reacción ante las pruebas PISA en México, hace ya algunos años:


    [E]l Instituto Nacional de Evaluación de la Educación de México ha señalado el enfoque memorístico, tradicional en la enseñanza nacional, como un factor que debe revisarse, en beneficio de una enseñanza que enfatice más el desarrollo de las capacidades que la retención de información (OCDE, 2006: 28).


    Se sabe bastante de la competencia lectora gracias al trabajo de diferentes disciplinas científicas. Gracias a las neurociencias se conoce cómo se representa y cómo funciona el sistema de la lectura desde su asiento en el área occipito-temporal ventral del hemisferio izquierdo (Dehaene, 2009). Gracias a la psicología cognitiva sabemos que la motivación y la metacognición (la conciencia de la eficacia de las estrategias de lectura utilizadas) favorecen considerablemente la competencia lectora (Waters y Schneider, 2010). También sabemos, gracias al trabajo mancomunado de varias ciencias (entre ellas la antropología social) de qué forma y en qué niveles la lectura digital y la navegación en las redes, han cambiado las relaciones sociales y las expectativas de las personas (Tirado, Backhoff y Larrazolo, 2016).

    Los enunciados referidos a la lectura y la competencia lectora en el marco de las neurociencias, la lingüística, la psicología, la antropología o incluso en el marco de un enfoque interdisciplinario, se contrastan con los datos observables. Así, en los conocidos términos de Popper (1972), los enunciados de las ciencias de la educación son “refutables” en virtud de la evidencia empírica, por ejemplo, a través de estudios de casos, de la observación de conductas, del establecimiento de correlaciones estadísticas pertinentes, etc. Por otro lado, las propuestas acerca del valor de la competencia lectora y de sus consecuencias en la vida personal y social constituyen enunciados filosóficos. Dichos enunciados también deben cumplir varias exigencias, aunque diferentes de las que deben cumplir los enunciados científicos. Para empezar, los enunciados filosóficos que sirven para fundamentar las decisiones en educación no pueden desentenderse de la evidencia empírica ni, mucho menos, pueden ser incompatibles con ella. Además, aunque los enunciados filosóficos no son refutables como lo enunciados científicos, están sujetos a la crítica. Ante un problema de filosofía de la educación se deben plantear y responder preguntas como las siguientes: ¿Se resuelve el problema?, ¿esta concepción resuelve el problema mejor que otra?, ¿o apenas se ha desplazado el problema?, ¿qué ventajas y qué

    desventajas ofrece esta solución? En definitiva, una fundamentación filosófica siempre será evaluable de forma crítica.

    En conclusión, la fundamentación filosófica empieza a trabajar cuando la ciencia ya no puede decirnos nada más. Los valiosos aportes de las investigaciones acerca de la tarea escolar o de la competencia lectora terminan siendo tratados necesaria o inevitablemente por la filosofía para determinar qué decisiones se tomarán en educación.

    En esta primera parte se ha tratado de mostrar de qué manera la filosofía actúa no solo como saber fundacional de las investigaciones en educación, sino también como saber fundacional de las decisiones que se toman para las prácticas educativas reales. Para mostrar esto se han considerado dos casos: (i) la correlación entre la tarea y el rendimiento escolar o la calidad de vida, y (ii) la concepción de la competencia de la lectora en términos de la evaluación PISA. Dentro de esta línea de trabajo, en la segunda parte se buscará hacer una contribución pertinente y acaso novedosa; de manera concreta, se intentará mostrar que la filosofía también actúa como saber fundacional de las decisiones que puedan tomarse en la enseñanza de la lengua.


  2. Fundamentación del valor de la literatura para la enseñanza de la lengua

    En esta sección se fundamenta por qué el estudio de los textos literarios puede ser el eje organizador para la enseñanza de la lengua. De forma concreta, se explicará por qué la comprensión de textos literarios favorece enormemente el desarrollo de la competencia lectora y el desarrollo de la competencia comunicativa en el marco de un currículum de enseñanza de la lengua materna.

    En efecto, si una persona comprende y, mejor aún, si disfruta los textos literarios, será una lectora competente, porque la comprensión de textos literarios involucra procesos cognitivos en virtud de los cuales se pueden entender también otros textos, acaso menos complejos o menos oscuros. Por otro lado, la competencia lectora es una contracara necesaria de la competencia comunicativa (Cazden, 2017). Por ejemplo, cuando una persona da cuenta de la comprensión de un texto que ha leído, lo hace por medio de un texto oral o escrito. Más aún, la lectura no es un proceso pasivo. Ni siquiera es un proceso exclusivamente perceptivo. Constituye en verdad un complejo proceso neurocognitivo en el que intervienen no solo el área de la lectura, en el área occipito-temporal ventral izquierda (Dehaene, 2009), sino también las áreas de comprensión y producción del habla y desde luego las áreas que procesan el significado (Lamb, 2004). Cabe señalar aquí que en nuestro sistema neurocognitivo, la percepción monitorea la producción (Lamb, 2004: 355). Por ejemplo, es manifiesto que una persona no puede escribir correctamente si no está viendo lo que escribe. Por contrapartida, la producción participa en la percepción. Por ejemplo, si una persona lee los verbos lamer, levantar o patear se activan las áreas motoras que rigen el movimiento de la lengua, los dedos y los pies respectivamente (Hauk, Johnsrude y Pulvermüller, 2004).


    A continuación se ofrecerá, entonces, un conjunto de argumentos en apoyo de la tesis según la cual el estudio de textos literarios puede ser el eje organizador de la enseñanza de la lengua porque favorece de manera decisiva el desarrollo de la competencia lectora y, con ella, el desarrollo de la competencia comunicativa. La exposición de los argumentos va siendo cada vez más corta en general. La brevedad creciente de los argumentos nuevos se debe a que tratan de apoyarse en los anteriores, especialmente en el primero.


    1. Los textos literarios permiten entender la multiplicidad y la complejidad de los significados.


      A nivel léxico, la polisemia es un fenómeno relativamente sencillo. Desde los estudios fundacionales de Ferdinand de Saussure y Louis Hjelmslev puede entenderse que el sistema lingüístico de una persona es una red de relaciones (Gil, 2016). En las estructuras de esa red, la polisemia es la conexión

      de un nodo léxico con un más de un nodo conceptual. Así, la Figura 1 muestra que el nodo léxico correspondiente a gato se conecta de forma ascendente con los nodos conceptuales correspondientes a FELINO DOMÉSTICO, ARTEFACTO HIDRÁULICO, PELUCA, y varios más.



      image



      Figura 1. Polisemia y sinonimia en torno a la expresión gato.


      La Figura 1 también da cuenta de la sinonimia, la cual, en términos relacionales, puede entenderse como la conexión descendente entre un nodo conceptual y varios nodos léxicos. En el caso de un hispanohablante, el significado correspondiente a FELINO DOMÉSTICO puede verbalizarse como gato, morrongo, micho, minino. Resulta evidente entonces que una simple expresión puede evocar más de un significado. Eso le permite a Francisco de Quevedo jugar deliberadamente con la ambigüedad de la expresión gatos.


      Por importar en los tratos y dar tan buenos consejos, en las casas de los viejos gatos le guardan de gatos y pues él rompe recatos

      y ablanda al juez más severo, Poderoso Caballero es don Dinero.


      Tal como aparece en la Figura 1, la expresión gato puede usarse para evocar los significados correspondientes a LADRÓN o BOLSA. Por medio de este juego de palabras, basado en una repetición, Quevedo logra evocar otra de las paradojas, las contradicciones o las incomodidades que causa el fervor por el dinero.


      En la misma letrilla satírica Quevedo propone un juego de palabras en el que se explota no solo la ambigüedad sino también la antonimia. Así se comportan a veces las personas a causa del dinero:

      ... a las caras de un doblón hacen sus caras baratas


      La Figura 2 representa las conexiones léxicas y conceptuales que se activan al interpretar este juego de palabras. La expresión caras evoca varios significados, entre ellos ALTO COSTO y ROSTRO. A su vez, la expresión caras es antónimo de baratas. En la red, son nodos opuestos que se inhiben mutuamente (como lo indican los círculos pequeños). Sin embargo, en este caso, se reconectan de modo novedoso y permiten establecer asociaciones con las características de las personas que se rebajan ante el dinero.

      image


      Figura 2. Explotación de la ambigüedad de caras y de la antonimia caras-baratas.


      Dado que los textos literarios involucran un alto nivel de polisemia, su estudio permite advertir que no existe algo así como “el” significado de las palabras. Lo que ocurre en verdad es que las palabras evocan significados. Por otra parte, y en un sentido similar, el significado de un texto no se reduce al reconocimiento de la intención del comunicador. Como sugiere el creador de la teoría de redes relacionales, Sydney Lamb, “no hay una cosa tal como el significado de un texto sin un intérprete de ese texto”. Lo que ocurre es que “los elementos del texto activan significados en las mentes de los intérpretes” (Lamb, 2004: 296). Dicho de otro modo, la literatura nos pone en contacto con significados que trascienden el significado intencional. Sobre ello se reflexiona en el cuento “Pierre Menard, autor del Quijote”, de Borges. En un momento el narrador compara el Quijote Cervantes con el de Menard. Así, por ejemplo, Cervantes escribe lo siguiente:


      ...la verdad, cuya madre es la historia, émula del tiempo, depósito de las acciones, testigo de lo pasado, ejemplo y aviso de lo presente, advertencia de lo por venir.


      Escrito por Cervantes, este pasaje es apenas la repetición de un lugar común sobre lo que se creía de la ciencia histórica en el siglo XVII. Menard, “en cambio”, escribe esto:

      ...la verdad, cuya madre es la historia, émula del tiempo, depósito de las acciones, testigo de lo pasado, ejemplo y aviso de lo presente, advertencia de lo por venir.


      Según el narrador, Menard propone (a diferencia de Cervantes) una observación agudísima, porque “la verdad histórica, para él, no es lo que sucedió; es lo que juzgamos que sucedió” (Borges, 1974: 449). Lo que sugiere Borges por medio de este análisis manifiestamente ficticio es que el significado de un texto está en la lectura. Cada lector del Quijote es un (nuevo) autor del Quijote.


    2. Los textos literarios fomentan la amplitud de registros lingüísticos.

      El estudio de los textos literarios puede facilitar que las personas se vuelvan competentes en registros diferentes de aquellos en los que ya son competentes, antes de o fuera de la escuela. En efecto, un registro es una variedad de lengua según el tipo de situación y los recursos lingüísticos utilizados por una persona varían según el registro en el que está involucrada esa persona. En pocas palabras, un registro es la variedad de lengua según el tipo de situación (Biber y Conrad, 2019). Un intercambio de comentarios a partir de una foto de Instagram, una conversación en una plaza, una exposición sobre un capítulo de Cien años de soledad, son ejemplos concretos de interacciones comunicativas que corresponden a registros muy distintos.

      Por lo general, los estudiantes son comunicativamente competentes antes de la escuela y fuera de la escuela, en los registros vinculados a su socialización cotidiana. Por ejemplo, no es necesario que se les enseñe a los adolescentes a escribir mensajes por teléfono móvil para arreglar encuentros con sus amistades. Una persona aprende los recursos lingüísticos del registro de la comunicación escrita informal a partir de las interacciones en las que participa día a día. En cambio, los recursos lingüísticos de registros formales (en los cuales se hace referencia a asuntos científicos, tecnológicos, educativos, artísticos) se aprenden fundamentalmente en la escuela. En efecto, el desarrollo de la competencia lectora y de la competencia comunicativa en estos registros muy difícilmente pueda darse sin la intervención de la escuela. Por su heterogeneidad y por su complejidad, los textos literarios enfrentan a los estudiantes a una variedad de recursos lingüísticos gracias a los cuales podrán ampliar los registros en los que serán competentes.


    3. Los textos literarios ponen en evidencia la complejidad del lenguaje natural.


      En el ensayo “Nuestro pobre individualismo” Borges expone lo siguiente:


      El más urgente de los problemas de nuestra época (ya denunciado con profética lucidez por el casi olvidado Spencer) es la gradual intromisión del Estado en los actos del individuo; en la lucha con ese mal, cuyos nombres son comunismo y nazismo, el individualismo argentino, acaso inútil o perjudicial hasta ahora, encontrará justificación y deberes (Borges, 1974: 659).


      El pasaje, de poco más de 50 palabras, expone un razonamiento deductivo que, en una de sus interpretaciones plausibles, puede simplificarse con la siguiente paráfrasis:

      1. El individualismo argentino es una exaltación del individuo (que desconoce la importancia del estado).

      2. Una exaltación del individuo constituye un freno a los sistemas totalitarios (como el comunismo o el nazismo, sistemas que destruyen al individuo).

      3. Por lo tanto, el individualismo argentino es un freno a los sistemas totalitarios.

        La paráfrasis puede resultar menos atractiva, pero también más accesible que el texto original. De hecho, analizar los razonamientos en lenguaje natural es mucho más complejo que hacerlo en un lenguaje simbólico artificial, una vez que se tienen el entrenamiento necesario gracias a la lógica (Copi, 1995: 279-280). Ahora bien, la comprensión de textos literarios nos enfrenta a la polisemia y a la vaguedad, a las complejidades de nuestro sistema lingüístico y, con ello, a las de nuestro sistema mental. Quien se adentra en la literatura se adentra en los textos más complejos y entrevé, con ellos, nuestra propia complejidad. Si nuestro lenguaje y nuestro sistema de pensamiento fueran fáciles de entender, nosotros seríamos demasiado simples.


    4. Los textos literarios nos hacen conscientes del valor de la metáfora

      Las metáforas no son ajenas a las conversaciones en cafés, plazas, estaciones, mercados, canchas de fútbol. En esas conversaciones se usan por lo común expresiones que se refieren a otra cosa por medio de una trasposición por analogía. De hecho, las lenguas occidentales registran frases hechas que comparan el tiempo con el dinero o con objetos materialmente valiosos:

      el tiempo es oro time is money

      il tempo è denaro

      le temps, c'est de l'argent Zeit ist Geld

      tempo é dinheiro χρόνος είναι χρήμα время – деньги

      El tiempo, aquello de lo que estamos hechos, aquello cuyo paso nos va acercando al final tan sabido, se compara con un bien material. De manera diferente, en “Nueva refutación del tiempo”, Borges lo compara con un río, con un tigre y con un fuego: “El tiempo es la sustancia de que estoy hecho. El tiempo es un río que me arrebata, pero yo soy el río; es un tigre que me destroza, pero yo soy el tigre; es un fuego que me consume, pero yo soy el fuego” (Borges, 1974: 771).


      En el uso cotidiano, otra vez, resulta común afirmar que hay buenas formas de “invertir el tiempo y aunque al tiempo se lo puede “ahorrar”, “prestar”, “robar”, “perder”, “ganar”, etc. Como han sugerido Lakoff y Johnson (1980) la metáfora que equipara al tiempo con el dinero es una relación conceptual que aprendemos con el lenguaje. Diferente sería nuestra cultura si se concibiera al tiempo en los términos de Borges, como un río que nos arrebata. Lo cierto es que la conciencia de la metáfora favorece nuestra capacidad de comprensión, que recorre los senderos que van y vienen de las metáforas de los textos literarios a las metáforas de la vida cotidiana.


    5. Los textos literarios nos hacen conscientes de la creatividad lingüística

      Chomsky y los lingüistas de la tradición generativista han expresado su “deslumbramiento” por la capacidad de formar oraciones nuevas a partir de unas pocas instrucciones sintácticas (Pinker, 1994: 126). Ahora bien, aquellos que se maravillan ante nuestra habilidad para producir una nueva oración que jamás habíamos escuchado o emitido antes, también deberían quedar fascinados con nuestra capacidad de elegir flan en lugar de ensalada de fruta para el postre. La creatividad lingüística real es un fenómeno mucho más complejo que la generación de estructuras sintácticas (supuestamente nuevas). De hecho, la creatividad lingüística se pone de manifiesto en todos los niveles lingüísticos, particularmente en el nivel del significado, y no solo en la sintaxis, como creen Chomsky, Pinker y muchos otros. Un chiste inocente basado en un juego de palabras ya permite reconocer la creatividad lingüística. Por ejemplo, para un jugador de rugby que se desempeña el esforzado puesto de segunda línea se dice que el casco puede ser funda mental. La Figura 3 muestra algunas de las conexiones fonológicas, léxicas y conceptuales en el sistema de un hablante-oyente real que comprende el chiste.


      image

       


      Figura 3: Chiste basado en un juego de palabras. El casco de un jugador de rugby es funda-mental.


      La Figura 3 muestra cómo se interpreta que el casco es necesario (fundamental) y al mismo tiempo una protección (funda) de la cabeza, la mente, el cerebro (mental) del jugador de rugby. Obsérvese la importancia que tienen las sílabas, para las cuales hay nodos en el nivel fonológico. Ciertamente, el estudio de textos literarios es propicio para entender y desarrollar la creatividad lingüística. De hecho, la comprensión del chiste representada en la Figura 3 sirve también para mostrar que la función poética y la creatividad no son extrañas al uso cotidiano del lenguaje.

    6. En los textos literarios se da la equivalencia entre el eje de la selección y el eje de la combinación

      Las Figuras 1, 2 y 3 son redes relacionales que también sirven para entender la función poética del lenguaje, que “proyecta el principio de equivalencia del eje de selección al eje de combinación. La equivalencia pasa a ser un recurso constitutivo de la secuencia” (Jakobson, 1960: 360).


      El eje de la selección (el paradigma) se representa por medio de nodos “O”, graficados con corchetes, desde los cuales parten las conexiones que se pueden elegir. Se elige una conexión o se elige otra. En la Figura 3, por ejemplo, se muestra que el nodo para la sílaba /fun/ tiene conexión con los nodos para funda y fundamental, entre muchos otros. Por su parte, el eje de la combinación (el sintagma) se representa por medio nodos “Y”, graficados con triángulos. Todas las conexiones que parten de los triángulos se activan porque debe formarse una secuencia.

      El predominio de la función poética en un texto se explica por el hecho de que cada sílaba, cada palabra, cada concepto que de hecho se ha elegido, promueve asociaciones muy fuertes con lo que no se ha elegido en la secuencia. Por ello lo que se eligió y lo que no se eligió son igualmente importantes. De eso se trata la equivalencia entre la selección y la combinación en los textos literarios.


    7. Los textos literarios permiten entender la coexistencia de macroestructuras textuales


      Ya se ha dicho que no existe el significado del texto independientemente de la lectura. Lo que en verdad ocurre es que ciertos elementos del texto evocan significados en las mentes de los lectores. Un aspecto fundamental del significado es la coherencia global, es decir, el significado del texto “como un todo” (Van Dijk, 2019). Como los significados globales también se definen en la interpretación, es posible por ejemplo interpretar un texto como una narración y (o) como una argumentación. Así, el Esquema 1 muestra que El Gaucho Martín Fierro (1872), de José Hernández, puede leerse como una historia o una narración, mientras que el Esquema 2 explica cómo esa obra también puede interpretarse como una argumentación.


      Esquema 1: El Gaucho Martín Fierro, significado global como narración.



      Marco: El gaucho Martín Fierro, padre de familia honrado y trabajador, es reclutado para ir a la frontera, adonde sufrirá humillaciones y tortura.

      Desarrollo: Después de huir, no encuentra a su familia, por lo cual se entrega al alcohol y a la violencia, y mata a dos hombres.

      Conclusión: Perseguido por desertor y “gaucho malo”, se hace amigo de Cruz, y luego escapa con él a la tierra de indios.


      Marco: El gaucho Martín Fierro, padre de familia honrado y trabajador, es reclutado para ir a la frontera, adonde sufrirá humillaciones y tortura.

      Desarrollo: Después de huir, no encuentra a su familia, por lo cual se entrega al alcohol y a la violencia, y mata a dos hombres.

      Conclusión: Perseguido por desertor y “gaucho malo”, se hace amigo de Cruz, y luego escapa con él a la tierra de indios.


      Esquema 2: El Gaucho Martín Fierro, significado global como argumentación.



      Conclusión o tesis: La opresión por parte del estado es horrible, destruye a las personas.

      Fundamento: Significado global de la narración (todo lo que le ocurrió a Martín Fierro). Fue arrancado de su familia para servir al ejército. Lo humillaron y lo torturaron. Tuvo que escapar y ya no volvió a ver a su familia. Terminó reaccionando con violencia y se convirtió en desertor y asesino.

      Legitimidad (refuerzo o garantía del fundamento): Las personas quieren vivir libres y felices. Garantizar la libertad de las personas y generar condiciones para su felicidad deberían ser funciones del estado.


      Conclusión o tesis: La opresión por parte del estado es horrible, destruye a las personas.

      Fundamento: Significado global de la narración (todo lo que le ocurrió a Martín Fierro). Fue arrancado de su familia para servir al ejército. Lo humillaron y lo torturaron. Tuvo que escapar y ya no volvió a ver a su familia. Terminó reaccionando con violencia y se convirtió en desertor y asesino.

      Legitimidad (refuerzo o garantía del fundamento): Las personas quieren vivir libres y felices. Garantizar la libertad de las personas y generar condiciones para su felicidad deberían ser funciones del estado.

      En conclusión, la multiplicidad y variedad de significados no se reducen a los pasajes del texto literario o a textos breves, sino que también se ponen de manifiesto en el nivel global, es decir, en el significado del texto como un todo. Resulta claro entonces que los textos literarios ayudan a comprender la coexistencia de “macroestructuras textuales” (Van Dijk, 2019). Por ejemplo, una fábula puede leerse como narración o como argumentación, y aun como descripción y como diálogo. La posibilidad de reconocer esta multiplicidad es inherente al trato con los textos literarios y favorecerá el desarrollo de la competencia lectora y de la competencia comunicativa.


    8. Los textos literarios promueven la autonomía y el espíritu crítico

      La literatura nos predispone a ser intérpretes atentos y críticos. Tal como se sugiere en Pierre Menard, autor del Quijote”, el texto literario se orienta poderosamente a la figura del lector, de cuya interpretación depende el significado del texto. De esta manera, el desarrollo de la competencia lectora promueve claramente la autonomía y el espíritu crítico. Y como sugiere Manuel Comesaña, el espíritu crítico resulta útil por ejemplo para cuestionar supuestos dogmáticos que se presentan como certezas o verdades reveladas, por ejemplo, las certezas políticas o religiosas. El espíritu crítico será bueno en sí mismo, aunque más no sea porque siempre se estigmatiza, se persigue y hasta se asesina en nombre de certezas, nunca en nombre de dudas” (Comesaña, 2011: 18).


    9. Los textos literarios permiten llegar a experimentar el placer de la lectura

      Gracias a los textos literarios los niños y los adolescentes pueden llegar a experimentar el placer de la lectura por la lectura en sí, el placer del texto”, para usar las conocidas palabras de Barthes. Debe reconocerse que el placer del texto es de algún modo intransferible, pero si un estudiante llega a experimentarlo habrá ido bastante más allá de la competencia lectora.

      El difícil problema de cómo llegar a un punto de equilibrio entre las obligaciones curriculares y el placer del texto es motivo de otro trabajo. Sin embargo, vale la pena consignar que en algún momento tiene que aparecer la exigencia o el desafío para leer. Para la gran mayoría de los niños y los adolescentes, la escuela será la principal o muy posiblemente la única instancia en la que puedan involucrarse de forma directa y sistemática con la literatura. Si no se los enfrenta al bello desafío de los textos literarios, será muy posible que pasen por la escuela y por la vida sin llegar siquiera a considerar si la literatura les gusta, o no.


    10. Los textos literarios permiten ir armoniosamente de lo más complejo a lo menos complejo

      En definitiva, los textos literarios permiten transitar un sendero académico en el que se va de textos complejos, a veces artificiosos y aun oscuros, a los textos en los que se busca la claridad referencial. Dicho de otro modo, el estudio de los textos literarios permite ir de los textos en los que predomina la función poética a aquellos en los que predomina la función referencial. Debe consignarse aquí que los textos en los que predomina la función referencial se tratarán en otras asignaturas. Por su parte, si los textos en los que predomina la función poética no se tratan en la enseñanza de la lengua, ¿dónde y cuándo se lo hará?


  3. Conclusiones

El objetivo del análisis filosófico de este trabajo ha sido fundamentar por qué el estudio de los textos literarios puede ser el eje organizador para la enseñanza de la lengua. De ese análisis se desprenden las siguientes conclusiones.


  1. La literatura en efecto promueve poderosamente el desarrollo de la competencia lectora y de la competencia comunicativa.

  2. El aprendizaje de la lengua, las estructuras lingüísticas, el significado y el uso de la lengua son o aspectos de un mismo y vasto fenómeno. La Figura 4 ofrece un esquema en ese sentido. A lo largo de toda nuestra vida, aprendemos y usamos la lengua, y también construimos y comprendemos estructuras lingüísticas en las que se evocan significados.







    Figura 4. Interrelaciones entre los aspectos a considerar en la enseñanza de la lengua.


  3. Como se ha dicho, la competencia lectora y, por contrapartida, la competencia comunicativa se pueden desarrollar en buena medida gracias al estudio de textos literarios. No parece verdad que el desarrollo de las competencias vaya por un lado y el estudio de los temas de una asignatura vayan por otro. No hay entonces una oposición irreductible entre las habilidades y los contenidos, simplemente porque no parece posible que la competencia lectora y la competencia comunicativa se desarrollen en un vacío de contenidos.

  4. También es una falsa oposición la que se plantea a veces entre las habilidades y la memoria, como si únicamente las primeras fueran indicadoras de inteligencia. La memoria lingüística y conceptual puede entenderse como la representación de las estructuras gracias a las cuales podemos entender y producir textos. En otras palabras, el desarrollo de la competencia lectora y el desarrollo de la competencia comunicativa resultan posible también gracias a la memoria, no sin ella o en contra de ella.

  5. El objetivo de una enseñanza de la lengua que se sostenga en el estudio de los textos literarios no es el de formar una sociedad de autores literarios. El objetivo es formar lectores y hablantes competentes en todas las funciones del lenguaje.

  6. El estudio de los textos literarios implica la comprensión de los textos en los que predomina la función referencial, pero no a la inversa. Por ejemplo, la comprensión de textos informativos no implica la comprensión de textos literarios.

  7. Deberá haber una relación coherente entre los textos literarios y el estudio del sistema lingüístico. El desarrollo de la competencia lectora y de la competencia comunicativa no tiene que prescindir del estudio sistemático de la normativa y de la léxico-gramática. Habrá por ello un continuo con los temas de lengua. El desarrollo de la competencia lectora y de la competencia escritora se va nutriendo del estudio sistemático de la léxico-gramática, fonología, la teoría del significado y aun de la normativa.

  8. Habrá también que justificar en cada caso las obras literarias a enseñar. Pero, al igual que lo requerido en la propuesta del punto 7, ello será asunto de otro trabajo.


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https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.10410


REALIDADE, LINGUAGEM E BELEZA SEGUNDO WERNER HEISENBERG

REALIDAD, LENGUAGE Y BELLEZA SEGÚN WERNER HEISENBERG
REALITY, LANGUAGE AND BEAURY ACCORDING TO WERNER HEISENBERG


Antonio Augusto Passos Videira

(Universidade do Estado do Rio Janeiro)

guto@cbpf.br


Carlos Fils Puig
(Independiente) cfpuig@gmail.com


Recibido: 09/03/2020
Aprobado: 04/05/2020


RESUMO


Neste artigo, apresentamos uma análise das noções de beleza e verdade segundo o pensamento desenvolvido pelo físico alemão Werner Heisenberg (1901-1976). Essa análise é realizada de modo a ressaltar os fortes vínculos constitutivos entre ambas as noções.

Palavras-chave: Werner Heisenberg. Beleza. Verdade. Filosofia da ciência. História da ciência.


RESUMEN


En este artículo, presentamos un análisis de las nociones de belleza y de verdad según el pensamiento desarrollado por el físico alemán Werner Heisenberg (1901-1976). Ese análisis fue echo de modo a subrayar los fuertes vínculos constitutivos entre las dos nociones.


Palabras clave: Werner Heisenberg. Belleza. Verdad. Filosofía de la ciencia. Historia de la ciencia.


ABSTRACT

In this article we present an analysis of the notions of beauty and truth according to the thought developed by the German physician Werner Heisenberg (1901-1976). This analysis is done in such a way as to highlight the strong constitutive bonds between those two notions.


Keywords: Werner Heisenberg. Beauty. Truth. Philosophy of Science. History of Science.

Introdução


Recentemente, o físico teórico italiano Carlo Rovelli, autor de livros destinados ao grande público, escreveu um artigo, publicado em um periódico de física, afirmando que a filosofia é importante e útil para a física (Rovelli, 2018). Contrapondo-se à opinião de autoridades como Steven Weinberg, Stephen Hawking e Neil de Grasse Tyson, Rovelli defende que a física, a bem da verdade, precisa de filosofia. Em um jogo em que o peso das autoridades é relevante, uma vez que argumentos ou resultados empíricos não são capazes de mudar as posições contrárias, o cientista italiano recorre a nomes consagrados para afirmar:


Thus, if we read what the greatest scientists had to say about the usefulness of philosophy, physicists like Heisenberg, Schrödinger, Bohr, and Einstein, we find that they expressed totally opposite opinions to those of Hawking and Weinberg (Rovelli 2018, p. 482. Itálicos nossos).


Nada do que se encontra acima é novo para aqueles que se interessam pela relação entre filosofia e ciência. A relação entre as duas é importante a ponto de se poder considerar a filosofia como contribuindo para a existência da ciência natural. Sem a presença de um elemento não científico, a ciência simplesmente não existiria, nas palavras de Einstein (1981, p. 13), “O espírito científico, fortemente armado com seu método, não existe sem a religiosidade cósmica.” A natureza desse elemento não científico pode ser – e de fato é – objeto de discussões e controvérsias (Videira, 2013). Recorrendo ao exemplo que será trabalhado no presente artigo, o físico teórico alemão Werner Heisenberg, argumentaremos em favor da seguinte tese: esse elemento não científico possui uma natureza complexa, já que é metafísico, epistemológico e estético. Metafísico porque diz respeito à realidade, epistemológico porque concerne à linguagem donde a conceitos e, finalmente, estético porque a beleza também se faz presente devido à sua capacidade de servir como meio para a exibição da verdade. Uma das questões mais relevantes para a discussão aqui encetada é saber em que medida os três elementos estão sempre unidos ou se podem aparecer em separado.

Reconhecendo a necessidade de oferecer um esclarecimento a respeito daquilo que nós estamos tomando como metafísica, pensamos que esta última é fundamentalmente a definição, ou a caracterização – o que não é o mesmo que definição – do próprio objeto de estudo da ciência natural: a realidade (ou natureza, mundo externo, universo, entre tantos outros termos semelhantes) (Rovelli, 2018). Em outros termos, metafísica diz respeito à natureza do próprio objeto de estudo da ciência. Esta natureza é tripla. Ela se refere à natureza externa ao homem, refere-se também à natureza do próprio homem e, finalmente, refere-se à natureza da ciência. A ciência interessa-se pelos dois tipos de natureza, o que acaba por provocar o aparecimento de dificuldades metodológicas, epistemológicas e científicas, principalmente devido ao fato de que as duas naturezas estão vinculadas entre si. O homem integra a natureza, gerando implicações ainda hoje desconhecidas, seja para a ciência, seja para a filosofia.


Heisenberg, realidade e linguagem

Heisenberg era incrédulo com relação à possibilidade de a ciência dispensar a filosofia. Não nos parece equivocado afirmar que uma das suas metas, ao redigir os seus textos filosóficos, seria convencer os seus colegas de que deveriam aceitar a presença da filosofia. Uma boa ciência começaria pelo reconhecimento da presença ativa da filosofia. Os cientistas não deveriam se declarar neutros em filosofia. Ao contrário, deveriam optar por uma escola, ou doutrina, filosófica, ainda que tal opção pudesse mudar com o passar do tempo. No caso do físico alemão, a sua decisão foi opor-se ao materialismo científico, uma perspectiva filosófica, segundo o próprio Heisenberg, criada ao longo do século XIX. Para Heisenberg, o materialismo, ao menos enquanto ontologia, era uma ilusão: “Die Ontologie des Materialismus beruhte auf der Illusion, dass man die Art der Existenz, das unmittelbar Faktische der uns umgebenden Welt, auf die Verhältnisse im atomaren

Bereich extrapolieren könne. Aber diese Extrapolation ist unmöglich.” (Heisenberg apud Krüger, 1970)14

Ao recorrermos ao exemplo de Heisenberg para discorrer em favor das vinculações entre ciência e filosofia, não alimentamos a pretensão de expor alguma tese nova ou desconhecida. Estamos convencidos de que não é mais possível querer contribuir com nenhuma novidade em um assunto há tanto tempo discutido como este.

Gregor Schiemann (2009), um intérprete contemporâneo de Heisenberg, descreve com as seguintes palavras a relação de Heisenberg com a filosofia:

Heisenberg war nicht nur handelnder, sondern auch reflektierender Naturforscher. Die Formen, in denen Heisenberg seine Überlegungen und Gedanken ausarbeitete, sofern sie sich nicht auf fachwissenschaftliche Probleme beschränkten, waren vor allem Vorträge und öffentliche Reden. Die grundsätzlichen Elemente seines Denkens blieben im wesentlichen dieselben, angefangen von den frühen Vorträgen in den 1930er Jahren bis zu den späten der 1970er Jahre, auch wenn die Texte natürlich jeweils historisch zeitgebunden waren und in Einzelheiten von konkreten Anlässen abhingen. Heisenberg war davon überzeugt, dass dem physikalischen Wissen eine außerordentliche Bedeutung für das Verständnis der Welt und die Gestaltung des modernen Lebens zukomme. (…) Die philosophische Relevanz der Atomphysik sah Heisenberg darin, dass zum ersten Mal in der Geschichte der Naturwissenschaft deren eigene Erkenntnisgrenzen empirisch nachgewiesen worden seien. In seinem Denken nahm die Diskussion dieser Grenze und die Rolle des nichtphysikalischen Wissens eine zentrale Stellung ein. Er entwarf ein wissenschaftliches Weltbild, das die gesamte Wirklichkeit in einer plural verfassten und historisch veränderlichen Struktur zu ordnen suchte (Schiemann, 2009)15.


Da longa citação acima, gostaríamos de chamar a atenção para a concepção de realidade de Heisenberg; ela seria plural ou múltipla. Plural por ser composta de diferentes níveis, ou camadas, mas também por ela ser condicionada pelo tempo. Duas consequências podem ser extraídas desta noção de realidade plural e múltipla, A primeira diz respeito ao fato de que o conhecimento acerca da realidade se transforma com o avanço da ciência. E a segunda afirma que não há filosofia capaz de apreender, de modo global, completo e coerente, seja a realidade, seja o conhecimento humano sobre ela.


A realidade estudada pela ciência corresponde a uma parte desta mesma totalidade. É um erro acreditar que as verdades da ciência correspondem à realidade como se esta última fosse tal e qual aquilo que é afirmado pelas leis, teorias e modelos científicos. Não apenas a ciência é menor do que a totalidade – tudo aquilo que pode ser produzido pelos seres humanos: arte, filosofia, religião, etc será sempre menor do que a totalidade, mas ela (a ciência) é menor do que até mesmo a realidade natural. Aquilo que chamamos de realidade corresponde ao que resulta da interação que mantemos com o mundo externo e não apenas através dos nossos sentidos.

Uma das características dos escritos filosóficos de Heisenberg é a repetição de temas e teses que foi mais evidente a partir do final da Segunda Guerra Mundial, quando o ele foi levado a apresentar sua concepção de ciência. Como não poderia deixar de ser, Heisenberg discorria sobre a noção de realidade, a qual para ele, poderia ser caracterizada como sendo:


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14 “A ontologia do materialismo baseava-se na ilusão de que o tipo de existência, a natureza diretamente factual do mundo ao nosso redor, poderia ser extrapolado para o reino atômico. Mas essa extrapolação é impossível” (apud Krüger, 1970, tradução nossa).

15 Heisenberg não era apenas um cientista natutal atuante, mas também um que refletia. As formas em que Heisenberg elaborou seus pensamentos e pensamentos, na medida em que se limitassem a problemas científicos, eram principalmente palestras e discursos públicos. Os elementos básicos de seu pensamento permaneceram essencialmente os mesmos, desde as primeiras palestras na década de 1930 até o final da década de 1970, mesmo que os textos fossem, naturalmente, historicamente limitados no tempo e dependessem em detalhes de ocasiões específicas. Heisenberg estava convencido de que o conhecimento físico era extremamente importante para entender o mundo e moldar a vida moderna. (...) Heisenberg viu a relevância filosófica da física atômica no fato de que, pela primeira vez na história das ciências naturais, os seus próprios limites de conhecimento haviam sido empiricamente comprovados. A discussão desse limite e o papel do conhecimento não-físico tiveram um papel central em seu pensamento. Ele projetou uma visão científica do mundo que buscava organizar toda a realidade em uma estrutura plural e historicamente mutável.” (Schiemann, G., 2009, Tradução nossa)

Die Wirklichkeit, von der wir sprechen können, ist nie die Wirklichkeit an sich, sondern eine gewusste Wirklichkeit oder sogar in vielen Fällen eine von uns gestaltete Wirklichkeit. Wenn gegen diese letztere Formulierung eingewandt wird, dass es schließlich doch eine objektive, von uns und unserem Denken völlig unabhängige Welt gebe, die ohne unser Zutun abläuft oder ablaufen kann und die wir eigentlich mit der Forschung meinen, so muss diesem zunächst so einleuchtendem Einwand entgegengehalten werden, dass schon das Wort ‘es gibt’ aus der menschlichen Sprache stammt und daher nicht gut etwas bedeuten kann, das gar nicht auf unser Erkenntnisvermögen bezogen wäre. Für uns gibt es eben nur die Welt, in der das Wort ‘es gibt’ einen Sinn hat (Heisenberg, 1959).16


Uma tal concepção de realidade impossibilita a manutenção da distinção entre sujeito e objeto (Costa, 2008). São muitas as passagens em que Heisenberg se pronuncia contra a partição dualista, segundo ele proposta por Descartes. Heisenberg não apenas recusa-se a ver o mundo como constituído por apenas duas partes, mas também não aceita que subjetivo e objetivo estejam em pólos opostos e incomunicáveis. Os níveis que constituem a sua própria concepção de realidade contem elementos subjetivos e objetivos, ao mesmo tempo (Heisenberg, 2008 [1942]).

Muitos seriam os meios à disposição dos seres humanos para tentar atingir e descrever a realidade. Para Heisenberg, a realidade não deveria ser encarada como se fosse um monólito, uma estrutura única. Ao contrário, ela seria constituída por várias camadas ou níveis diferentes. O ser humano pode interagir com aquilo que está fora dele por meio de diferentes ‘instrumentos’ como, por exemplo, a linguagem, talvez o seu mais frequente e poderoso ‘instrumento’ para lidar com a realidade. Não se deve esquecer que ele também pode interagir com o seu próprio interior. Nas palavras do já mencionado Schiemann:


Verschiedene Erkenntnisweisen kommen nach Heisenberg zum einen nebeneinander vor, so dass die Menschen die Welt gleichsam aus unterschiedlichen Perspektiven betrachten können. Mit dem Wechsel der Perspektive wandelt sich die Welt. Die größte Differenz besteht zwischen den Perspektiven des religiösen Glaubens und der Wissenschaft. Aber auch innerhalb des Horizontes der wissenschaftlichen Erkenntnis weist Heisenberg Unterschiede nach, die sich nur bedingt in ein einheitliches Schema integrieren lassen. Zum anderen unterliegen seiner Auffassung nach alle Erkenntnisweisen einem Wandel in der Zeit. Es verändert sich nicht nur die Reichweite ihrer Geltung, sondern teilweise auch das epochale Ordnungsschema, in dem sie eingebettet sind. Insofern Heisenberg den historischen Wandel als diskontinuierliche Entwicklung beschreibt, kann man ihn als Theoretiker der Erkenntnisrevolutionen und des Epochenbruches bezeichnen. Er betont zugleich aber auch die sich durchhaltenden Elemente der Kontinuität und damit die Grenzen seiner eigenen pluralistischen Philosophie (Schiemann, 2009).17


Como já foi afirmado anteriormente, Werner Heisenberg recusava uma concepção cientificista, materialista, positivista ou mecanicista da realidade. Em outros termos, ele recusava toda e qualquer concepção de realidade que reduzisse esta última a um único aspecto. A sua atitude pode ser explicada pela impossibilidade de se conseguir, por meio de definições, axiomatizações e interpretações, a estabilidade ou a finalização conceitual. As dificuldades inerentes aos conceitos apenas em parte podem ser consideradas como responsáveis pela dificuldade, vivida pela ciência, em compreender a realidade. Outros elementos se fazem presentes, sendo igualmente efetivos.



16 “A realidade da qual podemos falar nunca é a realidade em si mesma, mas uma realidade conhecida ou, em muitos casos, uma realidade que projetamos. Se se opõe a esta última formulação que existe, afinal, um mundo objetivo que é completamente independente de nós e de nosso pensamento, que é ou pode ser executado sem nossa intervenção e que realmente queremos dizer com pesquisa, devemos primeiro combater essa objeção, que é tão plausível que a palavra ‘existe’ vem da linguagem humana e, portanto, não pode significar algo que não esteja relacionado ao nosso conhecimento. Para nós, existe apenas o mundo em que a palavra ‘existe’ faz sentido” (Heisenberg, 1959, tradução nossa).

17 “Segundo Heisenberg, diferentes maneiras de conhecer ocorrem lado a lado para que as pessoas possam ver o mundo de diferentes perspectivas, por assim dizer. À medida que a perspectiva muda, o mundo muda. A maior diferença está entre as perspectivas da crença religiosa e da ciência. Mas Heisenberg também demonstra diferenças dentro do escopo do conhecimento científico que só podem ser integrados em um esquema uniforme em uma extensão limitada. Por outro lado, em sua opinião, todas as cognições estão sujeitas a alterações no tempo. Não apenas o escopo de sua validade muda, mas, em alguns casos, a ordem de época em que estão incorporados. Na medida em que Heisenberg descreve a mudança histórica como um desenvolvimento descontínuo, ele pode ser descrito como um teórico da revolução epistemológica e da ruptura epocal. Ao mesmo tempo, porém, ele enfatiza os elementos persistentes da continuidade e, portanto, os limites de sua própria filosofia pluralista.” (Schiemann, 2009, tradução nossa).

Consideremos, a título de exemplo, o materialismo. Na não aceitação do materialismo haveria ainda a crença de Heisenberg na existência de uma ordem central; ordem esta que não poderia ser descrita, compreendida e reconstruída a partir dos átomos. Heisenberg não colocava em questão a existência dessa ordem central como se constata na sua autobiografia nas passagens em que ele reconstrói o diálogo que manteve em 1952 em Copenhague com Wolfgang Pauli (Heisenberg, 1995 [1952]).


Segundo Heisenberg, a presença de uma ordem central está ligada à busca pela unidade. Em outros termos, quem busca a unidade o faz porque acredita que a realidade seja intrinsecamente ordenada:


Wenn man zurückblickt auf die griechische Philosophie von ihrem Beginn bis zu diesem Punkt, so erkennt man, dass sie von Anfang an getragen wurde durch die Spannung zwischen dem Einen und dem Vielen. Für unsere Sinne besteht die Welt aus einer unendlichen Vielfalt von Dingen und Vorgängen, von Farben und Klängen. Aber um sie zu verstehen, müssen wir irgendeine Art von Ordnung einführen. Ordnung bedeutet, zu erkennen, was gleich ist; Ordnung bedeutet eine Art von Einheit. An dieser Stelle entspringt dann der Glaube, dass es ein Grundprinzip geben müsse; aber zur gleichen Zeit entsteht auch die Schwierigkeit, aus ihm die unendliche Vielfalt der Dinge zu erklären (Heisenberg, 1984, p. 46–47).18


Heisenberg afirmava que a realidade capaz de ser estudada pela ciência, seja esta última natural ou humana, é incapaz de contribuir para que o ser humano alcance a ordem central. A ciência pode contribuir positivamente para a concretização deste objetivo, na medida em que é uma prática coletiva e dialógica, além, é claro, de poder conhecer certos aspectos dessa realidade maior e englobante. No entanto, este objetivo da ciência torna-se prejudicial caso ela arrogue para si uma capacidade inexistente, a saber: atingir uma compreensão da totalidade. O reconhecimento da existência da ordem central não pode ocorrer por meio da ‘faculdade do entendimento’.

A segurança, obtida através dos conceitos, implica na diminuição daquilo que pode ser experienciado, apreendido e alcançado na realidade, acabando por levar a uma crise, já que diminui a base empírica dos conceitos. Essa crise se faz presente, como aparecendo de modo incontestável, na instabilidade na relação entre conceito e realidade. Os conceitos nunca podem corresponder exata e/ou plenamente à realidade, ainda mais porque eles são criações historicamente determinadas. A axiomatização conceitual é incapaz de eliminar os traços referentes à origem dos conceitos. Essa incapacidade não faz com que a axiomatização, tão celebrada pelos neopositivistas, seja completamente inútil, apenas mostra que ela não é capaz de resolver problemas referentes à relação entre nomes e objetos.

Apesar de ser cético com relação a sobrevalorização neopositivista da linguagem, Heisenberg acreditava que considerar cuidadosamente a linguagem poderia render benefícios. As disputas conceituais, ou terminológicas, seriam como que o indicativo de que algo está se passando nos fundamentos da ciência, tal como a inexistência de um consenso entre os seres humanos (ou ainda, de modo mais restrito, entre os cientistas) com relação ao que é a realidade. As diferenças e disputas terminológicas entre cientistas poderiam indicar mudanças na concepção de realidade então vigente.

Caso leve-se a sério essas diferenças e disputas, isto, é, caso elas sejam tomadas como indicando algo mais profundo do que apenas uma diferença entre convenções, não se torna impossível concluir que os cientistas jamais concordam com relação àquilo que há de mais fundamental nas suas ciências. Isto porque uma análise detida dos seus escritos mostra, com facilidade, diferenças conceituais. Ou seja, os termos não possuem os mesmos significados para todos os cientistas. Os dois parágrafos abaixo exibem com nitidez uma das opiniões de Heisenberg sobre a relação entre linguagem e realidade.

Immer wieder in der Geschichte der Naturwissenschaften haben überraschende Entdeckungen und neue Ideen zu wissenschaftlichen Auseinandersetzungen geführt; sie haben polemische Veröffentlichungen entstehen lassen, die die neuen Ideen kritisieren, und solche Kritik ist oft für ihre Entwicklung durchaus


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18 “Se se olhar para a filosofia grega desde o início até este ponto, será possível constatar que ela está, desde o início, apoiada pela tensão entre o uno e o múltiplo. Para os nossos sentidos, o mundo consiste em uma variedade infinita de coisas e processos, de cores e sons. Mas, para entender isso, precisamos introduzir algum tipo de ordem. Ordem significa reconhecer o que é o mesmo; ordem significa um tipo de unidade. É aqui que surge a crença de que deve haver um princípio básico; mas, ao mesmo tempo, surge a dificuldade de explicar a variedade infinita de coisas.” (Heisenberg, 1984, p. 46–47, tradução nossa)

nützlich gewesen. Aber diese Kontroversen haben fast nie vorher jenen Grad von Heftigkeit erreicht, den sie nach der Entdeckung der Relativitätstheorie, und in einem geringeren Grade auch nach der Quantentheorie, annahmen. In beiden Fällen sind die wissenschaftlichen Probleme schließlich sogar mit politischen Streitfragen verknüpft worden, und einige Physiker haben bei den politischen Methoden Zuflucht gesucht, um ihren Ansichten zum Sieg zu verhelfen.


Diese heftige Reaktion auf die jüngste Entwicklung der modernen Physik kann man nur verstehen, wenn man erkennt, daß hier die Fundamente der Physik und vielleicht der Naturwissenschaft überhaupt in Bewegung geraten waren, und daß diese Bewegung ein Gefühl hervorgerufen hat, als würde der Boden, auf dem die Naturwissenschaft steht, uns unter den Füßen weggezogen. Gleichzeitig bedeutete es aber doch wohl auch, daß man noch nicht die richtige Sprache gefunden hatte, in der man über die neue Situation sprechen konnte, und daß die ungenauen und zum Teil unkorrekten Behauptungen, die hier und dort in der Begeisterung über die neuen Entdeckungen veröffentlicht worden sind, alle Arten von Mißverständnissen hervorgerufen haben. Hier handelt es sich in der Tat um ein schwieriges, grundsätzliches Problem (Heisenberg, 2000)19.


Ainda assim, os cientistas não têm melhor meio para se fazer compreender do que a linguagem. Não se pode abandoná-la como também não se pode desistir de aperfeiçoá-la através de novas definições e precisões linguísticas:

Andererseits muß die Naturwissenschaft ja auf die Sprache als das einzige Mittel zur Verständigung begründet werden, und daher müssen hier, wo das Problem der Unzweideutigkeit von der größten Wichtigkeit ist, die logischen Schlußverfahren ihre Rolle spielen. Die charakteristische Schwierigkeit an dieser Stelle kann vielleicht in der folgenden Weise beschrieben werden: In der Naturwissenschaft versuchen wir das Spezielle aus dem Allgemeinen abzuleiten; das Einzelphänomen soll als Folge einfacher allgemeiner Gesetze verstanden werden. Die allgemeinen Gesetze können, wenn sie sprachlich formuliert werden, nur einige wenige Begriffe enthalten, denn sonst wäre das Gesetz nicht einfach und allgemein.


Aus diesen Begriffen muß nun eine unendliche Vielfalt von möglichen Erscheinungen hergeleitet werden, und zwar nicht nur qualitativ und ungenau, sondern mit größter Genauigkeit hinsichtlich jeder Einzelfrage. Es ist unmittelbar einzusehen, daß die Begriffe der gewöhnlichen Sprache, ungenau und unscharf definiert, wie sie sind, niemals solche Ableitung zulassen könnten. Wenn aus gegebenen Voraussetzungen eine Kette von Schlüssen hergeleitet werden soll, so hängt die Anzahl der möglichen Glieder in der Kette von der Genauigkeit der Voraussetzungen ab. In der Naturwissenschaft müssen daher die Grundbegriffe in den allgemeinen Gesetzen mit äußerster Präzision definiert werden, und das ist nur mit Hilfe der mathematischen Abstraktion möglich (Heisenberg, 2000).20


O aumento da precisão conceitual pode ser obtido através do recurso à matemática, ainda que esta não possa revolver todos os problemas relativos à precisão. Aliás, para Heisenberg, a matemática não é relevante por contribuir para a precisão ou exatidão. Sua relevância decorre fundamentalmente da sua capacidade de exibir a beleza, existente na natureza, e, deste modo, conduzir os cientistas à verdade. A


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19 “Repetidas vezes, na história das ciências naturais, descobertas surpreendentes e novas idéias levaram a debates científicos; eles criaram publicações polêmicas que criticam as novas idéias, e essa crítica tem sido frequentemente útil para seu desenvolvimento. Mas essas controvérsias quase nunca atingiram o nível de virulência que assumiram após a descoberta da relatividade e, em menor grau, a teoria quântica. Em ambos os casos, os problemas científicos foram vinculados a questões políticas, e alguns físicos recorreram a métodos políticos para ajudar a ganhar suas visões. “Essa reação violenta ao recente desenvolvimento da física moderna só pode ser entendida caso se perceba que aqui os fundamentos da física, e talvez da ciência natural, começaram a se mover e que esse movimento criou um sentimento como se o solo, sobre o qual a ciência natural se encontra, estivesse se abrindo e nos puxou para debaixo de nossos pés. Ao mesmo tempo, porém, também significava que ainda não havia encontrado o idioma certo para falar sobre a nova situação, e que as declarações imprecisas e às vezes incorretas foram divulgadas aqui e ali no entusiasmo pelas novas descobertas. causarndo todos os tipos de mal-entendidos. Aqui, de fato, se está diante de um problema difícil e fundamental.” (Heisenberg, 2000, tradução nossa).

20 “Por outro lado, a ciência natural deve basear-se na linguagem como o único meio de comunicação e, portanto, onde o problema da ambiguidade é da maior importância, os procedimentos de inferência lógica devem desempenhar seu papel. A dificuldade característica nesse ponto talvez possa ser descrita da seguinte maneira: na ciência, nós tentamos derivar o particular do geral; o fenômeno individual deve ser entendido como uma conseqüência de leis gerais simples. As leis gerais só podem conter alguns termos se forem formuladas linguisticamente; caso contrário, a lei não seria simples e geral. “Uma variedade infinita de aparências possíveis deve agora ser derivada desses termos, não apenas qualitativa e imprecisa, mas com a maior precisão em relação a cada questão individual. É imediatamente perceptível que os termos da linguagem comum, por mais imprecisos e confusos que sejam, nunca poderiam permitir tal derivação. Se uma cadeia de conclusões deve ser derivada de determinadas condições, o número de elos possíveis na cadeia depende da precisão das condições. Na ciência natural, portanto, os conceitos básicos das leis gerais devem ser definidos com extrema precisão, e isso só é possível com a ajuda da abstração matemática.” (Heisenberg, 2000, tradução nossa).

matemática não tem como resolver todos os problemas que acometem a ciência, já que esta última recorre, como não poderia deixar de ser, à linguagem ordinária ou cotidiana. Entre outras consequências, a presença incontornável da linguagem ordinária ou cotidiana faz com que a linguagem da ciência seja vaga e imprecisa.

So spricht man etwa über Elektronenbahnen, über Materiewellen und Ladungsdichte, über Energie und Impuls usw., bleibt sich dabei aber immer der Tatsache bewußt, daß diese Begriffe nur einen sehr begrenzten Anwendungsbereich besitzen. Sobald dieser vage und unsystematische Gebrauch der Sprache zu Schwierigkeiten führt, muß sich der Physiker in das mathematische Schema zurückziehen und dessen eindeutige Verknüpfung mit den experimentellen Tatsachen benützen. Diese Verwendung der Sprache ist in mancherlei Weise recht befriedigend, da sie uns an einen ähnlichen Gebrauch der Sprache im täglichen Leben oder in der Dichtung erinnert (Heisenberg, 2000).21


Imprecisos, vagos, insuficientes, todos esses predicados podem ser atribuídos aos conceitos. No entanto, nada disso faz com que eles possam desaparecer, seja da vida diária, seja da ciência, como se fossem dispensáveis. Sem eles, nós não temos como penetrar no mundo dos fenômenos naturais, principalmente aqueles fenômenos situados nas dimensões cosmológicas ou atômicas. Os conceitos são como que guias, que conduzem os cientistas na exploração dessas esferas por demais distantes do corpo humano, mas não tão distantes da razão e da fantasia humanas. É por isto que o emprego da linguagem por parte de um cientista é semelhante ao de um poeta. Os conceitos são como que elementos com a capacidade de contribuir para transformar aquilo que não é ainda empiricamente determinado em presente e efetivo.


In ähnlicher Weise sind in der Quantentheorie alle klassischen Begriffe, wenn man sie auf das Atom anwendet, ebensowohl und ebensowenig definiert wie die Temperatur des Atoms, sie sind mit statistischen Erwartungen verknüpft; nur in seltenen Fällen können die Erwartungen nahezu an Sicherheit grenzen. Wieder ist es ähnlich wie in der klassischen Wärmelehre schwierig, die Erwartung objektiv zu nennen. Man mag sie eine objektive Tendenz oder Möglichkeit nennen, eine Potentia im Sinne der Aristotelischen Philosophie. In der Tat glaube ich, daß die Sprache, die bei den Physikern gebräuchlich ist, wenn sie über Atomvorgänge sprechen, in ihrem Denken ähnliche Vorstellungen hervorruft wie der Begriff Potentia.

So haben sich die Physiker allmählich wirklich daran gewöhnt, die Elektronenbahnen und ähnliche Begriffe nicht als eine Wirklichkeit, sondern eher als eine Art von Potentia zu betrachten. Die Sprache hat sich, wenigstens in einem gewissen Ausmaße, schon an die wirkliche Lage angepaßt. Aber es ist nicht eine präzise Sprache, in der man die normalen logischen Schlußverfahren benützen könnte; es ist eine Sprache, die Bilder in unserem Denken hervorruft, aber zugleich mit ihnen doch auch das Gefühl, daß die Bilder nur eine unklare Verbindung mit der Wirklichkeit besitzen, daß sie nur die Tendenz zu einer Wirklichkeit darstellen.

In den Experimenten über Atomvorgänge haben wir mit Dingen und Tatsachen zu tun, mit Erscheinungen, die ebenso wirklich sind wie irgendwelche Erscheinungen im täglichen Leben. Aber die Atome oder die Elementarteilchen sind nicht ebenso wirklich, sie bilden eher eine Welt von Tendenzen oder Möglichkeiten als eine von Dingen und Tatsachen (Heisenberg, 2000).22


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21 “Fala-se, por exemplo, sobre órbitas de elétrons, sobre ondas de matéria e densidade de carga, sobre energia e momento etc., mas sempre permanece consciente do fato de que esses termos têm apenas uma área de aplicação muito limitada. Assim que esse uso vago e sistemático da linguagem levar a dificuldades, o físico precisa se voltar para o esquema matemático e usar sua clara conexão com os fatos experimentais. Esse uso da linguagem é bastante satisfatório em muitos aspectos, porque nos lembra um uso semelhante da linguagem na vida cotidiana ou na poesia.” (Heisenberg, 2000, tradução nossa).

22 “Da mesma forma, na teoria quântica, quando aplicados ao átomo, todos os termos clássicos são tão e tão pouco definidos quanto a temperatura do átomo; eles estão ligados a expectativas estatísticas; somente em casos raros, as expectativas quase limitam a segurança. Novamente, é difícil, como na teoria clássica do calor, nomear objetivamente a expectativa. Pode-se chamá-lo de tendência ou possibilidade objetiva, uma potentia no sentido da filosofia aristotélica. De fato, acredito que a linguagem que os físicos usam quando falam sobre processos atômicos gera idéias semelhantes em seus pensamentos como o termo potentia. “Gradualmente, os físicos realmente se acostumaram a ver as órbitas eletrônicas e termos semelhantes, não como uma realidade, mas como uma espécie de potentia. A linguagem se adaptou, pelo menos em certa medida, à situação real. Mas não é uma linguagem precisa na qual se possa usar os procedimentos normais de raciocínio lógico; é uma linguagem que evoca imagens em nosso pensamento, mas ao mesmo tempo com elas o sentimento de que as imagens só têm uma conexão pouco clara com a realidade, que apenas representam a tendência a uma realidade. “Nas experiências com processos atômicos, lidamos com coisas e fatos, com fenômenos tão reais quanto qualquer fenômeno na vida cotidiana. Mas os átomos ou as partículas elementares não são tão reais, eles formam um mundo de tendências ou possibilidades, e não um [mundo] de coisas e fatos.” (Heisenberg, 2000, tradução nossa).

Ao aproximar a prática do cientista natural daquela existente no domínio da poesia, Heisenberg procura lembrar que os conceitos não apenas designam coisas como processos, objetos e estados, mas, e talvez esta seja uma função tão importante quanto aquela, os conceitos são usados como elementos para tatear a realidade. Os conceitos são como as antenas dos insetos que ajudam a tocar a avançar em meio a uma realidade, que se mostra pouco visível ou nítida. Ou ainda, os conceitos são como que a bengala de um(a) cego(a). Tal como no caso dos insetos e dos cegos, a realidade não se encontra ‘à disposição’ dos investigadores sem que estes últimos estejam munidos de conceitos, os quais não podem ser separados da realidade que ajudam a desvelar e conhecer. Separados aqui significa que não se pode determinar uma lnha nítida e precisa entre os conceitos e os fenômenos.


Heisenberg e a noção de beleza


As limitações inerentes aos conceitos fazem com que eles devam ser como que acompanhados de outros elementos, os quais contribuem para que a ciência possa descrever e conhecer a realidade. Esses outros elementos são determinados pela filosofia. Determinação aqui não significa que a existência de tais elementos se dê apenas através da filosofia. Esta última pode ajudar a escolher entre os muitos tipos de elementos. Um exemplo concreto é a noção de beleza. Não apenas a lógica poderia ser útil e relevante no aproveitamento das contribuições positivas obtidas com os conceitos; também a beleza poderia extrair dos conceitos aquilo que eles podem dar para a descrição e compreensão do comportamento da natureza (ou realidade).


Heisenberg também considerava a beleza da matemática como um dos sinais de que uma teoria física tinha chances de “encaixar-se” à natureza, ou seja, de que seria possível afirmar a existência de corroboração experimental para a mesma. Ele parecia acreditar que existiria uma harmonia na natureza que pode ser descrita em termos matemáticos – e que as formas dessa matemática refletiriam as características naturais dos fenômenos.


Ao pronunciar-se sobre o significado da beleza nas ciências naturais em conferência pronunciada na Academia de Belas Artes de Munique, Heisenberg afirma que, embora naquela academia a “beleza” era algo usualmente referido às “artes, o reino do belo estende-se bem além do seu território. Este certamente engloba outras regiões da vida mental também; e a beleza da natureza também é refletida na beleza da ciência natural (Heisenberg, 1974, p. 167).”23 Para defender seu ponto de vista, o de que existe essa relação estreita entre a beleza natural e a beleza da ciência, o físico alemão recorre aos filósofos da antiguidade e suas definições, uma das quais recorre reiteradamente, a que “descreve a beleza como a conformidade adequada das partes entre si e com o todo.”24 A simplicidade e completude do sistema euclidiano são tidas como belas no modo como as partes pertencem ao todo e em sua relação umas com as outras e Heisenberg refere a como a beleza estava envolvida no “problema milenar do ‘um’ e do ‘múltiplo’ que ocupou, estreitamente ligado ao problema do ‘ser’ e do ‘vir a ser’, uma posição central na filosofia grega antiga” (Heisenberg, 1974, p. 168). A simplicidade e a completude contribuem para que a harmonia e o equilíbrio surjam de forma natural e equilibrada.


A história da relação entre beleza e matemática teria início com Pitágoras, a quem é atribuída a descoberta de que “cordas vibrando sob tensão igual soam harmônicas se os seus comprimentos estiverem em uma razão numérica simples. Assim, a relação matemática também era fonte de beleza.” Isso deu origem à ideia de que “a ordem matemática era o princípio básico através do qual a multiplicidade de fenômenos poderia ser descrita” (Heisenberg, 1974, p. 169).


A beleza, conforme a primeira de nossas definições antigas, é a conformidade adequada das partes entre si e com o todo. As partes aqui são as notas individuais, enquanto o todo é o som harmônico. A relação matemática pode, desse modo, reunir duas partes inicialmente independentes em um todo e produzir


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23 “the arts, the realm of the beautiful stretches far beyond their territory. It assuredly encompasses other regions of mental life as well; and the beauty of nature is also reflected in the beauty of natural science (HEISENBERG, 1970, p. 167).”

24 “describes beauty as the proper conformity of the parts to one another, and to the whole (Heisenberg, 1970, p. 168).”

beleza. Essa descoberta realizou um avanço na doutrina pitagórica para formas totalmente novas de pensamento, suscitando, assim, a ideia de que a base primordial de todo ser não era mais vista como matéria sensorial, tal como a água em Tales; mas um princípio ideal de forma. Isso afirmou uma ideia básica que, mais tarde, forneceu o fundamento para todas as ciências exatas. (Heisenberg, 1974, p. 169)25


A utilização da filosofia antiga em defesa da beleza das construções abstratas possui aspectos interessantes. Ela mostra como a questão remonta à tradição antiga sem deixar de ser atual. Além disso, apresenta de modo simples como a apreciação da beleza pode ser colocada para entidades abstratas, conforme foi discutido por McAllister (1996). As ciências exatas são oriundas dessa tradição antiga e a relação entre as construções matemáticas e a natureza já é dada nessa origem.


Compreender a multiplicidade colorida dos fenômenos foi, desse modo, estreitada através do reconhecimento neles dos princípios unitários da forma, que podem ser expressos na linguagem da matemática. Através disso, também, uma conexão íntima foi estabelecida entre o inteligível e o belo. Porque se o belo é concebido como a conformidade das partes entre si e com o todo, e se, por outro lado, toda compreensão é tornada possível primeiro por meio dessa conexão formal, então a experiência do belo se torna virtualmente idêntica à experiência das conexões, seja compreendidas ou pelo menos supostas (Heisenberg, 1974, p. 169).26


Ou seja, para o autor, a percepção de beleza e a de inteligibilidade são basicamente o mesmo. Ele segue referenciando os gregos antigos para afirmar o mesmo da relação entre o belo e o bom. Entretanto, embora as ideias dos antigos da relação entre beleza e entendimento fossem o fundamento das ciências exatas, elas não poderiam ter sido desenvolvidas naquela época, resultando em conflitos, tais como os atuais, entre aqueles que defendem um conhecimento mais empírico, e os que se dedicam à física teórica. Esses conflitos não podiam ser resolvidos na época antiga, mas hoje, para o autor, podem. Para Heisenberg, não haveria razão para tais conflitos, pois o caminho natural das ciências seria aquele que levaria a uma convergência entre as duas abordagens. Mas a divergência que o conflito entre as duas tendências gerou separou, até os dias de hoje, os estudos do belo e das ciências, sendo a abordagem teórica abstrata do estudo da matemática vista como trabalho infrutífero para a descrição da natureza, se não aliada às evidências empíricas (Heisenberg, 1974, p. 170ss; Puig, 2018).

Ao defender a aproximação da matemática bela aos fenômenos da natureza, Heisenberg defende aquilo que também se viu em Dirac, uma relação direta e intrínseca entre a cognição e a inteligibilidade e a natureza (Puig, 2018). Essa relação se manifesta ou pode ser identificada através da matemática bela. Para ele, Galileu, Kepler e Newton “apontam o caminho” para as ciências exatas de hoje, que muito embora tenham se calcado em observações, obtiveram enorme sucesso com a simplificação destas em teorias abstratas e matemáticas. Como a definição antiga rege, essa matematização envolvia, para Heisenberg, necessariamente também o belo, uma vez que se trata de dar boa conformação das partes entre si e com o todo (Heisenberg, 1974, p. 173).


O modo como a beleza é significativa para a descoberta da verdade é algo que tem sido reconhecido e enfatizado em todos os tempos. O lema em latim ‘Simplex sigillum veri’ – ‘O simples é o selo da verdade’

– está inscrito em letras grandes no auditório de física da Universidade de Göttingen, como uma exortação àqueles que descobririam novidades; e outro lema em latim, ‘Pulchritudo splendor veritatis’


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25 Beauty, so the first of our ancient definitions ran, is the proper conformity of the parts to one another and to the whole. The parts here are the individual notes, while the whole is the harmonious sound. The mathematical relation can therefore assemble two initially independent parts into a whole, and so produce beauty. This discovery effected a breakthrough, in Pythagorean doctrine, to entirely new forms of thought, and so brought it about that the ultimate basis of all being was no longer envisaged as a sensory material such as water, in Thales—but as an ideal principle of form. This was to state a basic idea which later provided the foundation for all exact science (Heisenberg, 1974, p. 169, tradução nossa).

26 Understanding of the colorful multiplicity of the phenomena was thus to conic about by recognizing in them unitary principles of form, which can be expressed in the language of mathematics. By this, too, a close connection was established between the intelligible and the beautiful. For if the beautiful is conceived as a conformity of the parts to one another and to the whole, and if, on the other hand, all understanding is first made possible by means of this formal connection, the experience of the beautiful becomes virtually identical with the experience of connections either understood or at least guessed at (Heisenberg, 1974, p. 169).

‘A beleza é o esplendor da verdade’ – também pode ser interpretado como significando que o pesquisador reconhece a verdade, primeiro, por seu esplendor, pelo modo como brilha (Heisenberg, 1974, p. 173).27


Essas mesmas ideias são apresentadas pelo autor em outros textos, mas como é nesse texto que ficam mais claras, é geralmente a ele que fazem referência os outros autores que aqui menciono. Para Heisenberg, há ainda outra definição de beleza que vem da antiguidade e que também pode ser resgatada e ser útil hoje: trata-se da definição atribuída a Plotino, que afirma “A beleza é a transparência, através do fenômeno material, do esplendor eterno do ‘um’”28 (Plotino, sr apud Heisenberg, 1974, p. 180). Fica clara a crença de Heisenberg em uma unidade da natureza que seria refletida na unidade da ciência – e essa unidade é apreendida pelo intelecto através da intuição de beleza.


Conclusão

Como conclusão, apresentamos, aquelas teses, que nos parecem estar entre as mais caras ao físico alemão. Vamos a elas:

  1. A ciência não se resume a uma dimensão operatória devido à sua possibilidade de ser bela. Ou, ao menos, de permitir aos seres humanos reconhecerem que a natureza é bela.

  2. A matemática é uma ciência como as outras, uma vez que ela permite o alcance da beleza.


  3. A verdade é mais do que correspondência aos fatos. Verdade deve integrar, ou religar, os seres humanos à totalidade, o que faz com que a verdade 'cientifica' seja próxima à verdade religiosa. Essa integração não é somente racional.

  4. A verdade não pode ser conhecida individualmente, o que torna o diálogo um meio importante para descobrir, expressar, comunicar, reconhecer e aceitar a verdade.

  5. A beleza é a expressão da verdade.


  6. A verdade permitiria a unificação da ciência.

As seis teses acima não devem ser entendidas como um resumo da ‘filosofia’ de Werner Heisenberg. Ao menos no escopo do presente artigo, elas devem ser compreendidas como indicando em que direção se movimentava o pensamento do físico alemão.


Ao discutir a ciência natural sob a perspectiva da filosofia Heisenberg procurava mostrar que aquela não podia ser devidamente tornada inteligível caso fosse vista como pragmatista, operacionalista, materialista ou positivista. A ciência não se limitava aos resultados obtidos, mesmo que fossem considerados apenas os verdadeiros ou que tivessem sido capazes de gerar aplicações tecnológicas. Ela seria muito mais do que isso, na medida em que os processos, usados para obter aqueles mesmos resultados, não poderiam ser desconsiderados ou descartados. Por isso, a história da ciência integraria a própria ciência.

Há mais: se os processos fazem parte da ciência, se os contextos de descoberta e justificação não podem ser separados como os conceitos não podem ser completamente distinguidos dos objetos que


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27 The significance of the beautiful for the discovery of the true has at all times been recognized and emphasized. The Latin motto ‘Simplex sigillum veri’ The simple is the seal of the true is inscribed in large letters in the physics auditorium of the University of Göttingen, as an admonition to those who would discover what is new; and another Latin motto, ‘Pulchritudo splendor veritatis’ – ‘Beauty is the splendor of truth’ - can also be interpreted to mean that the researcher first recognizes truth by this splendor, by the way it shines forth (Heisenberg, 1974, p. 171, tradução nossa).

28 Beauty is the translucence, through the material phenomenon, of the eternal splendor of the ‘one’ (Plotino, sr apud Heisenberg, 1974,

  1. 180, tradução nossa.).

    tentam descrever e nomear, a ciência é uma prática compreensiva, na medida em que busca sentido, não apenas para os seus teorias, leis, modelos e resultados, mas também para as suas aplicações.

    Ao longo de boa parte de sua vida profissional, Heisenberg procurou mostrar que não seria possível esquecer-se da segunda definição de beleza, aquela que defende que a beleza seria o esplendor da verdade. Essa segunda definição não era intrinsecamente melhor ou superior à primeira, que definia beleza em termos da relação das partes com o todo, o que a vincularia a uma noção de verdade como simplicidade. Heisenberg procurava evitar uma situação onde fosse obrigatório escolher entre simplicidade e complexidade, entre a razão e a ordem central. Sua meta foi sempre a de mostrar que simplicidade e complexidade estão profundamente ligadas, tal como os conceitos e objetos, ou ainda tal como a beleza e a verdade29.


    Referências

    Costa, F.A. (2008) A idéia de transformação em Werner Heisenberg. Dissertação [Mestrado] Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

    Einstein, E. (1981) Como Vejo o Mundo. Rio de Janeiro:Nova Fronteira.


    Heisenberg, W. (1982) “The Meaning of Beauty in the Exact Sciences.” Heath, P. (Trad.) In: Across the Frontier. New York: Harper & Row, 1974, p. 167-180.


    Heisenberg, W. (1984) Physik und Philosophie Stuttgart: Hirzel 4, p. 46–47.

    Heisenberg, W. (1995 [1952]) A parte e o todo. Diálogos sobre Física Atômica. Rio de Janeiro: Contraponto.

    Heisenberg, W. (2000) “Linguagem e Realidade” In: Physik und Philosophie. Stugart: Hirzel.


    Heisenberg, W. (2008 [1942]) Ordenação da Realidade – O Manuscrito de 1942. Rio de Janeiro: Forense Universitária.


    Krüger, L. (1970) Erkenntnisprobleme der Naturwissenschaften. Texte zur Einführung in die Philosophie der Wissenschaft, Kiepenheuer & Witsch/Neue wissenschaftliche Bibliothek/Philosophie, Band 38, p. 436.


    Mcallister, J. (1996) Beauty and Revolution in Science. New York: Cornell University Press.


    Puig, C.F. (2018) O uso de critérios estéticos na escolha de teorias científicas. Tese (Doutorado em Filosofia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 147 pp.

    Rovelli, C. (2018) Physics Needs Philosophy. Philosophy Needs Physics. Found Phys 48, p. 481–491 https://doi.org/10.1007/s10701-018-0167-y

    Schiemann, G. (2009). “Welt im Wandel. Werner Heisenbergs Ansätze zu einer pluralistischen Philosophie” In: Schwarz, A. & Nordmann, A. Das bunte Gewand der Theorie. Vierzehn Begegnungen mit philosophierenden Forschern. Recuperado de: https://philarchive.org/archive/SCHWIW-2. Acesso em: 04/12/2019.


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    29 AAPV agrade os apoios financeiros da CAPES, através da modalidade CAPES-PRINT (nº 88887.368212/2019-00), CNPq, modalidade bolsa de produtividade (nº 304.945/201-5) ao Programa Prociência FAPERJ/UERJ, bem como a hospitalidade da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais (UCP, Braga), onde o artigo foi redigido.

    Videira, A.A.P. (2013) A inevitabilidade da filosofia na ciência natural do século 19 - O caso da física teórica. Ijuí: Editora Unijuí.

     

     

     

    Entrevistas


    https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.10945


    ENTREVISTA A ÁNGEL LUIS MOLINA MOLINA

    INTERVIEW WITH ÁNGEL LUIS MOLINA MOLINA
    ENTREVISTA COM ÁNGEL LUIS MOLINA MOLINA


    Nicolás Martínez Sáez
    (Universidad Nacional de Mar del Plata)
    martinezsaeznicolas@gmail.com


    Recibido: 22/7/2020
    Aprobado: 14/8/2020


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    El profesor Ángel Luis Molina Molina es medievalista, historiador español, catedrático en la Universidad de Murcia, académico de la Real Academia Alfonso X el Sabio, y con una vasta trayectoria de estudio en temas tan innovadores de la Edad Media como los juegos de mesa y los realizados al aire libre, la prostitución como servicio público y diversas actividades vinculadas a la vida cotidiana entre los siglos XIII y XVI.


    1. En su trayectoria académica usted ha estudiado los juegos de mesa en la Edad Media europea y la función social que cumplen. Ha señalado que si bien muchos tratadistas reconocen que a toda persona es conveniente y necesario el descanso del cuerpo y del espíritu, también los moralistas han visto con recelo el juego, por la pasión que se puede suscitar en los jugadores haciéndoles perder el control. ¿Cuáles son las principales fuentes doctrinales de donde proviene esta aversión hacia el juego?

      Diversos autores como Aristóteles, Cicerón o Santo Tomás de Aquino opinaban que el juego era por naturaleza indiferente; pues teniendo por objeto la recreación del ánimo, moralmente no es ni bueno ni malo, por tanto, será honesto o no, según las circunstancias que lo acompañen. El juego ordenado por Dios y la naturaleza para descanso de las fatigas será lícito “como medio ordenado para conseguir este fin”, Santo Tomás insiste en que el juego se ha de usar como la sal en la comida, en donde sólo se echa la necesaria para sazonar. El juego también cumple una función social y los tratadistas, tanto educadores como moralistas, reconocen que a todas las personas “es conveniente y aun necesario dar tregua y descanso, ya al espíritu, ya al cuerpo”, pero sobre todo a los jóvenes, y si no lo hacen les resulta perjudicial, pues no hay nada peor que la ociosidad –un dicho popular afirma que la ociosidad es la madre de todos los vicios–, por tanto es saludable física y moralmente mantenerlos ocupados en “lícitos recreos”. El recelo de los moralistas hacia los juegos se basa en la pasión que puedan suscitar en los jugadores, haciéndoles perder el control sobre sus reacciones. Los más peligrosos, en este sentido, eran los juegos de apuestas, lo que llevaría a las autoridades a controlarlos o, incluso, prohibirlos. En general, moralistas y legisladores aconsejaban aquellas diversiones en las que se ejercitaba el músculo o la inteligencia, entre éstos últimos, el ajedrez, gozó de gran prestigio durante la Edad Media.

    2. Al aceptar la idea de la necesidad de recreos y descansos para la recuperación de las faenas cotidianas, la cultura medieval distingue entre un tiempo de ocio y un tiempo de trabajo. ¿Puede traducirse, esta distinción entre estamentos nobles y plebeyos o los estamentos más bajos, en diferentes tipos de juegos adecuados a cada uno de ellos?

      Julio Caro Baroja es quizá, quien mejor ha expresado la profunda relación existente entre el concepto medieval de tiempo y el dinamismo de la naturaleza, con sus transformaciones sucesivas. Trabajo, ocio y fiestas van engarzadas de una manera admirable. Por ello, en los momentos en que los trabajos agrícolas son más intensivos, es decir, desde la primavera hasta los inicios del otoño, se acumulan también el mayor número de días festivos para procurar a la población el descanso debido. En las fiestas colaboran todos los grupos sociales. Los caballeros son los protagonistas de diversos juegos - mezcla de ejercicio de armas, deporte y espectáculo-, en los que exhiben su pericia en el manejo de las armas, si bien cambiaban las armas de guerra por otras menos peligrosas; contaron siempre con gran aceptación popular. El juego de cañas, el de alcancía y el de sortija, además de las corridas de toros – en la que el caballero alanceaba al toro con la garrocha– fueron muy populares; a finales del período medieval empezaron a celebrarse en los reinos hispánicos unos simulacros de batallas entre caballeros cristianos y moros que rememoraban antiguas batallas –estos vistosos espectáculos son, posiblemente, los precedentes de las actuales fiestas de moros y cristianos–. Por su parte, el pueblo llano también protagoniza numerosos juegos al aire libre que tienen mucho de competición deportiva: carreras, tiro – de lanza, arco y ballesta-; pruebas de resistencia física –barra y soga–, diferentes tipos de lucha, además, de los juegos de pelota tanto en equipo como de forma individual; otros juegos populares eran los bolos, la petanca, tejo, aro, herradura, etc. y, por supuesto el ocio incluye la música y el baile.


    3. Usted ha señalado la importancia del milagro atribuido a Bernardo de Claraval en relación con el juego de dados: un día, cabalgando, el monje se encuentra con un tahúr que lo desafía a que apueste su caballo mientras él apuesta su alma. Al arrojar tres dados, el tahúr obtiene el máximo puntaje (18) y posteriormente el monje obtiene, en sus dos dados, 6 puntos y el tercero, al quebrarse, muestra 6 y 1. El tahúr, ahora superado, se entrega a la vida religiosa y santa. ¿Cuáles son las líneas hermenéuticas que pueden extraerse de esta anécdota? ¿Se pone de manifiesto algún vínculo específico entre el azar y la conversión religiosa?

      El juego de dados es, entre los juegos de azar, el más antiguo conocido. Los libros sagrados de diferentes culturas lo citan y, también, la semblanza del jugador y los terribles efectos que causa a aquellos que se entregan de manera desenfrenada a su práctica. Los griegos tenían por inventor de los dados al mítico Palamedes durante el sitio de Troya; Homero en La Odisea describe como se jugaba a los dados en la puerta del palacio de Ulises en Ítaca. Al pie de la Cruz unos soldados se jugaron a los dados la sagrada túnica y, en la Edad Media el juego de dados fue un vicio extendido por toda Europa y el más importante de los juegos de apuesta hasta la aparición en occidente de los naipes –en España empiezan a citarse en el siglo XIV-. La actitud de la sociedad ante este juego y sus adictos era muy distinta a la que se adopta para los jugadores de ajedrez y otros juegos de tablas. En el código de Las Partidas se prohíbe a los prelados tomar parte en aquellos juegos que “los sacassen de sossegamiento”, bajo pena de “ser vedados de su oficio, por tres años”, y entre los juegos prohibidos se encuentran los dados. De la misma manera el obispo de Segovia, Pedro de Cuellar, en 1325, en su Catecismo prohíbe a los clérigos de su diócesis participar en los juegos de azar, y muy especialmente en los de dados. En este contexto, el milagro atribuido a San Bernardo de Claraval es una anécdota que refleja muy bien la mentalidad de la época. El que reta al santo a que apueste su caballo a cambio de su alma es un tahúr, es decir un jugador profesional que juega con dados trucados, por lo tanto, está seguro de ganar la partida, al tiempo que considera al fraile un incauto; pero Bernardo al aceptar el desafío, lleno de fe espera su victoria sobre el tahúr para conseguir la salvación de su alma, pues para Dios no hay nada imposible. El desenlace no podía ser otro que el arrepentimiento del “pecador” y su posterior penitencia. Finalmente, la rápida difusión del suceso entre las gentes llevaría a otros jugadores al “buen camino”. En este caso no creo que exista ningún vínculo específico entre juego de azar y conversión. Pero a lo largo de la historia se puede observar la existencia material entre los juegos de azar y las artes adivinatorias.

    4. En la Edad Media, algunos juegos como la caza o el ajedrez se presentan como artes que requieren dedicación y práctica, pero también como ciencias que exigen reflexión y estudio. ¿Cuáles son las influencias que ejercen estos juegos en los diferentes desarrollos del mundo moderno tanto en el ámbito científico como en el militar?

      La caza para los nobles juega un papel esencial en su vida, pues el arte de la caza, junto con el del amor cortés y el de la guerra forman la trilogía de las actividades nobiliarias. Para los grupos privilegiados de la sociedad medieval la caza es arte, ciencia, pasión o, incluso, simple pasatiempo; sin embardo, para las clases sociales desfavorecidas fue necesidad y, en muchos casos, delito, pues la caza furtiva estuvo prohibida.

      La caza mayor –venados, osos, jabalíes, etc. – y la de cetrería era un deporte que formaba parte de numerosas fiestas cortesanas y su práctica por parte de reyes y nobles suponía entrenamiento para el ejercicio del poder y para la guerra, descanso para la mente y salida para los instintos violentos. Así se pone de manifiesto en Las Partidas: “una de las cosas que fallaron los sabios, que más tiene pro es la caça… ca ella ayuda mucho a menguar los pensamientos y la saña… da salud ca el trabajo que en ella se toma, si es con mesura, faze comer y dormir bien… e el placer que en ella reçibe, es otrsí grand alegría” (Part. II, tit. V, ley XX). La caza como arte pedía dedicación, gusto y sentimiento; como ciencia exigía reflexión, tacto y experiencia; como pasión pedía dedicación y enamoramiento, y, como distracción, alegría y oropeles. A finales de la Edad Media empezará a considerarse la caza, desprovista del rito de los siglos anteriores, como una fiesta. Como ciencia la caza ha dejado diversos tratados, por ejemplo, Alfonso XI de Castilla mando escribir el Libro de la Montería, en el que se describen las condiciones y cualidades de los monteros, la distribución de las especies cinegéticas por los montes de los distintos reinos, así mismo era preciso saber juzgar la edad, el sexo, las huellas, la talla, etc. de la pieza que se pretende cazar. Don Juan Manuel escribe su Libro de la caza, que dedica al más noble de las artes de la caza, es decir, a cetrería, en esta obra describe las aves que se emplean para ella, su adiestramiento, sus tipos y el número de las que un señor debía poseer –halcones, azores, neblíes, jerifaltes, gavilanes…– y también enumera los lugares en que se pueden cazar aves dentro de la Corona de Castilla. Fuera de España es muy conocido el Libro de la Caza de Gastón Phoebus.

      El ajedrez, por su parte, es mucho más que un juego de mesa concebido para la diversión de aquellos que lo practicaban. Alfonso X en su Libro del Axedrez. Dados et Tablas, le dedica la mayor parte de su obra. En él se describen las piezas y su distribución en el tablero, el movimiento de las mismas, sus reglas etc. Cuando expone las normas del juego se le da una interpretación militar y de estrategia, “mostrando como los reyes en el tiempo de las guerras en que se fazen las huestes, han de guerrear a sus enemigos punnando de los uencer”. En el tablero –campo de batalla– se distribuyen los dos ejércitos compuestos cada uno por 16 piezas de color distinto, en primer término se colocan los 8 peones, que representan al pueblo “que va en la hueste”, detrás se sitúan las piezas mayores: en una de las casillas del centro va el rey, a su lado está el alfferza –el alférez mayor–, en los lados de ambos se colocan los alfiles –adalides–, a ambos lados de ellos figuran los caballos –caballeros- y, en las últimas casillas los roques o torres. A continuación, explica el movimiento de cada una de las piezas en el tablero y el desarrollo de la partida, en el cual la inteligencia de los jugadores y el planteamiento estratégico de la partida es vital para conseguir la victoria, esta se produce cuando uno de los jugadores da jaque mate al rey contrario. Si la caza era fundamental para mantener en buen estado fía a los caballeros en la batalla, el ajedrez lo es para desarrollar la mente y elegir una buena estrategia, que consiste en saber ubicar y mover de forma coordinada las huestes sobre el terreno para obtener el triunfo sobre el enemigo.


    5. Cuando Alfonso X, en El libro de los juegos de Ajedrez, Dados y Tablas (1283), relata el origen de los juegos de mesa evoca, directamente, a discusiones filosóficas entre sabios acerca de las relaciones entre la inteligencia y el azar. ¿Cuáles son los efectos concretos de esta discusión? ¿A quiénes enfrenta o a quiénes se dirige Alfonso X al postular la supremacía de los juegos de reflexión sobre los juegos de azar?

En el prólogo que Alfonso X el Sabio redactó para su compilación de libros de recreo, destaca la ventaja de los juegos de mesa que “se fazen seyendo, frente a los que se fazen cabalgando o a pie”, porque todos pueden practicarlos: hombres y mujeres, viejos y jóvenes, libres y cautivos, en la tierra o en el mar, de noche o de día, con buen o mal tiempo. El Libro de los juegos de Axedrez, Dados e Tablas, que conocemos por el códice fecha en Sevilla en 1283, un año antes de su muerte, constituye la última aportación alfonsí a la cultura occidental. Entre las legendarias versiones sobre el origen de estos juegos Alfonso X se decide por un apólogo de procedencia oriental, en el que se narra que en la India hubo un rey que rodeado de sabios les hacía razonar sobre el porqué de las cosas, uno de ellos defendía la primacía de la razón sobre la suerte, afirmando que más valía “seso que uentura”; otro, por el contrario, prefería la “uentura” más que el seso, y un tercero, opinaba que lo mejor era saber usar con “cordura de la uentura”. El rey les concedió un plazo para que le dieran un prueba fehaciente de estas teorías sobre la inteligencia y el azar, al cabo de dicho plazo, ellos le presentaron tres libros: el primero, el de “axedrez con sus juegos, mostrando que el que mejor seso ouiese… podríe uencer al otro”; el segundo, el de los dados, señalando que “no ualíe nada el seso sino la uentura”; el tercero, “el tablero con sus tablas… e con sus dados” que explica cómo jugando con cordura se puede evitar “el daño quel puede uenir por la auentura de los dados”.


El Libro del Ajedrez, es el principal de los tratados en el códice, y al que más espacio dedica, por ser el más noble y de mayor maestría que los otros, por tanto está claro que Alfonso X otorga la primacía al entendimiento sobre el azar. Tres siglos más tarde Felipe II mostraría también su preferencia por este noble juego que, en cierto modo, resumía y actualizaba de una forma civilizada el ideal caballeresco de dirimir cuestiones bélicas o políticas en una partida. También se describen otros juegos derivados del ajedrez: el gran ajedrez, el ajedrez de las diez casas, el de los cuatro tiempos del año, el alberque y, el que quizá puede ser más curioso, el de la astronomía, que probablemente fuera inventado por el Rey Sabio, en el que descubrimos como la gran pasión del monarca por la ciencia astronómica, se convierte en entretenimiento para aquellos jugadores avezados en esta ciencia, en el mismo se percibe una buena dosis de alegoría y simbolismo. En 1497 sufre un cambio fundamental el ajedrez. En el llamado “ajedrez moderno” se sustituye el “alfferza” por “la dama poderosa o reina” que al asumir en sí los movimientos del alfil y de la torre se convierte en la pieza clave del juego.


Otros juegos de mesa, introducidos a finales de la Edad Media son los naipes y el juego de las damas. Este último, de origen español, es un juego de estrategia en el que, como en el ajedrez, la inteligencia de los jugadores es la clave para ganar la partida, tendrá su arraigo y expansión a partir del siglo XVI. Por su parte, los naipes tienen su origen en China (hacia el siglo XII), se introducen en occidente en el siglo XIV. Desde el primer momento, como juego de apuesta, se citan entre los juegos prohibidos. En España, los juegos de naipes, como los de dados, se convirtió en vicio nacional, y así se detecta en los relatos de viajeros extranjeros y en la literatura del Siglo de Oro.




Reseñas


https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.10403


LOS BORDES DE LA FICCIÓN, DE JACQUES RANCIÈRE, BS AS, ED: EDHASA, 2019, 168 PÁGINAS. ISBN: 978-987-628-482-0


LOS BORDES DE LA FICCIÓN, DE JACQUES RANCIÈRE, BS AS, ED: EDHASA, 2019, 168 PÁGINAS. ISBN: 978-987-628-482-0


LOS BORDES DE LA FICCIÓN, DE JACQUES RANCIÈRE, BS AS, ED: EDHASA, 2019, 168 PÁGINAS. ISBN: 978-987-628-482-0


Emilio Alochis

(Universidad Nacional del Comahue)

enalochis@gmail.com


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Recibido: 06/03/2020 Aprobado: 14/04/2020

Carlos Fuentes, en su libro La gran novela latinoamericana, dedica un capítulo a Jorge Luis Borges en el que menciona su opinión de que la teología es una rama de la literatura fantástica. Si en esa fórmula reemplazamos a Dios por un concepto más secular, encontraremos que a Borges también se le atribuye la idea de quela metafísica es una prolongación de la literatura fantástica. Más allá del muy conocido talante provocador de nuestro genial autor, su pensamiento alrededor del vínculo entre distintas formas discursivas revela una estructura jerárquica en cuya cúspide está la literatura; una estructura que podemos rastrear hasta Aristóteles.


Al igual que Borges, otros críticos como Samuel Johnson y Harold Bloom, conciben a la literatura a partir del filósofo estagirita quien, en su Poética entiende que “la poesía es más filosófica y elevada que la historia, pues la poesía refiere más bien lo universal, la historia en cambio lo particular” (Poética 1451b 5-7), e interpretan que aquel vínculo ha sido y continúa siendo uno agonístico, es decir, una pugna por ocupar espacios de sentido y de percepción del mundo. Así, desde los días del filósofo griego hasta los nuestros, la discusión acerca del estatuto de las artes ha girado en buena parte en torno a la pretensión de subordinar a la literatura el resto de los sistemas discursivos.

En contraste con estas ideas, en su último libro traducido al castellano, Los bordes de la ficción (2019), Jacques Rancière elabora una serie de ensayos crítico-literarios en los que examina el estatuto nuclear que la tradición aristotélica le ha dado a la literatura y lo coloca fuera de sí para intentar mostrarnos los modos indirectos, oblicuos, en que las ficciones literarias han desarrollado su vínculo con la realidad. Es importante señalar que el trabajo de Rancière no está encaminado ni a impugnar a Aristóteles ni a reemplazar su tradición por un programa de tintes esencialistas, sino a proponer un modo distinto de leer, siempre bajo una idea que atraviesa otros tantos textos suyos: la estética como política.


En solo cuatro capítulos, esa idea atraviesa casi innominadamente el texto bordeando los accesos a los que la literatura se asoma para hacernos notar que es su propia racionalidad laque le da forma a realidades tan distintas entre sí como el costumbrismo francés del siglo XIX, los análisis de Carl Marx en El capital, la ruptura del referente en la narrativa de W.G. Sebald, o el “punto cualquiera” en

William Faulkner y Virginia Woolf. No es que todo sea ficción; el argelino no intenta reforzar el lugar de “centro” del arte literario sino abordar, desde sus orillas, el modo en que el mismo establece puntos de conexión que la razón literaria revela con otros discursos.


Rancière sabe perfectamente que la gran diferencia entre el campo de la ficción y el de la realidad es, como ya lo detectó Aristóteles, un aumento de racionalidad, es decir, el vínculo entre los devenires del héroe y su propio despliegue de decisiones. Son estas las que disponen un orden de expectativas (prosperidad, sabiduría, felicidad) que, distribuidas por la literatura, fueron y son asimiladas por paradigmas que se precian de no ser ficcionales: “verificamos con facilidad que los principios aristotélicos de la racionalidad ficcional conforman todavía hoy la matriz estable del saber que nuestras sociedades producen acerca de sí mismas” (Rancière, 10). Es justamente a partir de esa racionalidad que diferentes discursos construyen el modo en que perciben el mundo.


  1. Metáforas del exterior


    La primera sección del libro, “Puertas y ventanas”, es no solo una serie de metáforas que cumplen la función de introducirnos en las lecturas ranciereanas, sino puertas, ventanas, y umbrales detrás de los que seque se encierra-en palacios y mansiones- el núcleo de las vidas privilegiadas que la literatura occidental construye como sustrato fundamental de la “realidad social”. Del otro lado de ellos hay ojos que devuelven miradas y reclaman su lugar; son los ojos del campesinado, de la burguesía incipiente y del proletariado que el Realismo del siglo XIX comenzará a traer desde los bordes de la historia hacia el centro de sus textos. Rancière lee en esta operación no solamente una clara maquinaria poética- estética, sino una dialéctica de la que participa el modo de leer de la crítica aristocrática francesa de la época que, ante Madame Bovary, se indigna frente a los deseos y acciones de Emma pero al mismo tiempo reconoce en ellas al espíritu de un cambio de época.


    “La crítica cambió de status. Esta ya no dice cómo las obras deben o deberían haber sido hechas para satisfacer las reglas del arte y el gusto público, sino que dice cómo se hacen las cosas, qué mundo sensible construyen y cómo se refleja en él el espíritu del tiempo que las ha engendrado” (Rancière, 22).


    Para esa aristocracia, Flaubert representa no tanto una crisis estética como la revelación de la democratización y licuación de espacios que solían estar claramente definidos. Rancière verifica que son justamente los prejuicios y el lugar anquilosado (y ahora disputado) de los críticos reaccionarios los que colaboran en la transformación estético-política que Madame Bovary expone. Este es solo un ejemplo de todo un modelo que Rancière lee como estructural acerca de la manera en que la literatura decimonónica construye y modifica la percepción de una otredad cuyos reclamos por ocupar espacios (materiales y afectivos) forman parte del mundo ficcional de Flaubert, Balzac o Maupassant.

    Al mismo tiempo, así como ese reparto de lo sensible, esa disputa, se configura en la Emma de Flaubert palpablemente en una lucha de cuerpos y de espacios, Rancière lee en Proust una disputa diferente y más abstracta: en Proust identifica el vínculo entre la escritura y lo sensible en tanto conjunción no visual, es decir, la escritura “táctil, gustativa o sonora, siempre muda, nunca visual” (Rancière, 45), que responde a un platonismo desvinculado de toda necesidad de proveer sentido racional al texto. En otras palabras, Proust expresa una racionalidad poética no aristotélica, una en la que no hay misión ni catarsis que cumplir, sino que expone la articulación de sensaciones con otras sensaciones.


  2. Ciencia y policial


    En el segundo capítulo, “El umbral de la ciencia”, el filósofo se ocupa del orden científico y causal como problemas literarios poniendo su atención en El capital, de Marx, y en el policial moderno.

    1. El fantasma y lo irresoluble


      En el primer caso, Rancière argumenta que la ciencia, sobre todo la de Marx, es fundamentalmente teatro, un complejo de operaciones que no por casualidad está abastecida de personajes en escena y no solo de fórmulas matemáticas y números. Allí, jugando como intermediaria entre las personas, está la mercancía, una fantasmagoría que da cuenta del problema esencial en los análisis del relato marxista: “la realidad impalpable de la distribución global del tiempo” (Rancière, 60). Si bien no lo dice expresamente, el problema que está planteando es el mismo que podemos leer en cualquier ficción, el problema de un reparto - del uso del tiempo de los hombres, en este caso-, el de una distribución mediada por la figura espectral que constituye la cosa.

      A partir de esta observación, el filósofo argelino explica que en El capital “los desarrollos teóricos y la acumulación de ejemplos están ambos sometidos a un trabajo narrativo” (Rancière, 70), uno en el que, como ocurre en la filosofía de Empédocles, la armonía de los contrarios está siempre presente. Lo expresa el propio Marx en su obra: es una contradicción “…que un cuerpo caiga constantemente sobre otro y, no obstante, lo hace constantemente” (Rancière, 70). La conclusión del filósofo es que El capital es básicamente una tragedia, una exposición analítica que traza el problema universal de las relaciones entre los hombres bajo la tensión de una contradicción estructural que no se resolverá nunca.


    2. Contra la causalidad


    Respecto al género policial, el autor propone que su paradoja es que podría haber sido heredero de la racionalidad aristotélica pero sufrió un desvío que la alejó de ella. A diferencia de aquella, el policial no establece una conexión entre la manifestación de la verdad con la suerte del héroe sino que dispone un sistema de indicios y pruebas que funcionan internamente de modo que la verdad no sea aquello que parece serlo. Es justamente esta nueva racionalidad la que celebra Borges en el prólogo a La invención de Morel y la que inaugura al policial moderno con Los crímenes de la calle de Morgue, de Poe.

    Lo interesante del punto de vista de Rancière es que propone al policial moderno como un tipo de racionalidad ficcional que, al igual que el científico Marx, coloca al detective (o al científico) desde una posición de observación que le permite detectar una particular conexión de fenómenos que escapan a la inteligencia común, articulando elementos que rompen esquemas de sucesión o de criminalidad. Es esta racionalidad la que explica la paradoja de la ficción de Poe, en la que el crimen del relato en realidad nunca tuvo lugar ya que el responsable, no un ser humano sino un animal, no puede cometer tales actos. Este nuevo género, pues, nace como paradoja, quebrando las reglas de causalidad.

    Así, Rancière nos devela que el policial moderno es al mismo tiempo germen y desvío de la tragedia aristotélica, en tanto se ajusta a un sistema de reglas que opera redistribuyendo los criterios de racionalidad: en lugar de la sucesión de pistas que devela el misterio al estilo Conan Doyle, lo que adquiere relevancia es la dinámica del relato con su realidad circundante. Este reparto trae como consecuencia no solamente un nuevo modo de concebir formalmente al texto como una máquina en sí misma, sino el enlace con el mundo que rodea su contexto de producción, con lo político de la estética:

    “Todo refinamiento de intriga se verá abandonado cuando (…) Dashiell Hammett, ponga en fila la cascada de crímenes de Cosecha Roja. La causa del crimen es el crimen mismo. Es la existencia de un medio criminal cuyo ajuste de cuentas a mano armada es la actividad normal y que la complicidad de los hombres de dinero y del poder pone en el centro de la vida social.” (Rancière, 88)


  3. Quimera y política

El capítulo “Las márgenes de lo real”, exhala la frescura de una lectura desde la que Rancière nos salva de caer en el reduccionismo de verificar en El corazón de las tinieblas al programa colonizador de occidente. En Conrad, mímesis y Realismo escapan al mero retrato, a ser espejo del mundo, para ejecutar una oposición a la idea de realidad en tanto mímesis no implica copiar sino crear aquello que podría existir. Así, imaginación y realidad, o si se quiere, estética y política son la inscripción de la paradoja conradiana en la que la quimera, la paradoja, revela a un Kurtz que se propone como misionero civilizador. El corazón de las tinieblas es justamente una quimera porque su lectura como denuncia, como descripción realista del horror colonizador no interrumpe las prácticas que ella misma revela.

El quiebre con la idea de Realismo como espejo continúa en pleno siglo XX con Los Anillos de Saturno, de W.G. Sebald, obra con la que Rancière se ocupa del tema de la hibridez del texto como problema de “inclasificación”. Sebald teje su texto como recorrido personal, como un diario que busca dar cuenta de un campo de observaciones extremadamente heteróclito (desde la Alemania nazi hasta la escritura de Borges), una mixtura entre el testimonio y la literatura, umbral entre la memoria y la ficción. La memoria en Sebald es, para Rancière, el encuentro con la supresión de la peripecia, la ruptura con el orden aristotélico del encadenamiento de causas, una reestructuración de lo estético- político desde el borde de la escritura.


4. Puntos cualquiera


Finalmente, en “El borde de la nada y del todo”, Rancière cierra su texto retomando la idea aristotélica de racionalidad poética para releer el modo en que las vanguardias del siglo XX ponen su atención, a la manera en que lo hizo Flaubert, en “puntos cualquiera”. Así, es el despliegue del tiempo moroso en Al faro, o la palabra de los descartados en El ruido y la furia el lugar en que la política de la ficción responde a los criterios realistas que construyen sentidos e identidades. Vemos, una vez más, que la poesía es más filosófica que la historia porque teje lo que puede ser.


Así como la ciencia marxista es, en su estructura discursiva, aún aristotélica porque mantiene la jerarquía del tiempo, la del desarrollo y de culminación en un gran punto de síntesis en el que la humanidad se transformará, esa estructura se quiebra cuando, como ocurre en Woolf y Faulkner, los bordes del tiempo y de lo social toman centralidad. Allí está la política de la literatura, en los momentos cotidianos, “cuando ingresan individuos cualesquiera en ese tiempo vacío que se dilata en un mundo de sensaciones y de pasiones desconocidas” (Rancière, 132). Es interesante rescatar aquí que, en consonancia con estas ficciones, Walter Benjamin planteó la necesidad de relacionar la dialéctica no al transcurso del tiempo sino a sus interrupciones, a sus solapamientos y retornos. Woolf y Faulkner se le adelantaron.

En Los bordes de la ficción, entonces, Rancière intenta “…medir las transformaciones de la racionalidad ficcional que las ciencias sociales y la literatura en la Edad Moderna en Occidente han efectuado” (Rancière, 10).Para ello ejecuta, al igual que la tradición agonística con la que discute, una lucha, pero de otro tipo; es una disputa por el reparto de lo sensible de acuerdo a los modos de leer ficción en conexión con nuestra realidad. En esa lucha se juega el modo en que percibimos nuestro mundo como posibilidad de modificar(nos)lo.

 

 

 

https://doi.org/10.34024/prometeica.2020.21.10953


FEDERICO PENELAS. WITTGENSTEIN, BUENOS AIRES, GALERNA, 2020 338 PP., ISBN 978-950-556-765-2


FEDERICO PENELAS. WITTGENSTEIN, BUENOS AIRES, GALERNA, 2020 338 PP., ISBN 978-950-556-765-2


FEDERICO PENELAS. WITTGENSTEIN, BUENOS AIRES, GALERNA, 2020 338 PP., ISBN 978-950-556-765-2


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Elías Bravo
(Universidad Nacional de Mar del Plata)
profe.eliasbravo@gmail.com


Recibido: 24/07/2020
Aprobado: 28/07/2020


La revuelta filosófica, colección dirigida por Lucas Soares para la editorial Galerna, abre un espacio de lectura que busca rescatar lo arriesgado y desafiante del pensamiento filosófico. Federico Penelas, Doctor en n

Filosofía, docente de la cátedra de Filosofía del Lenguaje en la Universidad de Buenos Aires y en la Universidad Nacional de Mar del Plata, investigador del CONICET (Argentina), ex presidente de la Asociación Filosófica Argentina (AFRA) y especialista en la temática referida a la semántica filosófica contemporánea es quien se ha encargado de la redacción del volumen publicado en la colección, dedicado a la revuelta promovida por Ludwig Wittgenstein. El escenario, 368 páginas, divididas en un estudio preliminar, selección de textos y bibliografía de referencia.

El libro se divide en dos grandes partes. La primera de ellas es un extenso estudio preliminar en el cual Penelas realiza un abordaje de lectura claro, pormenorizado y crítico que recorre los diferentes tópicos del filósofo austriaco. Y una segunda parte que consta de una selección de textos fuente que, a modo de pinceladas que se reclaman entre sí, ofrecen un complemento de primera mano a la presentación del Wittgenstein que nos propone Penelas. O tal vez cabría pensarlo de otro modo, probablemente lo que Penelas nos esté proponiendo, en esta segunda parte del libro, es hacer nuestra propia lectura de Wittgenstein, complementaria a la realizada por él.


Si bien el texto es una monografía sobre Wittgenstein, el estudio preliminar, a su vez, se subdivide en cuatro capítulos. El primero, a modo de introducción, bajo el título “La revuelta de Wittgenstein”. El segundo rotulado “Una escalera trágica” donde Penelas nos ofrece un análisis y descripción de las ideas producidas por el joven Ludwig Wittgenstein en su obra de juventud el Tractatus Logico- Philosophicus, único libro publicado en vida de su autor. Un tercer capítulo titulado “La comedia de los juegos” donde indaga las ideas y pensamientos producidos en la época de madurez del filósofo vienes y que quedaron plasmados en su obra publicada póstumamente bajo la inscripción de Investigaciones Filosóficas. Y el cuarto y último capítulo, a modo de epilogo, titulado “Una vida maravillosa”.

La organización del libro y el tono de la exposición favorecen la lectura, mientras que las referencias bibliográficas permiten ampliar la perspectiva del tema, así como mantener una visión actualizada.

La revuelta de Wittgenstein


En el primer capítulo Federico Penelas explicita en qué consistió el carácter de revuelta promovido por la filosofía del autor del Tractatus, destacando las que éste realiza i) contra su padre (deja de estudiar ingeniería y pasa a estudiar filosofía en Cambridge); ii) Contra la metafísica; iii) contra los cánones de producción filosófica a forjarse en aquel entonces; iv) contra las formas burocráticas de escritura; y, sobre todo, v) la revuelta ejercida por Wittgenstein contra sí mismo en lo que será su transformación radical a lo largo de su despliegue filosófico, en lo concierne al giro que éste realiza desde el determinismo semántico, o sea, la concepción según la cual los significados preceden a las prácticas lingüísticas, hacia el indeterminismo semántico, es decir, la concepción que considera a las prácticas lingüísticas como antecediendo y constituyendo a los significados mismos. En otros términos, se trata del desplazamiento de un joven Wittgenstein preocupado por encontrar la forma general de la proposición a un Wittgenstein maduro dedicado a inquirir en la multiplicidad de juegos de lenguaje configurados en las diversas formas de vida.


El Tractatus Logico-Philosophicus, una escalera trágica


En el segundo capítulo del estudio preliminar Penelas ahonda el trasfondo filosófico y cultural bajo el cual en Wittgenstein irán germinando las ideas que más tarde quedarán expuestas en su Tractatus. En ese sentido, si bien el libro es un fecundo y pormenorizado análisis acerca de cómo se gestó y se fue desplegando la corriente filosófica denominada “Tradición Semántica” desde sus inicios a partir de las críticas a la filosofía de Kant llevadas a cabo por el matemático Bernard Bolzano durante la segunda mitad del siglo XIX pasando revista por las producciones de los lógicos y matemáticos Gottlob Frege y Bertrand Russell, las cuales son la piedra de toque a partir de las cuales Wittgenstein va a desplegar sus ideas acerca del lenguaje como representación del mundo y de los límites con que contamos al querer expresar aquello que no se puede decir sino a lo sumo mostrar en lo que será su Tractatus Logico-Philosophicus.


Si bien el propósito de búsqueda de la fundamentación de la matemática mediante la lógica fue lo que motivó la producción de sus antecesores, Penelas destaca que “La aproximación de Wittgenstein a dicho terreno filosófico, fue, sin embargo, cautelosa. Sus preocupaciones teóricas parecieron concentrarse más en los detalles de la construcción logicista, en la naturaleza misma de la lógica y del lenguaje” (p. 43). Así, la tesis que nos presenta Federico Penelas es que detrás de la concepción filosófica de Wittgenstein hay un compromiso existencial. Realizando, así, un buen entrecruzamiento al enlazar la práctica filosófica del filósofo vienes y su biografía, en la cual se refleja la rotunda conexión de la labor filosófica Wittgensteiniana con los acontecimientos históricos que le toco atravesar a lo largo de su vida y que quedaran exteriorizados en las narraciones descriptas por éste en sus diarios personales, durante la primera guerra mundial, por ejemplo.


Otra de las tesis que Penelas expone en el final de este capítulo de su libro es que el famoso lema de Goethe, “En el principio era la acción” se inscribe en toda la obra del filósofo austriaco y no sólo en las obras posteriores al Tractatus, como sostiene gran parte de los comentaristas de Wittgenstein, ya que el “hay que callar” con el que culmina la obra de juventud de Wittgenstein se sustenta en la praxis y esto se traduce perfectamente en el Tractatus con la sentencia: “La filosofía no es una doctrina sino una actividad” (p.110)


Las Investigaciones Filosóficas, la comedia de los juegos

En el tercer capítulo del estudio preliminar Penelas examina la contribución del Wittgenstein maduro, cuyas ideas centrales quedaron cristalizadas en la obra Investigaciones Filosóficas, texto publicado dos años después de la muerte de su autor, en 1953. Las Investigaciones… es un texto que Wittgenstein fue concibiendo tras su vuelta a la filosofía en su retorno a Cambridge, tras diez años de silencio, durante su labor como profesor, esto es, desde mediados de la década de 1930 y hasta mediados de la

década de 1940. Esta fue una de las obras más influyentes a partir la segunda mitad del siglo XX en cuanto a su apuesta al antiesencialismo, a la diversidad y al pluralismo que son parte de nuestro caudal cultural.


Penelas destaca en la nueva teoría wittgensteiniana acerca del lenguaje y la significatividad los aportes del filósofo ingles Frank Ramsey, discípulo de Wittgenstein y, sobre todo, las conversaciones que el austríaco había mantenido con su colega, el economista italiano, y amigo de Antonio Gramsci, Piero Sraffa, quien había llegado a Cambridge como exiliado del fascismo gracias a la ayuda de John Maynard Keynes. Así, pues, fue Sraffa quien, según Penelas, le permitió tener a Wittgenstein una perspectiva antropológica desde la cual analizar el fenómeno lingüístico no ya como la forma general de la proposición sino como institución social comunitaria ligada a formas de vida, la cual involucra un antiesencialismo filosófico y una apuesta a la multiplicidad de juegos de lenguaje.


Epílogo: una vida maravillosa


Para finalizar su ensayo Penelas nos advierte que el cambio radical llevado a cabo por Wittgenstein a lo largo de su producción filosófica, desde el Tractatus logico-Philosophicus a las Investigaciones Filosóficas, esto es, el pasaje de una concepción semántica determinista a una concepción semántica indeterminista puede ser resumido como la “deriva del soliloquio a la conversación” (p. 208) y ultimará su estudio preliminar alegando que la concepción comunitaria del significado expuesta en la obra del Wittgenstein maduro adopta una forma de relativismo incompatible con el planteo posmoderno del “todo vale”. Postura que queda plasmada de manera tajante en la crítica del lenguaje privado llevada a cabo por el filósofo austríaco en las Investigaciones filosóficas. En efecto, allí afirma que no tiene sentido pensar en un lenguaje en el que las palabras tuviesen referencia únicamente a cosas personales o subjetivas, ya que incluso el lenguaje que utilizamos para comunicar sensaciones subjetivas de nuestro mundo privado, como el dolor de una muela, ocurre en el ámbito social.

Para concluir, sostengo que este trabajo se presenta como una herramienta útil para todo aquel que se encuentre interesado en las problemáticas que conciernen a la filosofía del lenguaje y que desee tener un panorama actualizado de la misma, pero también para quienes busquen explorar distintos modos de pensar el lenguaje. El libro proporciona una visión actualizada para adentrarse en estos debates, que si bien, tienen como foco principal la filosofía analítica del lenguaje, rozan otras disciplinas como la antropología, la semiótica, las ciencias políticas y las ciencias de la comunicación, con sus correspondientes problemáticas filosóficas.

 

 

 

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